As diversas verdades do autor, sucessivamente apercebidas nas suas oscilações de consciência, não são um produto subjetivo, mas têm uma sua existência própria objetiva, independente dele que mais não faz senão vê-las, segundo suas mutáveis capacidades. Estas pertencem, simplesmente, a planos evolutivos diversos e cada um lê as que pode, conforme as condições de sua receptividade. Qual é, pois, a verdade verdadeira? Mas cada uma é verdadeira relativamente a cada um. A verdade absoluta é outra coisa e, mais que a soma, deve ser a fusão orgânica de todas as possíveis verdades relativas aos infinitos pontos de vista dados pelas infinitas posições do ser. Cada absoluto está, naturalmente, além do concebível humano, onde não podem permanecer senão os fragmentos e aproximações progressivas dados pelo grau relativo da evolução. Que os homens pertençam a verdades diversas, segundo a natureza de cada um, é um fato demonstrado todos. Os dias pelos seus conflitos, que sucedem todas as vezes que um homem, com a sua verdade, se põe em confronto com o homem de uma outra verdade. E se há formação de grupos humanos, deve-se isto à identidade ou finalidade de verdades, o que significa natureza e plano evolutivo iguais ou afins. Cada um se reagrupa sempre com os seus semelhantes e dessa maneira se revela o seu tipo biológico. O indivíduo comum não tem de fato as possibilidades dadas pela personalidade oscilante e se mantém, com escassas variantes, mais ou menos na mesma verdade sem mudar de tipo biológico.

Uma boa parte dos homens atuais representa uma verdade que não é aquela ínfima da absoluta humana animalidade involuída, nem mesmo a do evoluído do porvir. Muitos se encontram numa posição mediana, em que os dois extremos aparecem como que à margem, um embaixo e o outro no alto. Assim o homem se debate em uma fase de transição, na qual lentamente se vai operando por evolução a passagem de um tipo biológico e relativa verdade para outro tipo biológico e verdades superiores, tendentes ao modelo elevado A característica da hora atual é a de estar a cavaleiro de duas civilizações, uma que morre e outra que nasce. Disto deriva um contraste entre elementos em esfacelamento e outros em formação, efeito da visão de uma verdade que está para submergir no subconsciente e da visão de uma outra verdade que alvorece no superconsciente, que representa a formação da nova consciência do porvir. Hora de grande fervor na obra criadora da vida. As duas posições estão se defrontando e se desafiam. A velha verdade luta para não morrer, forte na posição já conquistada, mas corroída pelos séculos, correspondendo sempre menos às novas necessidades do espirito sempre mais exigente, portanto, biologicamente condenada. A jovem verdade luta para conquistar a vida na consciência, é jovem e nua, mas forte e com todos os recursos dos jovens, fresca e plena de ímpetos, destinada pela lei da vida a vencer, pelo seu direito de existir. Temos assim como sempre, mas nunca viva como hoje, a luta entre o novo e o velho: temos uma quantidade de formas petrificadas somente explicáveis historicamente, um contínuo trabalho de desgastamento operado, como sempre, pelas idéias novas, e o estado de formação de novas concepções da vida.

Observemos o choque entre as duas forças antagônicas, em seu campo de batalha que é a consciência humana em evolução, observemos o dinamismo da sua transformação de uma na outra, esse estranho paralelismo de impulsos ativos e recalcitrantes, que, mesmo lutando, se abraçam porque uma é filha e a outra é mãe. Quem tem ouvidos ouve o potente martelar da vida que pulsa para explodir das incrustações do passado que a envolvem, sente o frêmito da gênese na superação. Ainda que uma dada civilização caia em ruínas, a "civilização" nunca morre, porque, como a vida, ela renasce sempre alhures e maior. E se hoje triunfa a destruição em todo campo material e espiritual, é porque a vida está lançando os fundamentos de mais altas construções. Aos olhos superficiais tudo parece caos, porque produtos de desfazimento e germes vitais estão materialmente misturados. Mas cada um desses tem a sua lei e a segue, sem que possa haver confusão. Se, na superfície, a maioria tremendo, enxerga ruína, quem sente profundamente, vê ressurreição. Regozija-se, pois, em seu coração. A sua psicologia é "a priori", enquanto a comum é "a posteriori" e treme depois e não antes do desastre. Antes da última guerra poucos temiam, e temem hoje por psicose de conseqüência. Tremer depois é trabalho inútil. Quem, ao contrário, sente e sabe que esta é a hora decisiva para os futuros milênios, em vez de ensandecer para esquecer ou perder-se no pessimismo, colabora com as forças da vida que com ele querem a salvação de todos. Ele bem sabe que não se pode parar a vida e que ela venceu sempre todas as guerras. O homem comum, aturdido pela voz de mil verdades diversas em que tantos exprimem a si mesmos, se confunde. Ele é sensório e, para ele, a verdade é o que faz mais barulho, atingindo maiormente os seus sentidos. O verdadeiro, pois, lhe parece inatingível, porque não encontra senão um redemoinho caótico de contradições e vive de imitações, não sabendo pensar por si mesmo. Mas a substância do vórtice é dada por leis sábias com as quais cada uma bem sabe alcançar organicamente a sua meta. Que visão titânica representa, ao contrário, o destino humano, qual é marcado na evolução das leis da vida! As verdades que parecem utopia para as consciências ainda não amadurecidas para isso, existem e amanhã serão de todos.

Para fazer compreender o que hoje parece utopia, isto é, as formas de vida mais elevadas, começamos por lhe descrever a economia, a que aí regula a distribuição dos meios e forças e preside ao abastecimento para a vida material, a qual é sentida por todos. Confrontaremos essa nova economia, inteiramente diversa, com a nossa atual. Observaremos as duas economias e como possa advir a passagem de uma para a outra. Presumimos o conhecimento do capítulo sobre a Divina Providência desenvolvido no volume precedente, A Nova Civilização do Terceiro Milênio, argumento que aqui retomaremos para levá-lo mais adiante. Subindo evolutivamente aparece à consciência uma verdade mais alta, na qual a economia se revela completamente diversa da normal. Na terra os bens, segundo a verdade inferior, aparecem limitados de modo a tornar necessária e justificar uma luta contínua, sem piedade, para procurá-los. Subindo, vê-se, ao contrário, que na realidade a limitação não existe para o homem, senão no ambiente da sua forma mental e modo de agir. No universo os bens são infinitos e sempre mais livremente acessíveis à medida que o homem progride. E porque, na sabedoria da Lei que tudo rege, é necessário que antes o homem evolua e dê prova, com o conhecimento e sabedoria conseqüente, de ser capaz de fazer bom uso das coisas e do poder, sem o que ele não é admitido à sua livre disponibilidade, o que poderia não ser-lhe útil, mas prejudicá-lo. A um selvagem, uma lei previdente não pode conceder senão os meios mínimos proporcionados à sua inconsciência, se não se quiser que ele, com a sua psicologia, destrua tudo, inclusive a si mesmo. E o perigo da nossa atual fase de transição, é justamente este: crescente disponibilidade de meios, com a ciência, e isto nas mãos de um homem não ainda sensato o bastante para saber bem usá-los. Quanto mais o homem é involuído, tanto mais todo poder deve permanecer sepultado pela sua ignorância; quanto mais será feroz, tanto mais será pobre os meios. Como com a saúde ou a doença, assim também com a miséria, tudo, antes que efeito, é causa situada dentro de nós. Assim também quanto mais se evolui, tanto menos se faz sentir o perigo de mau uso, e maiores podem ser os poderes concedidos. Então a riqueza se faz sempre menos egoísta e exclusivista, mais universal e gratuita. O limite a tão cobiçadas posses, pelas quais hoje o mundo tanto se atormenta, é propriamente dado por nós. Somos nós que com o nosso egoísmo fazemos a nossa pobreza. Quem compreendeu isto, compreendeu também a verdade superior, que ao involuído parece um absurdo, isto é, que a riqueza se conquista não fazendo ricos a si mesmos e pobres aos outros, mas fazendo ricos aos outros e pobres a si mesmos. Comportando-nos segundo o primeiro caso, adquirimos para nós, em vez de riqueza, pobreza.

Essa nova e estranha economia é bem outra que a comum e resolve de fato o problema econômico. Mas ela pertence a um mundo que o homem atual não pode ainda compreender. Trata-se da mesma lei pela qual quem faz o mal aos outros o faz a si mesmo, e quem faz bem aos outros o faz a si mesmo. A grande descoberta que a ciência ainda não imagina poder fazer, é esta, da presença de uma lei universal que tudo rege. Lei boa e justa. É perfeitamente estúpido e contrário ao fim de alcançar a nova felicidade o sistema de querer forçar as portas. Essa lei é a alma de todas as coisas, é o divino pensamento que as rege todas em um admirável funcionamento orgânico. É necessária uma quantidade enorme de ignorância para crer que aquele grãozinho de areia, o homem, possa tomar o comando dessa lei. Eis a grande verdade que se descobre, evoluindo-se. Para alcançá-la não há outro caminho senão a ascensão; o resto não vem ao caso. É necessária uma inteligência muito mais ampla que a racional; uma inteligência equilibrada no ponto de partida, feita não somente de conhecimento, mas de sabedoria, não só de saber, mas da arte de saber usá-la bem, uma inteligência regida pelo senso moral das coisas. O homem atual que parte do apriorismo dogmático absoluto do Eu, que se faz centro do universo, inventou sua posição já no início, e, assim, não pode alcançar senão resultados invertidos. Desse modo ele não pode compreender o ponto fundamental e elementar, isto é, para entrar não se deve tentar arrombar as portas, porque então se nos fecham sempre mais solidamente, mas é preciso tornarmo-nos aptos e conformados de modo que possamos entrar. Em outros termos, sendo impossível transformar a Lei, nada há mais, senão nos transformar-mos. Então as portas se abrem e nos convidam a entrar, como é de nosso direito, espontaneamente e somente assim, o justo desejo, que não podia cumprir-se por erro de método, pode ser plenamente satisfeito. No entanto, em frente a um problema de tão simples compreensão e resultado, devemos presenciar o homem moderno partindo a cabeça contra uma muralha e que faz um inferno da terra que poderia ser um paraíso. De tudo isto se deduz a importância do trabalho de dissipar a sua ignorância e de induzi-lo a civilizar-se.

Diante do quadro terrificante de tantos seres reduzidos ao desespero pela avidez da disputa de meios e substâncias, das quais a terra está cheia para todos, que maravilha representa a visão dessa Lei, que tudo sabe, que é justa e boa e como tal, ainda quando tentamos fazer o mal, rebelando-nos ela nos protege e nos salva! Para conseguirmos isso, bastaria harmonizar-nos com ela, pois nos quer salvos, livres e felizes. Como nos ama Deus, que tudo criou, através dela! Como haveria a perfeição, se o homem com suas inauditas loucuras, retrocede ao mal e à dor, embora não consiga, substancialmente, destruir nada, não fosse constrangido por forças invisíveis a avançar para o bem e a alegria? Que ímpeto sente quem compreendeu a sabedoria e a bondade dessa Lei, e que paixão de se harmonizar com os seus ditames, o que se pode também exprimir na frase: fazer a vontade de Deus! Quantos cuidados maternos nos vêm prodigalizados, sem que o vejamos nem o compreendamos, a cada momento! Quantas catástrofes nos são poupadas a cada passo, com que ritmo de compensação, com que harmonia de equilíbrios são musicalmente coordenados para mais altos e alegres fins, todas as dissonâncias e os conflitos da vida! Quantos auxílios não notados, que economia para nós poupar-nos as forças para trabalho mais útil! Se há um esbanjamento para a reprodução que chama os seres para o banquete nupcial, ou para a luta que quer selecionar o melhor, digno do seu mundo animal, é porque isto representa as vias mestras nas quais a vida caminha, onde se atira com uma exuberância de meios, justificada pela importância do fim. Ela bem sabe ser rica, mas nem por isto é loucamente pródiga, mas o é somente quando o fim a ser atingido o merece e requer. Mas quanta economia, ao contrário, por exemplo no fato que deixa ao consciente somente a fadiga das novas construções, enquanto confia aos automatismos do subconsciente a função de conservar para cada necessidade, sem a fadiga de conscientes elaborações, em forma de instinto, o resultado do trabalho cumprido e já assimilado! Mas uma exemplificação nos levaria demasiado longe.

Como se vê, a visão de verdades mais elevadas, próprias de mais altos planos de existência, não é coisa que se encontre longe de nossa realidade quotidiana, que, pelo contrário, delas recolhe apoio e salvação. O homem de hoje não compreendeu que ele foi criado para ser senhor e não servo e que basta saber ser senhor, para o vir a ser. Mas ele, com a sua ignorância, se coloca, ao contrário, na posição que pertence ao inconsciente: a de servo. Não há outro remédio senão o de fazê-lo compreender como funciona a vida. É preciso mostrar-lhe que o mesmo poder criador que Deus usou na criação do universo e que está no pensamento, está também no homem, que foi feito à Sua imagem e semelhança. Como Deus é a causa perene de tudo, assim o homem é causa do seu pequeno mundo, que ele faz para si, em si e ao redor de si, como inferno ou paraíso, a sua vontade. A habitual inversão de todas as coisas, leva também aqui a ver a causa onde está o efeito, e ao contrário. É inútil encarniçar-se contra os efeitos, quando não se sabe manejar e remover as causas. Isto vemos em nossa medicina, que não consegue curar senão aparente e momentaneamente, pelo que as doenças, quanto mais são tratadas, tanto mais se renovam. A razão está em que se curam os efeitos exteriores do mal e se deixam intactas as causas, as quais são profundas, dependentes da psicologia, direção e regime de toda uma vida, sobre a qual o médico, encontrando tudo pronto, ainda que penetrasse naquele campo, bem pouco poderia fazer, sobretudo como resultado estável. A saúde não se improvisa com intervenções imediatas, com guerra antimicrobiana, mas pede uma preparação a longo prazo. O que pode curar a fundo uma medicina materialista que ignora o espírito, quando as causas estão todas exatamente no espírito, isto é, num campo que lhe escapa? Do espírito e da sua estrutura falamos alhures. A causa é ele, que constrói o seu corpo como sua expressão, como Deus construiu o universo como sua expressão. Tudo isto que advém do corpo é, pois, o efeito do que antes já esteve preparado no espírito, e o saneamento duradouro não se pode obter senão saneando primeiramente aquele. E sanear o espírito significa harmonizá-lo com a ordem da Lei, defronte à qual o homem, ao contrário, com o seu egocentrismo rebelde representa o impulso da desordem, origem de todos os males. E estes, ele semeia em seu caminho a mãos cheias. Que se pode pretender quando ele, ávido de prazeres, em vez de aderir às sábias leis da vida procura dobrá-las ao seu desejo? E ainda aqui, como quem monopoliza os bens, semeia miséria para si mesmo, e quem faz o mal aos outros em seu benefício, o faz a si mesmo, assim quem vive em desordem de espírito deve arcar com as doenças físicas que dela decorrem, pois atormentam igualmente o espírito. Também a saúde do corpo depende, pois, como tudo, do saber harmonizarmo-nos com a sabedoria da Lei que nos rege e nos guia.

A saúde do corpo é dada pela harmonia. Isto quer a Lei e quando nós nos revoltamos, então nos negamos a harmonia, isto é, a saúde. Eis uma outra porta a ser fechada por nós contra a alegria de viver, alegria que a natureza quereria bem nos dar como pacto da nossa compreensão e obediência. Rebelião, aquela de Lúcifer, o grande destruidor, é a nossa culpa e a causa de nossas dores. O homem é feito para mandar e tudo que lhe é inferior é feito para obedecer-lhe. Ao contrário, a nossa grande infelicidade consiste justamente nisto, que as coisas muito raramente correm conforme os nossos desejos. Mas por que acontece assim? É porque desejamos o mal, contr a lei que representa o nosso bem. É justo e útil, portanto, não sejamos atendidos. Para nos salvarmos, constrangendo-nos a compreender nosso erro e como devemos proceder, a Lei nos faz sofrer. E como fazer de outro modo, para um ser que deve permanecer livre? A dor é o único raciocínio que todos compreendem. E então é justo, lógico, e faz parte da perfeição do sistema, que tudo corra às avessas no mundo de hoje.

Qual é, hoje, a nossa vontade? Que desejos, este impulso construtor proveniente do espírito transmite, para os fazer sentir àquele operário, que é o subconsciente? Ele é o animal que vive no homem e que deve ser usado como uma besta domesticada pela fadiga, qual servo, obediente executor das ordens do espírito iluminado e consciente. Mas é o espírito que no homem de hoje dirige com conhecimento e sabedoria, ou é aquele animal que comanda e serviliza o espírito? Também aqui tudo está invertido, como em qualquer parte. Que capacidade diretriz pode ter a parte animal? Que pode desejar senão coisas materiais, portanto ilusórias, transitórias e mortais? Que pode um tal chefe transmitir ao subconsciente, como motivos construtivos? Somente motivos de ilusão, de decadência e de morte. Eis as doenças físicas e as dores também morais. Estando isto contra a Lei e, portanto, sendo danoso para nós, a Lei sábia se apressa em destruir tudo, demolindo-o e, enfim, liquidando-o com o negar-lhe toda nutrição vital. Ela não pode proceder de outro modo, para o nosso próprio bem. A força de gerarmos o que é mortal, deveremos, sem desfalecimento, suportar as conseqüências da destruição, até que o espírito imortal compreenda um dia ter errado o caminho e saiba encontrar o novo, o melhor, o único bem.

Quando ao contrário, é o espírito que guia, então os seus impulsos criadores se dirigem todos para as coisas imortais, reais, eternas. E quando àquele operário, que é o subconsciente, sejam transmitidos motivos de trabalho desse gênero, a sua construção se dará em correspondência, um efeito similar à causa. E então a Lei não nos oporá mais obstáculo; mas ela mesma nos tomará sobre suas asas para nos levar ao alto como é seu desejo. Dessa forma a morte não será mais o fim do senhor, o Eu, isto é, de tudo, mas somente o fim de um servo que nos deixa, cansado do serviço cumprido. Assim, não somente desaparecerão doenças, dores, misérias e escravidão, mas nos encontraremos repletos da alegria de viver, que não consiste na posse, como a louca psicologia hodierna acha, mas num equilíbrio de todo o ser em todo aspecto e atividade, no mais pleno acordo com o querer indestrutível da Lei. Então tudo nos virá ao encontro, festivamente, riqueza, saúde, amor, afetos, conhecimento, êxito. E pensar que os métodos modernos crêem resolver a vida com uma justiça econômica poluída na origem, pelo método da extorsão violenta, com uma tal perversão do Evangelho! Mas o que não está invertido hoje, na época de Satanás?
   
Essa é a realidade sólida da vida, a filosofia que exaure e convence, sem abstrusas elucubrações acerca de particularidades e sem intelectualismos inúteis, a filosofia feita para viver. É verdadeiramente piedoso o espetáculo desta pobre humanidade, vítima da sua ignorância das mais elementares leis da vida. Não se trata de compreender o funcionamento de um mecanismo. É natural que um primitivo procure abrir as portas, arrombando-as. Porém é um sistema desastroso, sobretudo para ele. Quem viu verdades mais elevadas, isto é, o mecanismo segundo o qual aquelas portas funcionam, com um ligeiro e hábil movimento de dedos, gira a chave, abre e entra. Assim o homem, tão justamente ávido de domar e dirigir, para tornar-se senhor de tudo, em vez de começar a saber comandar a si mesmo, como a Lei impõe, procura comandar os outros, incitando a resistência e a revolta. Ele segue assim o único caminho para não se tornar senhor de nada. E, infelizmente, com pobre domínio, contrastado, mal seguro e sempre pronto a cair, tiveram de se contentar todos os imperadores do mundo, porque a quem ignora e viola a Lei, nada pode ser concedido, senão o pior. Os impérios duradouros não podem ser senão os do espírito.

Diz-se que o espaço esteja fechado, conforme uma transmissão curvilínea da luz, da energia, que retorna ciclicamente sobre si mesma. Essa hipótese física nos pode dar a imagem do sistema de retorno das forças que o Eu, centro genético, lança qual fonte, pelo que cada Eu, à semelhança de Deus, é centro de um Seu universo em que todo efeito retorna à sua causa. Trata-se do mesmo princípio repetido do plano físico ao espiritual, por universal lei de analogia. E também em Deus e Seu universo, tudo, toda criatura, retorna ao Criador. Assim nós qual centro irradiante nos construímos e ao nosso ambiente, à nossa imagem e semelhança, e fazemos a nossa atmosfera, como queremos. Esta, pois, nos liga qual nosso fatal destino. O pensamento tem verdadeira potência criadora. Todo o universo é baseado sobre esse princípio. Mas potência criadora somente enquanto e até aonde se vai conforme a Lei, e não contra Ela. De outro modo se tem uma potência destrutiva. O princípio de destruição não representa senão o caminho percorrido por Satanás, inverso do percorrido por Deus. Que o pensamento no bem ou no mal, plasma as coisas, para o belo, o bem e a vida, ou para o feio, o mal e a morte, vemos em nosso organismo, no qual é evidente a construção ideoplástica, por exemplo nas impressões maternas, que se podem imprimir no feto. Que seja o espírito que modela o seu corpo, o vemos no fato de que uma idéia fortemente sentida e constantemente vivida, se imprime em nosso rosto que assim acaba por revelá-la debaixo de qualquer máscara. Assim a idéia dominante se torna um caráter somático. Atrás de um impulso enérgico e tenaz do espírito, também os ossos e os tecidos se plasmam.

Eis, em breves traços, o que aparece quando se alcança a visão de verdades mais elevadas. Desponta, então, uma economia universal supernormal, que sabiamente regula a vida em todo campo. De tudo isso se vê quanto está fora do caminho o mundo moderno na procura da felicidade, e quando esteja longe de a poder alcançar. Assim se compreendem as suas infinitas desgraças que, como dissemos, constituem fenômeno lógico e justo num organismo universal onde quer que seja e sempre perfeito. Não há mais que uma fórmula para entrar no reino da alegria, que é a do Evangelho: "Ama o próximo como a ti mesmo". Ela representa a retificação divina da perversão satânica. Mas que pode compreender de tudo isso nosso mundo de hoje, se nada sabe do funcionamento orgânico do universo e ignora, não somente a estrutura da Lei, mas a sua. própria existência? Que podemos pretender, quando o homem moderno, com o seu materialismo, nega francamente o espírito e em lugar de partir deste que é o princípio genético, causa de tudo, inversamente parte do mundo físico e do corpo, que são simples efeitos? Que conclusão pode tirar uma ciência assim invertida, senão a universal destruição? Entretanto, tudo isso já foi dito, há tempo, pela filosofia hindu, que é a mais antiga e profunda que o homem conhece. A moral está em que nosso século é um período  de transição, que tem a função de liquidar, numa destruição geral, a atual pseudo civilização, construída às avessas, isto é, sobre a matéria em vez de ser sobre o espírito; tem a função de desembaraçar, com isto, o campo para uma civilização nova, corrigida, construída sobre o espírito em vez de o ser sobre a matéria. Frente a essa nova grande civilização do terceiro milênio, a atual tem, apenas, a função de preparar a parte mecânica que possa depois prover automaticamente a execução dos serviços materiais, de modo que o homem se dedique a algo mais importante. Resolvidos os dois maiores problemas que hoje, nos atormentam, quais são a paz universal sob um governo único e a justiça econômica e social, problemas que a história nos propõe para uma iminente solução, o novo mundo poderá começar a utilizar os resultados da ciência atual, não mais para destruição da guerra, mas para o próprio bem-estar. Então por estes servido, ele poderá superar a luta pelas necessidades materiais, primeiro problema de hoje, para enfrentar lutas e problemas superiores, próprios de um mais elevado nível biológico, hoje não compreendido, onde domine, não a matéria, mas a grande potência do espírito.

O    mundo de hoje escolheu o caminho na direção descendente, para o relativo e o particular, em vez de escolhê-lo para a unidade. Por essa razão o saber é divergente, a ciência é analítica, a concepção da vida é materialista e se exaltam, não os valores centrais genéticos do ser, mas os periféricos da forma; por isto o conhecimento perambula penosamente por entre uma miríade de efeitos, sem ser capaz de penetrar as causas. Tudo assim se constrói ao reverso, o trabalho se torna contraproducente, o construir vem a ser destruição e tudo se pulveriza nas mãos de pseudo-construtores. É verdade que no fundo da obra do homem está a obra da Lei preparando a correção salvadora. Mas, o mundo caminha com a cabeça para baixo. Vive-se em uma atmosfera de esmagamento. O tempo, isto é, o limite, se tornou o senhor, o tirano. Tudo se secciona, se fraciona, se subdivide. A idéia de superar o tempo com a velocidade é um delírio. Do tempo não se evade, não se supera acelerando o passo, mas vivendo fora do tempo, sem qualquer movimento no espaço. São bem escassos os lucros de tempo dados pela velocidade; trata-se de pequenos deslocamentos de correlações e o tempo fica e com ele o limite. Um certo alargamento de horizontes e o espírito permanece sempre fechado numa prisão, que é somente um pouco mais ampla. Pequenas expansões que não podem saciar a ânsia do infinito que está na alma. Nunca houve tanta falta de tempo como agora, quando se dispõe de tão rápidos meios de comunicação! A nossa ansiosa corrida sem paz, que chamamos dinamismo, não é uma vitória, mas uma derrota, não é a nossa força, mas a nossa fraqueza. Exaltâmo-la como uma nossa nova virtude e potência, e é um defeito nosso e inferioridade. Estamos fechados em um sistema virado às avessas, no qual quanto mais se corre tanto menos se chega, que em vez de nos ajudar nos esmaga. E o preciosíssimo tempo se esmaga e pulveriza em mil coisas, sem nada nos trazer de concludente. Que felicidade construiu essa corrida contínua? A nossa era foge das idéias centrais sintéticas, unitárias. Quem se coloca na circunferência está obrigado pela sua própria posição a uma afanosa corrida contínua, para dominar apenas uma parte daquilo que, quem está situado no centro, domina sem se mover absolutamente. Daí a nossa necessidade de correr. Mas é sempre um correr periférico que não alcança a meta. Os imóveis sábios orientais, reclusos nos conventos do Tibete, podem bem olhar com piedade para a nossa vertiginosa sociedade, que em cima do edifício das suas conquistas vê apresentar-se o suicídio atômico. E no entanto a corrida do "tempo é dinheiro", é a sua punição. A presença do nosso erro é revelada pela nossa ansiedade. Quem encontrou, não procura. O tormento e a pressa são índices de vácuo interior, de fome de espírito, de ameaçadoras carências. As mais altas verdades satisfazem a fundo, a sua compreensão dá calma, o que é índice seguro para reconhecê-las. Encontramo-nos, ao contrário, num redemoinho de filosofias, de relativas interpretações da vida. Os seus princípios fundamentais entretanto não mudam e são eternamente idênticos aos da busca vã de soluções e da sua vã procura. A contínua necessidade de novidades é a primeira característica da nossa posição periférica e relativa. Todavia, o homem atual deve viver e percorrer a sua fase biológica. Que outra coisa podemos hoje esperar dele? Chegará, no tempo próprio. Cada coisa está sempre perfeitamente em seu lugar.
   
Neste ponto surge espontânea em nossa mente a pergunta de como seja possível, por evolução, a passagem da nossa mente para uma fase mais elevada, bem como a correção do nosso mundo pervertido, num mundo melhor, para curá-lo de seus erros. Não é possível negar que, mesmo a nossa economia normal, não tenha as suas leis e equilíbrios. Como se pode demolir a premissa axiomática do egocentrismo que, se existe, é porque tem a sua função? Como se pode passar da economia egoísta do "do ut des"6   à economia altruísta do "ama o próximo como a ti mesmo"? Certo é que, à primeira vista, parece bem estranho, tanto está fora da nossa psicologia, esse sistema de obter as coisas, não enfrentando-as para as agarrar, mas em as deixar vir espontaneamente a nós. O que nos parece muito estranho é, entretanto, uma realidade experimental que se verifica com todos aqueles que se apresentam, além do limite do nosso plano de evolução, em outros superiores. E quem pode negar uma realidade experimental, os fatos dos quais também a ciência se faz escrava, só porque não chegou até lá, não vê nada, e, não podendo compreender, nega? Se posso falar longamente dessa economia supernormal, é porque vou largamente experimentando-a. Limito-me a indicar aos meus semelhantes as observações objetivas, por mim controladas racionalmente, feitas explorando a sua realidade pouco acessível. Mas certo é que, para quem as alcança, elas possuem a potência das coisas mais vizinhas, atuais e concretas, tanto de se poder fazer depender delas também o contingente da própria vida.

A passagem da economia normal à supernormal torna-se possível e compreensível, quando se chegou a sentir que a essência da vida e do criado é Amor. Ele é a maior força do universo, que o rege e, no fim, tudo vence (v. Deus e Universo cap. 15 e 16). Por isto é lógico que o Amor abra todas as portas, e que, ao contrário, o egoísmo as feche. E uma verificação de fato, para quem vê, que essa é a mecânica do sistema. Para poder, pois, atingir as infinitas riquezas das quais o criado extravasa, é necessário passar pelo caminho do Amor. Eis que o Evangelho pode ser também o mais seguro método para enriquecer e com que riquezas! Não se quer com isto dizer que num mundo de justos todos estariam bem como conseqüência da honestidade de todos. O fenômeno é pessoal e os resultados são acessíveis em qualquer mundo. A riqueza não nos vem, somente, pelos efeitos que o sistema produziria se coletivamente aplicado, mas nos vem porque o indivíduo põe então em movimento algumas recônditas forças da vida que o compensam e o premiam, porque ele caminha conforme a Lei, que é Amor. Em suma, o cálculo econômico não é o resultado de trocas de meios entre homens, mas de forças  entre o indivíduo e a vida. O próprio semelhante aqui não tem entrada, e se aparece é como meio, freqüentemente inconsciente, manobrado pelas forças referidas. A conversa não se faz com o homem, mas com Deus, com base nas próprias ações e no real mérito próprio.

Trata-se de uma economia superior que dista da normal como o cálculo infinitesimal da aritmética elementar. A vida funciona com os princípios das várias economias, conforme os planos de evolução. Quanto mais alto se sobe, tanto mais ela opera segundo a divina lei da criação, que é o Amor. Quanto mais se sobe, tanto mais o rudimentar princípio de equilíbrio "do ut des" se torna completo, passando da lei do talião para a lei do altruísmo, dois graus de justiça diversos. O universo está regido por princípios dados e fixos. Estes representam a estrada sobre a qual os seres podem caminhar como querem, mas a estrada está traçada. Somos livres, porém teremos em proporção do que tivermos dado. Se usarmos com egoísmo quanto nos vem dado pelas fontes da vida, ou seja, contra a lei do Amor que tudo rege, maior será a contração das forças que regulam a distribuição dos bens. Quanto mais egoísta for o indivíduo, tanto mais se restringirá o canal, que tende a se fechar, até que a fonte não flua mais e todo auxilio seja negado. Nesse sistema os bens podem vir a nós mais do que na medida dada pela nossa capacidade de extorsão, na medida dada por aquilo que merecemos. É difícil experimentar isto em nosso mundo apressado, porque o mérito não se conquista em um instante, mas com longa preparação. Este depende, como a saúde, do tipo biológico e do regime constante e ação. Por essa mesma lei do amor, um trabalho feito somente com a finalidade do pagamento, isto é, egoisticamente, é muito menos criador e vital do que o trabalho fecundado pelo Amor que aumenta a sua potência genética e diminui a fadiga, até que, nos planos mais altos, se torna livre e alegre ato criador que reflete o divino ato da criação. É a nossa involução que faz do trabalho uma condenação, uma fadiga, uma escravidão. Subindo, tudo se liberta, se alivia na alegria, se torna potência a um só tempo no seu rendimento. E a ascensão se cumpre no Amor.

A dificuldade no inicial tal novo método é dada por um agravamento da fadiga, que já é tanta em um baixo plano de evolução. Quanto mais se está embaixo, tanto mais se é pobre e onerado, sendo então muito mais necessário e maior o esforço para se tornar livre. Não há mais que iniciar o trabalho com paz e tenacidade. A evolução não se força e não se precipita. Ela é uma lenta marcha de resistência. No princípio, teme-se uma nova limitação e o egoísmo se revolta. Acaso será possível se desatarem os nós, continuando-se a estreitá-los, ou, pelo contrário, afrouxando-os pelo caminho inverso? Somente invertendo-se o caminho da involução é que se pode evoluir. A princípio somos desviados pela ilusão que nos faz temer uma piora de condições. Mas se se viesse claramente, saber-se-ia que o egoísmo em nada sofreria, porque a vida é sempre utilitária e quer o nosso bem. O sistema é verdadeiramente vantajoso. Os obtusos responderão que não se deixam lograr por esses especiosos e capciosos raciocínios e ficarão pobres e cansados servos do que puderam agarrar. Naquele plano é muito difícil compreender o Evangelho, quando diz: "Pensai nas coisas do Espírito e o resto vos será acrescentado". Entretanto, essa coisa que parece tão absurda, posso testemunhar que para mim foi experimentalmente verdadeira. Somos filhos de Deus, Pai amoroso. Ele, infinitamente rico, nos proverá de tudo, se nós estivermos com Ele. Os seus escrínios são sem limite e sempre cheios, a chave para abri-los é o Amor, e tudo se pode deles tirar em proporção. Quanto mais se ama, tanto mais se dá, e quanto mais os escrínios se abrem, tanto mais recebemos. Quanto menos se ama e se dá, tanto menos eles se abrem e tanto menos nos darão. Com a avidez e a força, eles não se abrem, mas se fecham, e nada se toma, porque a vida, em face do egoísmo e da violência, se contrai, defende e nega.

O único caminho para sair de toda limitação está somente no iniciar progressivamente uma série de ações positivas em direção altruísta, isto é, expansionista. É o caminho dos santos. A maioria se retrai amedrontada. Assim aconteceu ao jovem que perguntou a Cristo que deveria fazer para tornar-se perfeito. Quando ouviu responder-lhe: "Si vis perfectus esse, vade, vende universa"7 , ele se retirou triste, sem aceitar o conselho. E assim os caminhos das maiores riquezas se fecham. É bem difícil despedaçar o circuito dos vínculos terrenos em corrente e é necessária uma energia pouco comum. Estamos embaixo e, somente se tivermos a força de subir por nós mesmos, poderemos ver a luz e provar a felicidade. Estamos embaixo e o mundo procura o conforto ao descer ainda mais para baixo, criando assim nova dor, fechando-se assim sempre mais nos limites da involução e na prisão do egoísmo. Mas a saída está no lado oposto. O homem deve tentar e sofrer muito ainda, para a encontrar. E. lei que não se possa subir para a felicidade senão através do sacrifício e do Amor, os grandes princípios sobre os quais se apoia o universo. Infelizmente, isto não se faz ou não se quer fazer. E então, na expectativa de saber subir, ficam na terra a dor e a miséria, herança própria desse plano de vida. Não há remédio senão no saber e querer fazer o esforço para sair dele. Esta é a estrutura do sistema. Se não quisermos subir, ficaremos na dor e na miséria, como é justo em um universo perfeito.

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6 “Dou para que dês”. (N. do T.)

7 “Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens” – Mateus, 19:21