Como a sabedoria da Lei, corrigindo erros e excessos com os sofrimentos, leva o ser livre para a sua evolução final. Origem e função dos instintos.

Explicamos como a evolução nos leva sempre mais para o estado orgânico. Da desordem, resultado um individualismo separatista, nos conduz à ordem, situação final ao nos harmonizarmos com a Lei. Quanto mais evoluímos, tanto mais a Lei nos disciplina, irmanando-nos e conduzindo-nos à unificação. Esta é a nova lição que o homem tem de aprender. As outras, da animalidade, foram já aprendidas, e demorar-se nelas significaria retardar o caminho da subida e ficar atrasado nos níveis inferiores da vida.

A vida oferece lições proporcionadas ao plano de existência em que o ser se situa, de acordo com suas vicissitudes. Todavia, o homem tem de apreender outros instintos que não sejam os de agressividade, de engano, de orgulho, de cobiça, de sensualidade que, se foram úteis num estado de desordem geral, não o são num mundo organizado. Estas são as posições do passado, não as do futuro. E a evolução é uma força viva, presente dentro de nós, fazendo pressão, constrangendo-nos à subida de modo premente. Isto quer dizer: chegou a hora de progredir, levando aqueles instintos para a frente, elevando-os a um nível superior, onde a coragem não reside na agressividade, a inteligência não se usa para enganar, a consciência de si mesmo não é orgulho que despreza o próximo, a cobiça não serve ao próprio egoísmo, mas destina-se ao bem de todos, e o espírito não é servo, mas dono dos sentidos. A vida na sua evolução quer agora criar na Terra um novo tipo biológico, um homem mais adiantado, ao qual confiará a tarefa de organizar a nova ordem do mundo. O ser dos futuros milênios, mais evoluído olhará para o tipo humano atual como nós olhamos para os primitivos dos milênios passados.

Assim, tudo está claro, e se for colocado no seu devido lugar; encontra sua lógica explicação, se for colocado em seu devido lugar. Também as feras têm de aprender sua lição e a Lei, para elas, proporciona-a na forma e medida que pode ser entendida. Para o homem selvagem as aulas são um pouco menos duras, porque ele desenvolveu mais inteligência e sensibilidade. Para o homem atual, pelo progredir destas qualidades, ainda melhoram as condições de vida, porque, como é lógico; com o evoluir, já é possível que as provas necessárias ao aprendizado se tornem sempre mais leves e inteligentes. Cada nível tem de cumprir um gênero particular de experiência, conforme o tipo biológico que o ser deve construir. Tudo muda de um plano para outro, inclusive a maneira de conceber e julgar. Poderíamos assim dizer que em cada nível de vida vigora uma lei, e com ela uma diferente moral. O que é normal, justo e lícito para uma fera não o é para um selvagem e ainda menos para um homem civilizado. Encontramos assim tantos sistemas de moral sobrepostos quanto os andares dum edifício; o inferior sustentando o superior, subindo sempre; são andares dum edifício que se levanta sempre mais e que representa a construção progressiva do próprio eu. Enquanto o ser permanece em determinado plano, ele aceita a moral desse plano com naturalidade, mas logo que sobe para um plano superior, escandaliza-se com a moral do inferior, que para ele se torna corrompida e ilícita. Tudo depende do nível de onde parte o julgamento. A fera é julgada fera pelo selvagem ou pelo homem civilizado. Mas, para as feras não é fera. Assim, o selvagem é selvagem para nós, mas para os seres do seu nível não é selvagem. Nós nos consideramos civilizados em relação às feras e aos selvagens, mas poderíamos ser considerados selvagens por seres mais evoluídos; e selvagens nos julgaremos a nós mesmos, quais hoje somos, quando tivermos progredido mais. E como reputaríamos criminoso um homem selvagem que praticasse entre nós a sua moral de antropófago, assim numa humanidade mais civilizada poderiam ser considerados criminosos os métodos de luta do homem atual.

Desse modo, compreende-se como os seres inferiores não podem ser condenados pelos seus instintos. A presença destes, como de tudo o que existe, e explicado pela própria função que exerce. Nada existe, sem um motivo, sem um escopo a atingir e uma razão que o justifique. Mas, permanece o fato de que os instintos inferiores revelam a inferioridade do ser, que aí tem de ficar, enquanto não evolua do seu plano inferior, sujeito à dura lei que ali vigora. Se o ser é um diabo, seu legítimo lugar, onde ele tem de morar, é o inferno, Se ele subiu até o nível do anjo, então o lugar que lhe pertence, onde ele tem de morar, é o paraíso. Isto quer dizer que o primeiro ficará sujeito às leis do inferno, enquanto o segundo será regido pelas leis do paraíso. A punição e o prêmio são inerentes à própria natureza do indivíduo e se realizam automaticamente, sem castigo nem vingança, porque correspondem à posição de cada um A fera está sujeita à dura lei da fera. Cada um recebe conforme a justiça, segundo o que é, porque, de acordo com o seu nível, ele se coloca no degrau que lhe pertence ao longo da escada da evolução. Justiça automática, inflexível e perfeita, porque cada ser traz em si mesmo o julgamento, a pena ou a recompensa nas condições de vida que merece.

Dissemos acima que a presença dos instintos se explica pelo fato de corresponderem ao cumprimento da sua própria função. A fome ensinou o animal a desenvolver sua força e inteligência na arte de capturar os outros animais para devorá-los. A função do instinto, nesse caso, é a conservação da vida individual. Querendo aumentar a legítima alegria que vem da satisfação da fome, no homem nasceu a gulodice, que já é ilegítimo gozo a provocar distúrbios e doenças. Estas representam o freio com que a Lei resiste a toda a violação da sua ordem e equilíbrio, para conduzir tudo novamente à justa medida. Assim se explica como nasceu no homem aquele instinto e também a necessidade de corrigi-lo, reconduzindo-o aos devidos limites.

As exigências do impulso sexual ensinaram o animal a amar. A função do instinto, neste caso, é de assegurar a continuação da espécie. Querendo aumentar a legítima alegria do amor, no homem nasceu a sensualidade, que no excesso dos vícios provoca também distúrbios e doenças, pelos quais a Lei resiste à desordem e nos guia para a justa medida. Entende-se, assim, como no homem nasceu aquele instinto e também a necessidade de corrigi-lo, reconduzindo-o à sua devida disciplina.

A absoluta exigência de sobreviver contra todos os assaltos num ambiente hostil, gerou no animal o indispensável instinto de conservação, ensinando-lhe o egocentrismo e a arte do ataque e da defesa. A função destes instintos é a de construir o indivíduo, forte e astuto, apto a defender-se a si mesmo, inclusive atacando: - o vencedor na luta pela vida. Querendo reforçar a sua individualidade e fortalecer as suas defesas, no homem nasceu o egoísmo separatista e a agressividade bélica, e ele se tornou guerreiro, escravizador de vencidos, dominador de povos. Em consequência de tudo isso nasceram os males que atormentam a humanidade e com os quais a Lei quer restabelecer a ordem. Explica-se, assim, como no homem nasceram esses instintos e também a necessidade de corrigi-los, reconduzindo-os a sua justa medida.

Explica-se, assim, como da necessidade da defesa nasceu, para os fracos, a arte do engano, cujo excesso gerou o instinto da mentira, a qual não permite discernir a verdade do fingimento. Isso criou um ambiente de traição insuportável para todos, e a necessidade de ser honesto e sincero para corrigi-lo.

Se desta maneira se compreende a origem dos instintos, ou seja, a necessidade de cumprir uma função de auxílio à vida, revela-se também a outra necessidade de dominá-los conforme os princípios da Lei e de corrigidos, reconduzindo-os até seus limites. Se os instintos não se modificarem paralelamente à evolução, as qualidades que antes eram úteis à vida se tornam prejudiciais, à medida que ela progride. É assim que o ser tem de transformar-se de animal em homem, e de homem em super-homem, porque chegando a um nível superior, a vida requer outras qualidades e o ser tem de adquiri-las.

Os instintos inferiores se justificam enquanto permanecem no seu nível, onde têm uma função a cumprir. Mas, tornam-se abuso, defeito e culpa nos níveis mais adiantados. O verdadeiro progresso é constituído por esta íntima transformação da natureza do ser, que adquire hábitos e constrói instintos superiores, por cima dos antigos, num contínuo processo de melhoramento e aperfeiçoamento. É assim que, como já dissemos, o egoísmo separatista e o desenfreado individualismo do homem primitivo têm de transformar-se no altruísmo unificador, indispensável ao homem evoluído, habitante no estado orgânico da futura humanidade.

Este fenômeno da reorganização do caos - reordenação da desordem na ordem, do excesso na moderação, do abuso na disciplina da Lei, pelo fato de ser fundamental no processo evolutivo, e de ter, por isso, absolutamente de realizar-se, é automático. Entramos aqui no aspecto determinístico, no ponto de vista inviolável da Lei, no qual não pode entrar a livre-escolha do homem. Este é irresistivelmente levado a realizar em si mesmo o controle de seus instintos por intermédio do autodomínio, e até que se disponha a aprender a viver na ordem, permanecendo dentro dos limites marcados pela Lei, terá de sofrer as dolorosas consequências que disso derivam Este efeito que parece cruel, pelo qual qualquer movimento errado gera dor, esta automática reação à  qual não se pode fugir e que parece uma vingança de um Deus desapiedado pela ofensa recebida, é a maior Providência devida à Sua sabedoria e bondade, porque representa o remédio amargo que cura a doença. A função da Providência é a de conduzir o ser para sua salvação final, levando-o à felicidade.

Com o objetivo, para um ser livre e ignorante, cada experiência implica também na prova do excesso e do abuso, o que traz como consequência, situações opostas às da satisfação, a qual se encontra somente dentro dos devidos limites. Não é escravizando-nos que a Lei nos guia para nosso bem, o que não se poderia conciliar com a bondade de Deus, mas sim compelindo-nos indiretamente, sem violar nossa liberdade. Mas, como poderia Deus chegar a isto, respeitando a vontade dum ser ignorante que, para aprender (o conhecimento é necessário para subir e salvar-se) tem de experimentar tudo? A Lei resolveu o problema deixando corresponder na sensibilidade do indivíduo, cada vez mais aguçada, a cada movimento, uma determinada sensação, boa ou má.

Desse modo, cada ato nos leva, conforme sua natureza, a um correspondente resultado, isto é, a um estado de satisfação, quando as ações são praticadas de acordo com a lei; e, ao contrário, a um estado de aflição, quando as ações são praticadas em desacordo com as normas da Lei. Trata-se da verdadeira satisfação, mórbida, enganadora e transitória, cuja tendência final, porque foi obtida pelo abuso contra as regras da Lei, está presa a uma lógica conclusão: o sofrimento.

Isso acontece todas as vezes que saímos dos limites estabelecidos pela Lei, não somente pela qualidade do ato, mas também pela sua quantidade. Assim, o que é lícito e satisfatório na sua justa medida, torna-se ilícito, prejudicial e doloroso, no excesso. Este é um erro em que é fácil cairmos, iludidos pela impressão agradável da primeira satisfação e impulsionados a aumentá-la com o abuso. Mas, eis que a Lei nos reconduz à justa medida, porque se o uso de uma quantidade um dá a satisfação um, se dois dá resultado dois e três resultado três, não é verdade que, se continuarmos acrescentando as doses, sempre aumente proporcionalmente a satisfação. Pelo contrário, quatro continuará a dar-nos o prazer de três ou pouco mais, cinco não será mais agradável, mas dará só um sentido de saciedade, seis começará a enjoar-nos, e quando chegar à quantidade sete começará o sofrimento. Esse emborcamento do prazer da satisfação na amargura do padecimento, não é senão a lição da Lei que ensina a nos corrigirmos, voltando ao caminho correto.

Desta maneira, sem ser constrangida, livremente abandona o erro; este é expulso automaticamente, porque é repelido pela respectiva sensação de desgosto. E através da própria experiência, ele mesmo vai cada vez mais relacionando sua dor com o erro cometido. Assim, a Lei vai ensinando ao ser, ansioso por movimentar-se, ardente de desejos, mas inexperiente, como agir com inteligência, sem cair na dor.

Eis o que podemos ver, por trás dos bastidores, na realidade da vida. Muitas outras maravilhas ainda se encerram na Lei e as iremos analisando em nossos estudos.