A desobediência à Lei se torna autopunição e a revolta é autodestruição. As maravilhas da técnica da conexão do erro para chegar à salvação.

A lição que a Lei de Deus nos quer ensinar, infligindo-nos dor com a sua reação, é a do caminho certo e a da justa medida. Todos procuramos atingir a maior satisfação, e isto não é contrário à Lei, pois que esta quer a nossa felicidade. O que está errado não é esse desejo em si, mas, devido a nossa ignorância, os meios escolhidos para realizá-lo. A Lei não quer o nosso sofrimento, mas somos nós que o produzimos, violando a sua ordem. Qualquer que seja o nosso desejo e revolta, não podemos deixar de viver dentro dessa ordem. Mas, o homem não quer levar em conta o fato positivo da presença dessa ordem: prefere substituí-la pela desordem criada por uma lei do seu eu particular. Só sua ignorância pode acreditar nessa possibilidade. Até a ciência positiva nos demonstra, cada dia mais, que vivemos cercados de leis por todos os lados.

Em tal ambiente, é lógico que todos os movimentos errados não possam produzir senão efeitos errados. Pela sua natureza mesma, como podem movimentos errados atingir resultados certos? O trânsito de veículos e pedestres nas ruas não se poderia realizar sem regras. Que aconteceria se num relógio cada roda quisesse tornar-se independente das outras para movimentar-se por sua conta? E que música poderia executar uma orquestra se cada um dos seus componentes, em nome da liberdade, quisesse tocar a seu bel-prazer? Apesar de ser evidente a necessidade de movimentar-se conforme uma disciplina, o homem julga possível, no terreno mais elevado, que é o da sua conduta, sobrepor a desordem a ordem da Lei, sem prejuízo e até com vantagem. E tanto acredita nessa loucura, que a considera como a prova maior da sua sabedoria. Por isso, em nosso mundo vemos realizar-se o que aconteceria numa rua onde carros e pedestres corressem uns contra os outros, ou num relógio feito de rodas que lutassem pela sua independência umas contra as outras, ou numa orquestra em que cada um tocasse o que quisesse. Assim se explica por que neste mundo se verificam os efeitos que vemos. O resultado de tanta "sabedoria" é caos e sofrimento.

A Lei quer a nossa felicidade, mas esta só é concedida a quem permanecer em sua ordem. Quem sai dessa ordem sai também daquela felicidade. Por isso, é regra fundamental: sem disciplina não se pode atingir satisfação. Todos procuramos alegria, sempre maior alegria, o que é justo e concorda plenamente com a vontade da Lei de Deus á Mas, este contentamento não se atinge, como se julga, fartando-nos com qualquer das satisfações humanas comuns, mas aceitando-as só na justa medida. Eis o que a Lei nos quer ensinar quando nos deixa recolher amarguras, seja no excesso como na carência. A toda nossa tentativa de exagerar para subverter a ordem, chega o golpe da Lei que nos reconduz para dentro da ordem. Não é que a Lei exerça vingança e nos puna. A Lei está sempre firme. Somos nós que a movimentamos, e com os nossos movimentos errados produzimos resultados dolorosos. Ela é como um instrumento musical. Um pianista que conhece o teclado pode extrair do seu piano música maravilhosa. Mas, se o tocar, ao acaso, um inexperiente de música, não poderá alcançar senão irritantes dissonâncias. É o que todo dia fazemos com a Lei. Não é surpresa, portanto, se no mundo não encontramos senão desafinações e discordâncias dolorosas, tendo, como consequência, de ouvi-las até aprendermos a tocar.

Todo abuso fere e queima para nos ensinar a lição da ordem e desenvolver em nós o instinto do autocontrole e o sentido do equilíbrio. Vamos, assim, aprendendo, através de tantas experiências de uso e abuso, a viver na ordem, fazendo de tudo bom uso. Os instintos, como dissemos, representam desejos que nasceram e se fixaram pela necessidade de satisfazer exigências vitais, e se justificam enquanto permanecem dentro dos limites dessa sua função. Isso é o que se chama permanecer na ordem. Tudo na Lei tem o seu devido lugar. Assim, é bom, e gera boas consequências o fato de comer para sustentar o corpo, mas é mau e produz más consequências o fato de comer demais por gulodice. Também é bom descansar depois de ter trabalhado, mas é mau o ócio da preguiça. Assim também a liberalidade não pode tornar-se esbanjamento e dissipação, como o espírito de economia não deve chegar a avareza. Da mesma forma, a consciência de si mesmo não tem de transformar-se em orgulho, tanto quanto a vontade de ganhar com o trabalho, o necessário para viver, não deve tornar-se sórdido apego ao dinheiro e imoderada cobiça de riqueza.

Os erros se podem cometer não somente no sentido da quantidade, mas também através da qualidade dos nossos atos. Pela lei do mínimo esforço procuramos, para atingir os maiores resultados, trabalhar o menos possível, isto é, em vez de seguir o caminho direto, seguir o da astúcia, andar por travessas e atalhos, que são desvios fora do caminho certo do trabalho honesto, que é o único capaz de conferir-nos a base segura do merecimento. Gostamos de coisas bem-feitas e que os outros as façam assim para nós. Mas, julgamos ser hábeis quando, com o engano, sabemos levar vantagem sobre os outros, entregando-lhes produtos malfeitos. Assim, desaparecem a credibilidade e a confiança; a mentira embaraça cada vez mais a vida social.

A honestidade da Lei exige: quem estiver em determinada posição social deve cumprir a sua função. Logo, os governos deveriam preencher a função que justifica o seu poder, que é a de dirigir, defender e ajudar os povos. Mas, infelizmente, quanto mais o homem é primitivo, tanto mais concebe o poder egoisticamente, isto é, não como uma função para o bem coletivo, mas só como um meio para satisfazer sua ambição e seu desejo de glória e riqueza. Se não existisse esta vantagem pessoal e imediata, não se explicaria tanta luta e dissipação de recursos para a conquista do poder. Pode, porém, acontecer que os povos se apercebam desse jogo dos seus governantes. Estouram, então, as revoluções, com que se ajustam ás contas e, como aconteceu na revolução Francesa, se faz a liquidação das classes dirigentes. Esses movimentos representam uma desordem, que não poderia nascer se não fosse gerada por outra desordem, originada, em geral, do abuso dos dirigentes. Isto faz crer que, na Terra, a justiça da Lei não se possa realizar senão por uma contínua correção de abusos, parecendo ser, afinal, a tendência predominante no instinto do homem.

Poder-se-ia então perguntar: se esta é a realidade atrás das aparências, que jogo estranho se esconde por trás dos métodos eletivos, e qual a significação do direito de voto para povos que não sabem usá-lo? Neste caso, na prática, o voto não é um direito, porque não pode ter direitos quem não sabe o que faz, mas é uma escola para aprender a usar esse direito, escola dolorosa, porque, conforme a Lei, os erros não podem ser corrigidos senão através da dura experiência dos próprios sofrimentos. Em todos os campos o homem rebelde tem de sofrer para aprender; nesse caso os povos têm de sofrer tirania e exploração até aprenderem a eleger seus dirigentes; e os governantes têm de sofrer revoltas até que aprendam a governar com honestidade. Cada um recebe as consequências dos seus atos, conforme seu merecimento. Assim, os governantes têm os povos que merecem, e os povos têm os governantes que merecem. A vida não pode basear-se em valores fictícios, mas exige valores reais. Quem não vale nada e não faz nada, não recebe nada, até aprender a valer e fazer alguma coisa com valor. Esta é a justiça da Lei de Deus.

Como vemos, os princípios da Lei repercutem em todos os aspectos da vida. A exatidão da sua justiça se expressa pela lei de talião, porque a reação corretiva corresponde exatamente a natureza e proporções da culpa. Por isso, foi possível interpretar a fenômeno dessa reação como vingança de Deus, em semelhança a lei de talião. Conhecemos agora a técnica da Lei para corrigir o erro e, sem imposição, obter obediência. O resultado, apesar de a criatura ficar livre, é obedecer. Isto, porque sair da Lei constitui o maior erro, o que equivale ao maior sofrimento. Assim, tudo o que está dentro da Lei é bom, belo, agradável, enquanto o que está fora dela é mau, feio, doloroso. A maravilha dessa técnica está no fato de, em última análise, não ser possível rebelar-se contra a Lei, porque fora dela não há vida, nem satisfação. Os rebeldes que querem desobedecer a Lei, distanciam-se, eles próprios, do paraíso e lançam-se no inferno; querendo emborcar a Lei, emborcam-se a si mesmos, condenando-se a viver de borco, num mundo contravertido. Emborcado quer dizer, ao invés de felicidade, o sofrimento, em lugar da vida, a morte. Assim a desobediência é suicídio, é autocondenação e autopunição, que o rebelde executa com suas próprias mãos contra si mesmo.

Os rebeldes quereriam libertar-se desse jugo da Lei, porque, em sua ignorância, julgam e acreditam seja isso possível. Ora, a Lei é a substância da vida, porque nós mesmos em essência somos Deus, e desse modo, também, Sua Lei. Portanto, se chegasse a haver uma verdadeira revolta e se ela alcançasse sucesso e vencesse a batalha contra a Lei, isto seria destruir nossa própria vida. A Lei está arquitetada de maneira que, automaticamente, a revolta, movimentada pelo rebelde, por si própria constitui a força que o leva a sua destruição. Se, desta maneira, rebelar-se, quer dizer destruir-se á si mesmo, mais cedo ou mais tarde, há de se acabar com a revolta se não se quer ser destruído. Disso não se pode tugir. A Lei é o pensamento e a vontade de Deus, e se fosse possível destruí-la com a revolta, seria possível também destruir Deus, o que é o mais inaceitável dos absurdos. Então, que faz a Lei? Liberta-se da doença da revolta, liquidando-a e eliminando-a do seu sistema, e anulando os rebeldes. Este seria o verdadeiro inferno eterno: a absoluta negação da vida no nada. Mas quem, por mais ignorante ou maldoso que seja, pode querer isto? Concluindo: quem se rebela vai contra sua própria vida e trabalha só para sua própria destruição; assim, quem pode obstinar-se a perseverar definitivamente nesse caminho? Quem desejar maiores explicações a respeito deste assunto, as encontrará no meu livro O Sistema onde tudo foi cabalmente explicado. Agora podemos comprovar como estas nossas conclusões práticas sobre a conduta humana, ficam relacionadas com o funcionamento do Todo, e justificadas também em função dos mais altos princípios do absoluto.

Quem se rebela é o ser involuído que, pela sua ignorância, julgando saber, caminha contra a própria vida. Quanto mais o ser é involuído, tanto mais está apegado a vida do seu plano inferior, mais cheia de sofrimentos, e maior é a sua rebeldia. Então, quanto mais o ser é rebelde, tanto mais está sujeito ao sofrimento, que representa a correção dos seus erros. Quanto mais o ser entra no caminho que o leva para fora da Lei, tanto mais é impelido a voltar para ela; quanto mais o ser é ignorante, cometendo por esse motivo erros, tanto mais ele tem de experimentar suas dolorosas consequências para aprender a não cometê-los mais. Eis a mecânica maravilhosa por meio da qual o erro tem é corrigido e os rebeldes têm de tornar-se obedientes à Lei.

Chega-se assim a seguinte conclusão: ninguém está tão amarrado pela obediência à Lei, quanto o rebelde. O que o acorrenta à esta obediência, apesar do seu desejo de revolta, é seu próprio apego a vida, porque voltando à vida ele tem de mergulhar na Lei, pois ela é vida e fora dela não há senão morte, e isso ninguém quer. Assim, quanto mais o ser é involuído, tanto mais tem de sofrer, experimentar, aprender é, com isso, evoluir. Na justiça de Deus, libertar-se de tudo isso não pode ser senão a merecida recompensa do esforço feito para subir. Assim, quanto mais o ser é indisciplinado, e por isso quer a desordem, tanto mais ele será; impelido a disciplina e confinado na ordem. Assim, a revolta se torna absurda, contraproducente e por isso insuportável e inaceitável, porque quanto mais o ser se rebela, tanto mais se aperta a volta do seu pescoço o nó corredio do sofrimento. Quanto mais o ser se faz surdo para não ouvir a lição, tanto mais esta se toma enérgica. Na Lei, que é ordem e harmonia, tudo, inclusive a sua reação, é proporcionado e equilibrado. Acontece, assim, automaticamente: quanto mais o ser é ignorante e rebelde, maiores são os seus erros, e por isso maior a reação que eles excitam; quanto mais o ser precisa ser corrigido tanto mais poderosa é a correção encarregada de endireitá-lo. Por outro lado, quanto mais o ser é sábio e obediente, menores são os seus erros, assim como a reação que eles excitam, de modo que quanto menos o ser precisa ser corrigido, tanto mais leve é a correção necessária para endireitá-lo. Como Vemos, trata-se de uma verdadeira escola em que os alunos recebem aulas a justo nível, proporcionadas a sua necessidade de aprender. Escola maravilhosa em que cada aprendiz automaticamente, por si próprio, tem de aprender a lição que lhe seja mais adaptada. Poderia Deus ter feito coisa melhor?

De tudo isso, segue-se outra maravilha: a correção dos erros e a retificação do caminho errado são automáticas, progressivas e absolutamente necessárias. Logo, qualquer movimento que o ser faça usando sua liberdade, seja para o bem ou para o mal, tudo o leva tanto pelo caminho da alegria quanto da dor, a sua salvação final. O ser pode livremente escolher um entre os dois caminhos, mas não pode impedir que a evolução se cumpra e seja atingido o seu ponto final: a salvação. A sabedoria de Deus colocou no sistema da Lei essa maravilhosa técnica da salvação, técnica tanto mais valiosa porque é inviolável. Vimos que a liberdade do ser não é absoluta, e que para os seus erros há fronteiras que não se podem ultrapassar. Esta é outra sábia providência de Deus para impedir que, na sua ignorância e revolta, o ser excite por parte da Lei uma reação demasiadamente forte, que ele não poderia suportar. Assim, os limites permitidos para a desobediência são proporcionados ao grau de evolução. Quanto mais o ser sobe e aprende, tanto mais reduzida se torna a amplitude do erro, até desaparecer. Com a evolução, o mal vai sendo progressivamente cercado, sitiado sempre mais de perto, até não lhe sobrar mais espaço, acabando por ser eliminado.

As duas forças situam-se uma contra a outra. De um lado, a evolução que impulsiona o ser para a salvação, do outro lado a revolta do mal que o impele para a destruição. A tarefa da evolução é a de corroer o mal e consumi-lo até sua destruição.

Quem consegue penetrar no pensamento que construiu e dirige esta maravilhosa técnica, com a qual a Lei guia o ser a sua necessária salvação em Deus, não pode deixar de ficar admirado perante uma tão deslumbrante sabedoria e tão assombrosa perfeição, que sabe resolver tantos problemas, atingindo suas mais altas finalidades, com meios tão simples, lógicos, automáticos, justos, e dos quais não se pode fugir. É empolgante observar e estudar o pensamento com que a Lei governa o funcionamento orgânico do universo e a nossa própria vida. E para chegar a uma orientação certa e completa, indispensável à direção correta de nossa conduta, não há outro caminho senão o de nos relacionarmos com esse pensamento que, tudo explicando, nos pode mostrar também a razão última pela qual temos de agir de um modo em vez de outro, afastando-nos dos caminhos do mal, para percorrer os do bem.