Estamos todos encadeados à necessidade de evoluir. Os seguidores do caminho mais curto e a errada sabedoria do mundo. A inteligência do involuído e a do evoluído.

Continuemos falando de nosso grande guia: a Lei de Deus. As conclusões práticas aqui apresentadas, como já dissemos, estão relacionadas com as teorias que em nossos livros explicam as causas primeiras das coisas. É naquelas teorias gerais que as conclusões observadas no terreno da conduta humana encontram sua raiz, explicação e justificação, e com isso a certeza de garantir-nos sua veracidade. Mas, ao mesmo tempo, é nesta sua aplicação prática, no plano controlável da nossa realidade, que aquelas teorias, que em si são experimentalmente incontroláveis, porque tão afastadas da nossa vida quotidiana, encontram sua confirmação e, portanto, sua verdade. Mesmo assim, verifica-se que as longínquas teorias gerais e suas consequências particulares, estas próximas de nós e, portanto, para nós mais compreensíveis, escoram-se e sustentam-se reciprocamente, umas fornecendo a prova da verdade das outras, num sistema único em que se harmonizam, colaborando a teoria com a prática - uma realidade confirmando a outra.

Com isso, nosso objeto está atingido: esclarecer, explicando e demonstrando. Seria absurdo pensar que nossa palavra pudesse ter o poder de transformar o mundo. Isto concerne apenas a Deus, pois só Ele possuí e pode usar os adequados meios apocalípticos para tanto. Nós podemos apenas explicar como tudo isso funciona e porque vemos sucederem tantos desastres no mundo. A tarefa de corrigir o erro pertence à dor, que por isso mesmo existe e disso esta encarregada. Para amadurecer os involuídos são necessários choques proporcionados à sua ignorância e insensibilidade. Para os surdos ouvirem é preciso mais que pregações; há necessidade de uma voz que por si mesma se deixe claramente entender por todos: é indispensável sofrer para aprender. E se no mundo existem tantas dores, isto quer dizer que a escola está funcionando bem. Isto é bom porque garante o melhor, ou seja, que a evolução se cumpra. É bom que o mundo sofra as consequências dos seus erros, porque assim, para seu bem, vai aprendendo a não errar mais.

Embora Deus esteja presente em nosso mundo, operando do interior da sua própria Lei, parece que Ele está olhando de longe, deixando o homem livre para fazer o que quiser. Parece que lhe esteja dizendo: "Experimenta, menino, à vontade; verificando e avaliando as consequências dos teus atos, aprenderás a sabedoria do bem e do mal. Podes fazer de tudo; sofrendo as consequências da tua conduta, poderás conquistar tua sabedoria, sem a qual não pode haver felicidade para ti. Para chegares a isso é necessário atravessar o deserto das desilusões. Anda, menino. Não podes destruir a carga da tua ignorância senão experimentando na dor as consequências do erro. Caminhando, sofrendo e aprendendo, o fardo se tornará cada vez mais leve, a estrada menos íngreme, o passo mais rápido. É necessário andar até que todo o caminho seja percorrido. És livre... Podes parar, retroceder, rebelar-se, errar à vontade. Faze o que quiseres. Mas, acima de tudo a Lei permanece inatingível e imutável. As consequências de tua conduta são tuas e, se esta for errada, terás que sofrer todas aquelas consequências até aprenderes a movimentar-te com disciplina dentro da Lei, de maneira a não gerares para ti mais sofrimentos. Podes, se quiseres, não prestar ouvidos aos sábios avisos. Junto a muitas fontes em que tu quererias matar tua sede de felicidade, há tabuletas que dizem: Veneno! prevenindo-te para que não bebas. Mas, tu não acreditas e não escutas. Então, sorverás tanto veneno, até aprenderes quantas amarguras ele gera e, assim, a não bebê-lo mais. O caminho é longo e duro, mas, Eu velo pela tua salvação, que terá de realizar-se".

A evolução é uma necessidade absoluta. A estrada está marcada e dela não se pode sair. Este é o conteúdo da Lei. Somos livres, podemos escolher à vontade. Mas, o que nos acorrenta à necessidade de evoluir é o nosso desejo de felicidade. Podemos parar no caminho e recuar. Mas, o sofrimento que então encontraremos nos impelirá para a frente. Podemos errar, mas a dor que se segue, queima. Assim, aprendemos a fugir dela e, compreendendo quais são as causas que a geram, aprendemos a fugir das ditas causas para não mais gerá-las. As vezes, consideramos a dor como maldição de Deus, como se fosse um produto da sua impossível maldade, e não percebemos que salutar e indispensável remédio ela é para nosso bem. Se não existisse a dor, se não houvesse esse nosso irresistível desejo de felicidade e essa triste insatisfação enquanto ela não seja atingida, quem nos movimentaria ao longo do caminho da evolução? Quem nos impulsionaria para a subida? Sem a insatisfação e a dor, a nossa preguiça paralisaria tudo, que ficaria estagnado na morte. Então, estaria comprometido o escopo final da existência de todos os seres; a vida deles e a presença de todo o universo não teria mais sentido. Todos quereríamos suprimir a dor, não compreendendo que assim suprimiríamos a força providencial que nos leva à salvação.

Vamos assim, fatalmente, sendo impulsionados para nossa meta final, para ela atraídos pelo nosso anseio de felicidade, repelidos pela dor logo que nos afastamos do caminho certo. Isto parece uma armadilha em que o ser se encontra preso. Ele quereria fugir dela, e não sabe que nessa prisão está a sua salvação. Em última análise, quem se revolta contra a disciplina da Lei se rebela contra sua própria salvação. Não se poderia imaginar ignorância e loucura maior.

Quem ainda não entendeu isso, julga ser inteligente quando imagina enganar a Lei, furtando satisfações imerecidas e conseguindo escapar às sanções dela. Almejamos felicidade, mas muitas vezes não queremos fazer o esforço para ganhá-la honestamente. E acreditamos ser hábeis quando conseguimos atingir o resultado da satisfação, sem fazer aquele indispensável esforço, único quê tem valor, porque nos faz progredir. Procuramos todos os meios para nos determos no caminho da salvação. Procuramos escapatórias, travessas, atalhos, para nos esforçarmos o menos possível no trabalho mais importante da vida: o da evolução.

   

A sabedoria do mundo consiste no desejo de conquistar sucesso de qualquer maneira, por todos os meios. Então, na estrada marcada que nos leva à felicidade, verifica-se uma corrida para chegar em primeiro lugar, ao maior sucesso, com a maior satisfação possível. Assim, ao invés de movimentos coordenados se avança numa peleja de todos contra todos, o que faz do progresso uma marcha desordenada e fatigante, corroída pelos atritos, executada numa atmosfera de caos. Desse modo, o trabalho necessário da evolução não se pode cumprir a não ser carregado de sofrimentos.

Imaginemos uma estrada de rodagem onde circulam muitos carros. Eles são livres para correr numa direção ou noutra, mais ou menos rapidamente tendo liberdade de parar etc., mas, tudo isso conforme normas, sem o que o trânsito regular não seria possível. A desordem seria um desastre para todos, e por isso, embora às vezes contra a vontade, todos têm de colocar-se em obediência, na disciplina da ordem. O caminho da evolução, ao longo do qual se desenvolve a série das nossas vidas, é parecido com aquela estrada onde nós andamos todos juntos, como os carros. Mas aqui também, para que a marcha não se transforme numa confusão dolorosa, há normas sem as quais a caminhada regular não é possível. A desordem torna-se desastre porque nem todos se colocam em obediência, na disciplina da Lei.

Ao contrário, a maior inclinação do indivíduo parece consistir em pensar só em si, descuidado dos prejuízos que pode causar aos outros. Surgem assim os astutos seguidores do caminho mais curto. A sua maior tentação é a de saltar para além dos outros. Escolhem as estradas mais fáceis, que encurtam distâncias, para serem os primeiros, por qualquer meio. Infelizmente, a inteligência deles está se desenvolvendo só neste nível primitivo do individualismo caótico, ainda incapaz de compreender qualquer forma orgânica de funcionamento coletivo. Em nosso mundo, acontece então o que aconteceria numa estrada onde cada carro corresse por sua conta, sem regra alguma, procurando vencer os outros passando à frente deles. A sabedoria desses astutos que se julgam tão hábeis, que querem somente sua própria vantagem1 acaba no que vemos sempre acontecer, isto é, esmagamento recíproco, revoluções, guerras, destruição. Quem vence, no fim, não é um vencedor. Restarão apenas o caos e o sofrimento que permanentemente dominam o mundo.

O mundo está cheio de astutos seguidores do caminho mais curto. Eles estão presos às suas miragens de felicidade: a riqueza, a glória, o poder... Impele-os a cobiça, o orgulho, o desejo de domínio... E pensam: por que escolher o caminho longo do trabalho honesto, do verdadeiro valor, duma finalidade de bem, que conforme a justiça nos dê direito à recompensa merecida, quando ali o atalho está pronto, convidando-nos a encurtar o caminho? É lógico que os conhecedores da ciência do proveito imediato, a curto prazo, pratiquem esse outro método, menos fatigante e mais vantajoso. Seria loucura trabalhar e produzir, quando com o roubo se pode enriquecer mais fácil e rapidamente; quando se pode satisfazer o próprio orgulho chegando à glória com o engano e a mentira; quando há tantos atalhos para saciar o próprio desejo de domínio, chegando ao poder. Assim pensam e fazem os astuciosos, enquanto olham com desprezo para os simples, que avançam ordenadamente na estrada de todos. Mas, nem por isso deixa de subsistir a Lei, que, empurrando os astutos para o abismo, com a destruindo-os, procura libertar a vida dos parasitas, semeadores tão-somente de desordem e sofrimento.

Poderíamos perguntar-nos: mas, por que acontece tudo isso? Como se explica essa loucura? A loucura é um problema de pobreza de inteligência. A tarefa da evolução é de desenvolver essa inteligência, pois todo ser possui maior ou menor inteligência, conforme o grau de desenvolvimento atingido. Ela começa a aparecer como um fenômeno de superfície, quando o indivíduo apenas compreende os efeitos imediatos dos fatos que abrange com os sentidos, e tende a tornar-se depois sempre mais profunda, chegando a atingir também as causas longínquas dos fatos e os efeitos a longo prazo. A visão psicológica dos primitivos poder-se-ia chamar de microscópica. Nessa sua forma mental eles estão mergulhados até o pescoço, de modo que não conseguem admitir nem compreender a visão psicológica dos evoluídos, que se poderia chamar de telescópica. Os primitivos estão apegados às verdades pequenas que se podem tocar com as mãos, às que eles julgam como realidade objetiva e única, enquanto negam, porque lhes escapa, qualquer outra realidade mais vasta e longínqua. Assim, eles vivem como aventureiros a procurarem, por qualquer meio, satisfazer o momento presente, sem prever e organizar nada para o futuro. Vivem como micróbios encerrados dentro duma gota d’água, ignorando o mundo maior que existe cá fora; vivem dos pormenores da sua vida microscópica, com a sua vista míope, percebendo só os resultados próximos, e correndo atrás deles, sem nada suspeitar da imensa vida das estrelas nos céus, sem tomar conhecimento de que, além dos seus mínimos movimentos, existem também os imensos movimentos dos astros.

O tipo biológico do primitivo ainda não evoluído possui somente essa inteligência microscópica, mas em compensação muita força no seu plano físico, capacidades guerreiras para agredir o próximo e maxilas de lobo para tudo devorar. Isso lhe é necessário para sobreviver no seu nível. Mas que sentido tem isso em relação ao caminho progressivo da evolução? A força, no nível material, representa o capital que a Lei deixou ao involuído para que ele conquiste a inteligência, que é um meio mais poderoso nas mãos do evoluído que já a conquistou. Na parte inferior da cabeça do lobo está a boca, poderosa na sua voracidade. Mas, acima dela estão o nariz para cheirar, os ouvidos para ouvir e os olhos para ver, isto é, as atividades mais requintadas dos sentidos. Acima, entretanto, está o cérebro para pensar, cuja atividade é necessária para compreender as mensagens dos sentidos e dirigir os movimentos da boca e do corpo todo.

Que acontece então? Para usar a parte física é necessária a inteligência, que começa, assim, a desenvolver-se pelo uso necessário a sua atividade, o que é indispensável à sobrevivência do ser no seu plano. Eis que a necessidade da sobrevivência, da luta nos planos inferiores, leva à necessidade do desenvolvimento da inteligência, que é o meio para sair daqueles planos. Assim, só pelo fato de existir, a vida automaticamente tende a deslocar-se no sentido dos níveis superiores e a evolução a realizar-se. O centro vital desloca-se das maxilas para o cérebro do lobo, até que ele, como aconteceu no cão, perde a ferocidade dos dentes, para transformá-la, convivendo com o homem, no poder muito maior da inteligência. Não é isso o que vemos acontecer na evolução dos seres, na passagem do estado selvagem ao do civilizado? A ferocidade fica abandonada nos planos inferiores para os atrasados que ali ainda permanecem, e desenvolve-se sempre mais a inteligência, valorizando-se as qualidades da mente. Só neste nosso século vemos os cientistas amparados e admirados, porquanto no passado, a sociedade os deixava morrer de: fome e os desprezava, glorificando tão-somente os grandes e ferozes guerreiros. Isto quer dizer que, com a evolução, têm de desaparecer mandíbulas e garras, agressividade e ferocidade, armas e destruição, para que vença a inteligência criadora e pacífica.

A nossa humanidade atual está ainda na fase das mandíbulas é das garras e as está usando para com elas desenvolver a inteligência. Eis como se compreende e se justifica a presença de tanta luta em nosso mundo. Tudo na vida existe porque tem uma função a cumprir. De outro modo não existiria. Se a Lei permite que neste nível domine a luta, isto acontece pelo fato de representar para os seres situados neste plano, o melhor meio para desenvolver a inteligência, indispensável à sua entrada nos planos superiores. Estamos ainda no nível animal, em que o ser é impelido pelas necessidades e cobiças materiais, muito mais do que pelas exigências intelectuais e espirituais. Domina o individualismo egoísta e separatista em função do eu, porque a evolução tem de realizar, antes de tudo, a construção da personalidade.

Num grau mais avançado, cuida-se, pelo contrário, de realizar um trabalho diferente, que é o de coordenar as personalidades na unidade coletiva da humanidade. Então, a luta entre egoísmos rivais perde todo o sentido e torna-se empecilho, que é necessário afastar. O herói, vencedor das pelejas do nível atual, torna-se um criminoso que a sociedade civilizada isola e afasta. Nela, a evolução quer atingir outros objetivos, e surgem novos problemas, os da fase orgânica, anteriormente desconhecida. A evolução conduz à união, e o indivíduo quanto mais evoluído, tanto melhor sabe viver em forma orgânica. Desponta, assim, uma disciplina que regula as relações humanas e a conduta dos homens, quais elementos do novo eu múltiplo, que é a sociedade humana. Em lugar da revolta na desordem, valorizam-se as qualidades de ordem na obediência a Lei. Então, rebelar-se contra Ela torna-se loucura. A vida vai doravante obedecer a princípios novos, que o ser pertencente a planos inferiores não pode compreender enquanto não os houver superado. A baixa inteligência de luta e as astúcias que conduzem à desordem se transformarão na superior inteligência da disciplina na ordem.

Não há dúvida de que, para quem alcançou uma compreensão mais vasta, é sofrimento ver a inteligência, centelha de Deus, a corromper-se em astúcias e enganos. Mas, este baixo uso dela se justifica como sendo um meio para chegar a compreender a inferioridade desses métodos e assim acabar por superá-los e abandoná-los. O involuído despreza, julgando tolo e simplório, quem não usa seu sistema e não vence com ele. Mas, a Lei é tal que os inferiores têm de usá-lo, sobretudo para chegar a encontrar e aceitar, amanhã, os métodos superiores que hoje desprezam.