Com o trabalho que vamos desenvolvendo neste livro completando os outros: Deus e Universo, O Sistema e A Lei de Deus, cumprimos a promessa que foi anunciada desde as primeiras palavras do volume inicial da primeira Obra, A Grande Síntese, que no começo do primeiro capítulo afirma: "Existe uma Lei, imperceptível para vós, mais potente do que o furacão, que atua inexorável, tudo movimentando, tudo animando. Essa Lei é Deus.   Ela está dentro de vós  Vossa vida é uma sua exteriorização e espargirá sobre vós alegrias ou dores, conforme a justiça, de acordo com os vossos merecimentos. Eis a síntese que a vossa ciência, perdida no dédalo da análise, nunca poderá reconstruir. Eis a visão unitária, a concepção apocalíptica, a que vos quero levar”.

Através de um longo caminho chegamos agora a ver como essa lei funciona, o que ela quer realizar e como o realiza. É de suma importância saber tudo isto, porque desse conhecimento depende o caminho de nossa vida e o nosso destino de felicidade ou de dor.  Não se trata de teorias longínquas. Este é problema que nos toca de perto, a todos, porque só assim, conhecendo qual é a causa de nossas dores, poderemos evitá-las.

Todos estamos presos dentro dessa Lei e temos de  lhe obedecer, inclusive os ignorantes que não a conhecem, os ateus que a negam, os rebeldes que quereriam destruí-la  Em todo lugar e momento ela está sempre funcionando para todos. Ela faz parte da natureza do ser a tal ponto que, quanto mais ele julga fazer a sua vontade. tanto mais lhe está obedecendo.

Quando a primeira vez expusemos em nosso livro Deus c Universo a teoria do S e AS, e da queda do ser do primeiro no segundo, muitos leitores não entenderam nada e exigiam que o universo funcionasse de outra maneira porque tinha de concordar com as teorias da sua filosofia ou religião. Para satisfazê-los não podíamos mudar o funcionamento do universo. Então continuamos observando os fatos e vimos que eles confirmavam cada vez mais a teoria da queda, como explicamos no volume: O Sistema, e estamos explicando neste aqui. Não foi de nenhuma forma possível torcer ou destruir os fatos, que nos falavam sempre mais claro, cujas conseqüências aquela teoria nos explicava, assim nos constrangendo a aceitá-la. Não se pode negar uma verdade, quando ela foi observada sob tantos aspectos, demonstrada nos seus pormenores, controlada nos seus eleitos, submetida a cálculos e medidas que a comprovam a cada passo.

A presença do S e a necessidade de evoluir para voltar a ele está expressa pelo nosso natural e irrefreável desejo de felicidade. A presença do AS e a necessidade de fugir para longe dele, está expressa pelo nosso instintivo e invencível terror do sofrimento. Pelo fato de que de um lado o ser é atraído pelo S, e do outro é repelido pelo AS, ele não pode deixar de percorrer o caminho da evolução, que é o da sua salvação. Há no mundo quem queira não obedecei‘ a esses impulsos e que por isso possa não ter que estar sujeito à Lei que o impele para o S? Tal obediência é o que nos fatos todos estão praticando, inclusive os que não quereriam e negam esses princípios que os dirigem. Há alguém que possa resistir ao seu anseio de melhoramento e não queira fugir do azorrague da dor, dois estímulos instintivos que o incitam para a subida? O que tem importância como prova de verdade, mais que as palavras, são os fatos, isto é, não o que os homens dizem, mas o que eles fazem; e uma teoria tem valor quando ela explica o que eles fazem, apesar de não concordar com o que eles dizem. E de fato, embora falando de uma maneira diferente, dissemos o que todos estão fazendo, obedecendo espontaneamente a Lei para atingir os seus objetivos, enquanto acreditam realizar somente a sua própria vontade para atingir as suas próprias finalidades.

Expliquemos agora, observando mais de perto o fenômeno, como na realidade ele se verifica, para ver como tudo isso acontece. Quando o indivíduo luta para satisfazer a fome, enquanto ele julga cumprir a sua vontade, de fato ele obedece à vontade da Lei. que quer a conservação do indivíduo.  Quando a Lei não quer mais, porque não serve mais às suas finalidades, ela o deixa envelhecer e morrer sem remédio, e o ser obedece. A vontade dele, que quereria o contrário, não tem valor algum. Quem manda nos momentos básicos da vida é a vontade da Lei, e não a do ser, que pode fazer somente o que a outra quer. Isto se chama obediência.

Quando o indivíduo luta para satisfazer o seu impulso sexual, enquanto ele julga cumprir a sua vontade, de fato ele obedece à Lei, que quer a conservação da raça. Que faz o homem deixado aos seus impulsos naturais? Ele agarra o mais que pode, seja com o roubo, seja com o trabalho, para gozar do banquete da vida, que consiste em engordar no bem-estar, e na fecundação da mulher. O grande sonho é comer bem sem trabalhar, dispondo de todas as mulheres do mundo. Nisto está a satisfação, e também a obediência à lei dos instintos, em seu nível animal-humano, em que a maioria dos homens se encontra hoje.

Quando o indivíduo luta para satisfazer o seu orgulho, a sua cobiça de honras, de poder político, de domínio, de riqueza etc., enquanto ele julga cumprir a sua vontade, de fato ele obedece à Lei, que quer que o indivíduo cumpra o esforço para evoluir. A esse trabalho incessante estão sujeitos indivíduos e povos, movidos pelas suas insaciabilidades e rivalidades, para contínuas guerras, pequenas entre particulares3 como grandes entre nações. Eles julgam seguir impulsos seus, mas de fato obedecem aos impulsos da Lei que, por meio dos instintos, impele todos para onde ela quer, deslocando-os para fora das suas posições de repouso logo que eles procuram realizar a sua vontade de descansar no gozo. Assim o homem tem de atuar sempre de novo, destruindo para reconstruir melhor. A vontade dele, que quereria engordar na preguiça, não tem valor. Neste caso também quem manda é a vontade da Lei, à qual o homem. sempre levado pelo seu insaciável desejo de crescimento, para novas guerras e revoluções, sem querer tem de obedecer, para que antes de tudo se realize o objetivo da vida: evoluir.

A razão que explica e justifica a existência  em nosso mundo da dura lei da luta pela vida e da seleção do mais forte, é que essa lei é um meio para desenvolver a inteligência e assim, impondo ao ser o esforço da subida, realiza a evolução. Lei feroz, porque estamos ainda no nível animal, mas em relação a este, em proporção ao seu baixo grau de desenvolvimento e ao trabalho a cumprir, tudo isto representa  o meio de evolução e o método mais adaptado. Lei enérgica, que se deixa bem entender, porque elimina os ineptos e preguiçosos, não lhes deixando o direito de sobreviver. Todas as vantagens para os vencedores, todas as renúncias para os vencidos. Quem não faz esforços para subir, é condenado. Assim a Lei impõe o trabalho da superação contínua. Ela exige que o ser suba e sempre lute para isso. E o homem, julgando satisfazer-se a si próprio, corre para satisfazer a vontade da Lei que o movimento por dentro, por meio dos instintos. É lógico que a Lei opere por dentro, porque ela é a alma das coisas, que rege o universo.

A ilusão do ser, que nele esteja atuando apenas a sua própria vontade, é engano necessário para movimentar quem concebe a existência como revolta, engano que o próprio rebelde gerou, e que é o efeito da posição emborcada em que o ser, com a revolta. se quis colocar. Acontece assim que a Lei premia por momento o ser que lutou, com a alegria do sucesso imediato, que o faz vitorioso, a Lei assim pagando em proporção, conforme a justiça, e o esforço realizado para a conquista. Mas eis que a Lei não deixa que o ser fique satisfeito com qualquer que seja a sua conquista, o que quereria dizer parar na subida e apodrecer na imobilidade, paralisando a vida no caminho da evolução, que representa o único meio de salvação. Então, logo que o ser tiver realizado uma conquista e com isso atingido um grau mais adiantado na subida, a Lei deixa o ser como antes no mesmo vazio, que nada pode encher, para que a corrida para o alto e o respectivo esforço sejam contínuos, como é necessário para que o caminho todo da evolução seja percorrido e seja assim atingido o seu objetivo que é de levar o ser até Deus, com o regresso ao S. Explica-se assim por que razão em nosso mundo existe esse jogo estranho da insaciabilidade  sem limites, pelo qual, logo que o homem tiver alcançado um resultado, é levado a desejar atingir outro maior.

Isto que parece uma armadilha, do ponto de vista do homem, não o é do ponto de vista da Lei, que quer que ele deseje coisas sempre mais adiantadas e cumpra por isso sempre novos esforços, porque isto é necessário para experimentar, aprender, adquirir novas qualidades, desenvolver a inteligência e a consciência, e assim subir evoluindo. Tudo fica perfeitamente lógico e justo, por que o que é atingido não é o objetivo aparente, o que o homem quer e imagina seja o verdadeiro, enquanto apenas é uma ilusão, mas é atingido o objetivo real e substancial, o que a Lei quer, o que representa a evolução do ser, o seu bem com a sua salvação final. Assim, enquanto o homem corre atrás dos seus sonhos, a Lei sábia faz o que ele na sua ignorância não sabe, o dirige para onde ele, errando, quereria ir, mas para onde convém que ele progrida.

Eis a realidade que está atrás dos bastidores das aparências. Quando o homem luta para satisfazer a sua fome, o seu instinto sexual, o seu orgulho e cobiça de posse e domínio, de fato ele luta para a conservação do indivíduo e da raça para evoluir. t o que a Lei quer, e se impõe ao ser, agindo nele por meio dos seus próprios instintos  Antes de tudo quer que ele sobreviva como indivíduo. Mas, logo que ele dispõe de energia de sobra, no bem-estar, sente-se impulsionado a gozar, gerando, providenciando assim à conservação da raça. Mas isto não pode bastar. Se a Lei faz tanta questão de continuar a vida, isto não pode ser para nada, o que seria um absurdo sem sentido, dentro duma lógica perfeita. E de fato, o que faz o homem logo que tiver satisfeito a fome e o sexo, senão procurar enriquecer e dominar? Isto no seu nível significa crescer, evoluir, a Lei assim quer, a qual ele obedece. Se a Lei impõe a continuação da vida, isto acontece porque a vida é um meio para realizar a evolução. E, se a continuação da vida, seja do indivíduo como da raça, custa tanta luta, isto se verifica porque a luta constrange o ser ao esforço e se resolve toda em evolução que representa o seu fruto substancial.

Lutar para progredir! Eis o significado desta luta contínua de todos contra todos, de que o mundo está cheio. Mas se perguntarmos aos que executam tão duro trabalho, porque eles o fazem, não saberiam explicar, mas só que querem satisfazer algum seu desejo e atingir algum seu particular objetivo, para além do qual, o que haja depois, nada conhecem. Entretanto fazem tudo isto, não importa se por um impulso inconsciente . À Lei não interessa que o homem saiba, mas  que ele obedeça  como de fato acontece. Nem se pode exigir que o homem, no seu atual nível de ignorância, saiba. O conhecimento não pode chegar senão a níveis de vida mais adiantados; para alcançá-los é necessário ter realizado o trabalho indispensável e com isso ter conquistado inteligência e consciência, ter merecido aquele conhecimento.

Mas é lógico também que os mais evoluídos. que excepcionalmente se encontram na Terra, e que entenderam o jogo. não caem mais nele. O desapego das coisas materiais, a falta de orgulho e de cobiça de domínio e de posse, o espírito de altruísmo  e de obediência à Lei de Deus, tudo isto não é problema de virtude ou santidade, mas de inteligência, que vê onde está a verdadeira vantagem. O evoluído hão se enreda e embaraça mais nas ilusões que são necessárias para movimentar o involuído, ainda tão ingênuo que acredita sejam verdadeiras as coisas mais enganadoras do mundo. Ele se apercebe disto tarde demais, só quando chega a morte, e com esta a necessidade de abandonar tudo, porque nada se pode levar das coisas do mundo. Então ele chora desiludido, dizendo que tudo foi vaidade, porque tudo desmoronou no vazio e nada fica consigo senão vento e saudade . E neste choro está a saudável lição que o involuído tem de aprender.

A sua natureza de cidadão decaído do S o leva a desejar a vida perpétua, fugindo aterrorizado da morte. Mas ele tem de aceitar o ciclo interrupto vida-morte, porque necessário para a renovação, que é indispensável para promover a evolução. A necessidade de evoluir é tão urgente como a da fome e do sexo. E por isso que sempre ocorrem guerras e revoluções, porque o ser está sujeito sem repouso a essa necessidade da renovação para subir e recuperar o perdido com o seu esforço contínuo. Assim a inteligência vai-se desenvolvendo, para cada vez melhor compreender a vaidade do orgulho e da cobiça, quando o valor do indivíduo não está no que ele possui, mas no que ele é; compreender a inutilidade das guerras e revoluções, quando tudo se pode resolver sem destruição, que é prejuízo para todos, com a boa vontade e a sinceridade. O que há de substancial nesse jogo, o resultado que vale e fica, é que o homem lutou, cumpriu o esforço necessário para evoluir, e com isso realizou a sua evolução. O homem do futuro não será mais tão simplório que continue a correr atrás de tantas ilusões, cujo engodo terá compreendido.

 Assim orientados  podemos agora encontrar uma explicação melhor do que vemos acontecer em nosso mundo atual. Aqui o homem permanece ainda em nível da animalidade. onde a lição de que agora falávamos é apreendida em forma concreta, não por meio de uma inteligência que ainda tem de se desenvolver, mas por meio de experiências vividas e percebidas pelo caminho dos sentidos. A demonstração por meios  racionais  e a compreensão completa da lógica da Lei e das últimas finalidades da vida, ainda ia-o foi atingida. Com a razão e a ciência o homem resolveu muitos problemas particulares, práticos, mas não possui uma visão de conjunto que o oriente em forma positiva no terreno espiritual, dando uma resposta aos grandes porquês, a qual ficou abandonada a filosofias empíricas e discordantes, e a religiões rivais, baseadas não  na demonstração, mas na fé cega e no mistério. Acontece, então,  que o homem para atingir um conhecimento positivo, que ninguém lhe oferece, vai na prática experimentando por sua conta, o único método ao seu alcance: a tentativa, o que dizer errar e pagar; aprender pela dor, e com ela pagar o erro.

O que de fato dirige a psicologia das massas é o subconsciente, com os seus impulsos atávicos, que chamamos de instintos, filhos de experiências primitivas. A civilização pintou o animal por fora, a sua técnica aperfeiçoou a forma e ficou na superfície enquanto no fundo permanecia  a velha substância.  Quais são as idéias que mais interessam a alma popular, às quais ela responde porque melhor as compreende? A imprensa miúda que mais atrai o público nos jornais revela qual é a forma mental da maioria.  O que prevalece é a luta pelo dinheiro (negócios e roubos), o sexo (amores), o espírito de domínio (política). Para isto existe a grande peleja da vida entre indivíduos e povos, até furtarem-se, esmagarem-se e matarem-se para conquistar riqueza, mulher, comando civil ou poder das armas. E para isso, cometem crimes particulares apesar de condenados pelas leis, e crimes coletivos de guerra glorificados pelos povos. Esta é a conversa que todos compreendem: lutar, ganhar, gerar, dominar, e, se necessário para isso, matar, num ritmo de recambio biológico vida-morte tanto mais rápido, quanto mais o ser é primitivo. Se falarmos de coisas acima deste nível, então a massa pouco percebe ou entende de outra maneira. Uma espiritualidade tomada a sério, e não pregada para cobrir outras finalidades desse tipo, interessa só a uma minoria. Para o homem comum a vida real é a terrena. A do além-túmulo é coisa longínqua, sem certeza. A morte é morte, e não ressurreição. Ela é o ponto final onde a viagem acaba. O que interessa está antes e não depois.

Estamos no nível das experiências materiais, ligadas à vida física, confiadas ao subconsciente animal, e só excepcionalmente no plano das experiências espirituais conscientes. Neste nível o ser não pode aprender senão por meio da dor, porque outra escola ele não entende. Não se pode contar com uma inteligência que ele ainda não possui. Já explicamos a técnica automática do método da dor, com a qual a Lei ensina na classe dos primitivos. A ignorância, qualidade dos próximos do AS, leva ao erro.  O erro leva á dor. Então o destino natural é o sofrimento, pelo fato de que o ser deve evoluir, custe o que custar, porque sem evolução não se pode atingir a salvação, e porque não há outra lição que um ser ainda inconsciente possa entender. Eis a função benéfica da dor, que na perfeita organização da obra de Deus não existe para nada. e muito menos para finalidades de mal. A dor sabe ensinar a todos, inclusive aos rebeldes e aos descrentes, como aos ignorantes. Se a Lei, porém, tem de usar esses duros métodos nos níveis mais baixos, ela os abandona logo que o ser os tiver superado.

Eis então como a escola funciona. Quando o caminho não está certo, logo aparece a dor que avisa. Quem bateu com a cabeça. volta para trás e outra vez procura não repetir o erro que acarreta sofrimento. Não é necessário muita inteligência para isso. A dor, ensinando a evitar o erro, o elimina, destruindo a ignorância, atingindo, assim, o seu objetivo que é o de fazer evoluir os involuídos. Podemos ver agora o ciclo de ida e volta desse processo: a ignorância gera o erro, que gera a dor, que destrói o erro, que destrói a ignorância. E destruir a ignorância significa subir os primeiros degraus da inteligência e encaminhar-se para a compreensão da Lei e para a espiritualidade. Esse é o conteúdo do fenômeno pelo qual o triângulo vermelho da positividade vai pouco  a pouco, e progressivamente, destruindo o triângulo verde da negatividade Com estes exemplos práticos podemos melhor entender a teoria.

A lei, que conhece o grau de inteligência  dos seus alunos sabe que no seu plano seria inútil para a maioria usar o método de mostrar por meios racionais as maravilhas da lógica de Deus.  É necessário, então, para ser entendido, ficar, como há pouco dizíamos, no nível dos sentidos  Assim o homem recebe o que lhe é mais útil: sofrimentos bem sensíveis, como doenças, miséria, morte de pessoas queridas, perseguições, fracassos, desilusões, amarguras, perda do que ele mais faz questão de possuir, perda tanto maior e dolorosa quanto maior for o apego. A prova, porém, como é lógico acaba logo que for aprendida a lição, de modo que, assim que desaparecer o apego, o ser pode receber em abundância, porque esta não representa mais um perigo, pelo fato de que ele aprendeu a fazer dela bom uso.

Mas a Lei usa esse método da dor também por outra razão, isto é, por um princípio de justiça. Se o ser se encontra num estado de ignorância, da qual deriva o erro e a dor, foi por vontade e culpa dele, que se quis rebelar. Por isso é justo que ele sofra as conseqüências da sua revolta, que são ignorância  erro e dor. É lógico e justo, está implícito no princípio de ordem e equilíbrio da Lei, que o ser tenha de endireitar o que ele emborcou, que o pagamento das suas culpas tenha de sair dos seus esforços e sofrimentos. É justo que o ser experimente todas as conseqüências da revolta. Se elas se desenvolveram em cadeia, às avessas: revolta, ignorância, erro, dor, o ser tem de percorrer com a sua fadiga e dor o caminho em sentido oposto, dos mesmos termos endireitados em cadeia: dor, lição, conhecimento, obediência. Eis por que a redenção se realiza através da dor, porque ela representa a escola que ensina o ser, e o tratamento que saneia a queda, levando à salvação. Por isso mesmo nas religiões o conceito de redenção está ligado ao de  sofrimento (paixão e Cristo). Se o ponto de partida foi a culpa da  revolta é justo que só o resgate realizado pelo trabalho do ser, possa reconstruir o equilíbrio quebrado. Por essa razão é que no  capitulo precedente falamos da necessidade do esforço do ser para realizar a evolução: porque não há outro caminho para vencer a ignorância e voltar ao conhecimento, senão o da experiência da dor. É lógico que o impulso para um exagero de poder, que se atingiu transbordando para além dos limites da ordem de Deus, e a ilícita expansão que se seguiu, tinham de ser contrabalançados por uma correspondente contração oposta que levou à ignorância e à dor, em vez de a uma maior sabedoria e felicidade que o ser, com revolta. lei procurar fora da ordem de Deus.

Com a revolta o ser ficou preso no ciclo por ele gerado Integrando os conceitos precedentes, podemos agora ver este ciclo completo: felicidade (S), revolta, queda involutiva, ignorância, erro, dor (AS), experiência, conhecimento, subida evolutiva, obediência, felicidade (S). O processo sai do S e leva para o ser de volta para o S. ponto de partida. Cada termo está ligado ao outro por geração. O precedente é pai do seguinte, que é filho do precedente. Assim o ciclo está fechado em si mesmo e dele, que na sua primeira parte é emborcamento e em descida, não há outra saída e solução que não seja a sua continuação em direção oposta, isto é, no endireitamento e subida, como encontramos na sua segunda parte. A dor (AS) está no fundo do ciclo, como a felicidade (S) está no cume dele. A experiência, filha da dor, corrige o erro, pai da dor. O conhecimento, filho da experiência, corrige a ignorância, mãe do erro. A subida evolutiva, filha do conhecimento e da experiência, corrige a queda involutiva, mãe da ignorância e do erro. A obediência, filha da subida, do conhecimento e da experiência, corrige a revolta, mãe da queda, ignorância e erro. Assim a obediência, mãe da felicidade, acaba corrigindo a dor, filha da revolta. O processo se fecha com a anulação da dor (AS), à qual se substitui a felicidade (S).

A Lei tudo rege e regula com inteligência e justiça. A cada degrau de emborcamento em descida, corresponde um degrau oposto de endireitamento a realizar em subida  O ser está fechado entre estes dois períodos opostos do ciclo. Cada passo, seja em descida, seja em subida, é a conseqüência do outro. O ser sofre porque erra. Ele erra porque é ignorante. É ignorante porque caiu.  Caiu porque se revoltou. A segunda parte do ciclo está implicitamente contida na primeira. E a dor, que o ser experimenta, que lhe dá o conhecimento, pelo qual ele sobe evolutivamente, o que significa voltar à obediência da Lei e, na ordem assim reconstituída, por fim reencontrar a felicidade.

Tudo isto explica, conforme  lógica e justiça, o estado atual do ser humano, a sua posição de erros e sofrimentos. Isto concorda com os ensinamentos das religiões, que fazem da dor um meio de redenção e um caminho para a felicidade. A Lei está lá. escrita por Deus na alma das coisas, indelével e imutável. O ser, com a revolta, arrancou os seus olhos e não vê mais. Não adianta se lha mostrarmos, porque ele se tornou cego. Para que ele a veja, é necessário reconstruir os seus olhos, e isto não pode ser feito senão por ele mesmo, com o seu esforço e sacrifício. Não há outro caminho. Cristo só nos quis dar o exemplo da crucificação, que depois pertence a cada um de nós, porque a revolta não pode ser curada e a salvação atingida sem crucificação. Todos os destino humanos não podem deixar de obedecer à Lei e tem de se desenvolver dentro dos princípios estabelecidos por ela.

Tudo isto explica também outro fato, isto é. como aconteceu que, apesar de Cristo nos ter ensinado a receita que resolve tratando a doença, poucos a usaram para se curar, mas estudaram, pelo contrário, a arte das escapatórias para se evadir do tratamento. Seria fácil demais e assim não seria justo atingir a salvação de graça, sem ter de ganhá-la com o seu próprio esforço, por ter encontrado o remédio pronto. Isto quereria dizer evadir-se do dever de pagar. É por isso que o ser não chega a compreender e viver o Evangelho, que tudo resolveria, senão depois de ter sofrido os efeitos dos seus erros e assim, com os seus sofrimentos, ter pago todas as suas dívidas. Não é justo levar vantagem sem ter merecido, melhorar senão depois de ter aprendido à sua custa a lição que nos ensina a não cometer mais erros contra a Lei. E por isso que o homem poderá chegar à compreensão do Evangelho e com isso à salvação, só depois de se haver crucificado por si mesmo, pelos efeitos dos seus próprios erros. É lógico e justo que não seja possível aprender sem experimentar, receber sem pagar, evitar a dor sem acabar cometendo erros, escapar aos efeitos, quando foram semeadas as suas causas. Quem destrói a casa com suas mãos, com suas mãos tem de reconstruí-la, se não quer ficar sem casa. Se o ser gostar mais de ficar na dor do AS, Deus respeita a sua vontade. O prejuízo é só de quem o quer. Cristo avisou com palavras e mostrou com o exemplo, mas deixou o mundo livre de escolher, que assim ficou na dor como escolheu.

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Esta nossa observação da Lei e da posição do ser dentro dela, nos mostra também outros fatos e qualidades do fenômeno queda-salvação. Vemos assim não somente que a evolução é um processo telefinalístico, previsto,  pré-ordenado e por fim dirigido pela Lei, mas também que nele está contida unia vontade de salvação em favor do ser, que ela orienta, impelindo-o para a solução com o seu regresso a Deus no S. Podemos assim compreender a lógica que rege o fenômeno da evolução, que não nos aparece mais como um caso avulso, isolado, sem razão, mas como um processo logicamente inserto e implantado no funcionamento orgânico do todo. Vemos assim que a evolução se baseia sobre um princípio de equilíbrio e justiça, que é fundamental na Lei. Explica-se deste modo e justifica-se a resistência que o ser encontra na subida para vencer a negatividade do AS, e a ajuda de Deus que ele recebe para cada conquista realizada de positividade do S. Explica-se também a necessidade de esforço do ser para subir, e a da obediência à Lei, porque, como foi a vontade de revolta do ser que emborcou o S no AS, assim tem de ser a vontade e obediência que promovem a evolução e endireita o AS no S.

Podemos agora compreender qual é o verdadeiro conteúdo e a substância do fenômeno evolutivo. Nele vemos que a negatividade vai-se retraindo cada vez mais, enquanto a positividade vai-se dilatando sempre mais à sua custa, em dois movimentos compensados, inversos e complementares. Quanto mais o segundo conquista, tanto mais o primeiro recua. Isto nos mostra que a evolução não é só produto de um processo de construção, mas ao mesmo tempo também de um paralelo processo  de destruição, que  condiciona o primeiro:  destruição da obra mal feita pelo ser  com a sua revolta, e reconstrução no que ela continha de bem saído de Deus, antes da queda. Então a evolução não representa uma consunção inédita, de coisa nova, mas a reconstrução do que já existia e foi destruído. E por isso que a evolução, nas suas diretrizes, não se realiza ao acaso, ou por tentativas cegas, mas seguindo um trilho pré-estabelecido, bem definido em função da estrutura do objetivo final, representado pelo organismo que já existia, e que foi destruído e que agora tem de ser reconstruído. No caminho do ser que sobe, apesar de erros e incertezas da parte do ser, há da parte da Lei a certeza do plano já estabelecido por Deus, desde o primeiro momento na criação do S. No telefinalismo do processo evolutivo a Lei sabe com absoluta segurança, em cada momento, para onde ela quer levar o ser, e para os seus objetivos precisos o impulsiona apesar de, pela ignorância  em que ele quis cair, o deixe nas trevas da inconsciência errar à vontade. E é lógico e justo que a falta de conhecimento com as suas conseqüências fique só com o rebelde que a mereceu e não na Lei, que ninguém pode alterar. O S ficou de pé, uma vez ponto de partida, para se tornar no fim o ponto de chegada. Nada se pode destruir ou criar em sentido absoluto, nem o ser podia ter tal poder; mas só era possível transformar do + no -  na involução, e do - no + na evolução. Este era todo o espaço que a Lei deixava à liberdade do ser; mas apenas respeito de si próprio, isto é, da sua posição, que ele quisesse escolher dentro da estrutura, criada por Deus, do organismo do todo.

No que diz respeito ao ser na fase atual de volta, esta transformação significa que o conteúdo do processo evolutivo, para ele agora, consiste no fato de que os impulsos negativos de resistência. inimigos dele, a vencer para voltar ao S, se transformam, pelo seu esforço, em impulsos favoráveis, amigos dele, que o ajudam, levantando-o para o alto. E como esses impulsos de resistência contra o ser foram gerados pela sua resistência contra a Lei, assim os impulsos de ajuda em favor do ser são gerados pela sua obediência à Lei. Eis por que razão na fase da queda pela revolta nasceram os impulsos inimigos contra o ser; porque na fase da subida pela obediência podem nascer os impulsos amigos favoráveis. Pertence ao ser, com a sua obediência voltando a funcionar na ordem da Lei, a tarefa de transformar as resistências em ajudas, o impulso negativo no positivo. Ao ser foi deixado o poder de se remir com a sua obediência, como lhe havia sido deixado o poder de se arruinar com a sua revolta. Esta constitui toda a amplitude de oscilação de ida e volta, que a Lei permite ao ser percorrer. Nada mais. Ele está fechado dentro desses limites estabelecidos pela Lei e deles não pode sair.

Ao mesmo tempo, porém, a Lei está construída de modo que o ser só pode receber dela as reações e assim atingir os resultados que ele quer, se souber movimentar-se com inteligência conforme os princípios dela. E pela sua própria estrutura que a Lei se rebela contra o rebelde, enquanto obedece ao obediente, vai contra quem vai contra ela, e colabora com quem quer colaborar com ela, seguindo os planos de Deus. É assim que a Lei automaticamente se torna amiga de quem escolhe tornar-se seu amigo. Tudo depende da vontade do ser, ao qual a Lei bondosamente tudo oferece, desde que ele saiba procurar, seguindo as normas preestabelecidas. Tudo depende da livre conduta do ser, seja quando a revolta o leva para as suas conseqüências seja quando a boa vontade de recuperação o leva para as conseqüências opostas.  Seja  na queda como na salvação, no mal como no bem, tudo o que cai em cima do ser, é sempre o fruto da sua obra. A Lei é boa com os bons, e má com os maus, porque devolve ao ser o que dele recebeu, responde com a mesma linguagem que o ser usa falando com ela. Em si mesma a Lei não e nem boa, nem má. porque ela está acima de tudo, além do bem e do mal, cisão dualista que nela não existe, obra do ser, devida á sua revolta. Na lei não existem os conceitos de mal, erro, culpa, dor, que se encontram fora dela, na fase de emborcamento e desaparecem com o regresso à ela.

Então é pela própria lógica da Lei que, como a revolta contra ela gerou a dor, assim a obediência a ela tem de gerar a felicidade; que. quem sai da ordem de Deus cai em todos os males, e quem volta àquela ordem atinge todos os bens.  O ser  é livre e pode criar para si, como quiser, o inferno ou o paraíso.  A Lei o deixa construir para si o mundo que ele prefere e ai se colocar. para nele viver. Mas o ser tem de aprender à sua custa a fazer bom uso da sua liberdade, devendo suportar as tristes conseqüências do mau uso. O ser foi uma vez dono, e continua sendo-o sempre, de escrever com suas mãos o seu destino, e Deus o deixa livre de escrevê-lo como quiser. Mas se o ser o escrever errado, terá de endireitá-lo, não porque alguém o vá constranger a isso, mas porque ele não ficará satisfeito e não terá paz até que esse endireitamento seja realizado.

É assim que o fenômeno involução-evolução, apesar de deixado em pleno poder do ser e à sua livre escolha, é fenômeno completamente contido dentro do absoluto  determinismo  da Lei, que estabeleceu os limites somente dentro dos quais podiam-se deslocar os movimentos do ser. E de fato nunca ele ficou tanto preso dentro da lei e do seu determinismo, como quando o ser, rebelando-se, dela tentou sair. Como aqui fomos observando nos fatos, nunca a Lei se revelou tão poderosa e dona de tudo, como quando o ser procurou destruí-la, para substitui-la por outra. Todo o processo da involução, o emborcamento da posição do ser, do S para o AS, o fato de ter atingido tal derrota e esse resultado em descida, quando a vontade do ser se havia dirigido em sentido oposto, para vencer subindo, são o produto da mais enérgica reação da Lei e nos provam quanto ela é poderosa e dona absoluta de tudo.

O nosso mundo continua sendo tão simplório, que acredita mais no poder do "eu", do que no de Deus, mais no da revolta que no da obediência.  Não estará claro, agora, que fomos explicando tantos aspectos desse problema, que o homem atual concebe a vida às avessas? A sua forma mental não será a forma mental do rebelde? E como é possível que um ser, que assim se coloca vivendo em posição emborcada não tenha de sofrer.

Mas como se pode atingir a felicidade nestas condições? Na lógica do Todo, obra de Deus, como e possível que haja lugar para tal absurdo? Ora, querer realizá-lo, à força, como acontece no mundo, não é loucura? Á dura conclusão é que vivemos presos dentro dos tristes resultados duma contínua revolta, os quais não podem trazer senão sofrimento; ao invés de se procurar seguir o caminho da obediência que leva para a salvação, procura-se uma saída às avessas, numa revolta e descida sempre maiores, o que não pode gerar se não sempre maiores dores.