Agora que foi analisada e entendida a estrutura da nossa figura, podemos melhor compreender o significado exato do Conceito de evoluído e involuído, de que muitas vezes falamos neste livro, Como nos precedentes.
Explicamos no Cap. V que cada plano de evolução está regido por uma ética sua, relativa, a ele particular, que gradativamente se transforma da ética do nível inferior, na ética do nível mais adiantado que o ser vai atingindo com a sua evolução. Estamos no terreno do ser decaído, onde a perfeição do absoluto desmoronou no transformismo do relativo, sempre em marcha no caminho de regresso á perfeição. Eis que, ao longo da linha da evolução YX, ou linha da Lei de Deus, cada ponto e respectiva posição do ser representa um diverso tipo de ética relativa, ou regra que dirige a vida do ser conforme o seu grau de evolução. Chega-se assim da duríssima lei determinística da matéria e dos seres inferiores, a lei sempre mais livre e feliz do espírito e dos seres superiores Todos esses diferentes tipos de ética, cada um relativo ao nível particular de evolução onde o ser se encontra, estão contidas na Lei que é o pensamento de Deus, que abrange e dirige tudo o que existe.
Marcamos em nossa figura, ao longo da linha YX da evolução, os pontos A1, A2, A3, A4, A5. Cada um expressa um nível evolutivo e plano de vida diferente e o respectivo tipo de ética que o rege. Na realidade o número desses pontos é muito maior, preenchendo a contínua transformação de um para o outro no seu trajeto de subida todas as posições intermediárias. Este problema do evoluído e involuído representa um caso particular dessa transformação de um tipo de existência, e da sua correlativa ética para o outro.
Se imaginarmos o homem atual situado num grau de evolução que esteja mais ou menos na metade do caminho ascensional YX, poderíamos colocar o biótipo atual chamado normal, aquele que constitui hoje a maioria na Terra, no ponto A3. Então o selvagem estaria situado no ponto A2, e o mais evoluído no ponto A4. Cada uma dessas posições relativas representa um dado nível de existência regido em função de sua posição, por sua ética, donde se conclui que o melhor para um dado biótipo não o é para o outro, e que é justo e bom para o primeiro não o é para o segundo.
Eis então o que significa evoluído e involuído. O ser de nível A (hoje normal) é um evoluído em relação ao ser do nível A2 (selvagem); e ao contrário, o do nível A2 é um involuído em relação ao nível A3. E assim também o biótipo de nível A4 (hoje super-homem) é um evoluído se comparado ao ser do nível A3 (homem atual), e ao contrário, o do nível A3, é um involuído em relação ao biótipo do nível A4.
Temos assim três posições que reciprocamente se julgam de modo diferente, conforme o ponto de referência onde o ser esta situado. Elas são: A2, nível do selvagem; A, nível do homem normal; A4, nível do evoluído. Dentro de nossa sociedade o homem do tipo A existe, qual subdesenvolvido nas camadas inferiores, como primitivo ou como criminoso e rebelde à ordem constituída. O homem do tipo A3 é o que domina pela força do número e estabelece tudo, leis e métodos de vida, tudo adaptando ao seu nível, entendimento e utilidade. O homem do tipo A4 representa uma minoria sem direitos, que tem de adaptar-se às leis e hábitos, para ele selvagens, da maioria.
Cada um dos três tipos concebe o outro, sempre colocado em seu relativo e diverso ponto de vista, julgando-se a si mesmo o tipo perfeito, modelo para todos, aquele que mais tem direito à vida. Mas o que domina em nosso mundo é o tipo A3, que por isso julga justo impor a sua ética a todos, inferiores como superiores. Observaremos agora os dois casos:
1) Quando a maioria, que faz as leis para si, se dirige aos inferiores involuídos.
2) Quando ela se dirige aos superiores evoluídos.
Escolhemos como ponto de referência o biótipo dominante porque é ele que, com a sua forma mental dada pelo seu plano de vida, estabelece as regras de conduta de nossa sociedade, as leis civis e religiosas, isto é, toda a ética, impondo-a aos outros.
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Como trata então esse biótipo hoje dominante os outros dois que, em relação a ele, se encontram na posição de involuído e evoluído? Observemos primeiro o caso do involuído Quando ele é representado por outros povos em terras coloniais, em geral as relações são as do homem chamado civilizado que, obedecendo à ética do seu plano, explora pelo direito da força, inteligência e recursos materiais, quem é menos provido desses meios, Neste nível pertence ao mais forte estabelecer as leis e a ele é devido todo o direito. Ética de luta, pela qual tudo acaba nas mãos de quem sabe agarrá-1o. Eis a conseqüência lógica dessa ética: os que não sabem defender-se e impor-se, são esmagados. Esta é a realidade que de lato existe além das teorias políticas ou religiosas pregadas. Neste plano vigora o método do vencedor e vencido, que vai das invasões bárbaras à exploração do trabalhador analfabeto. E por isso que no mundo de hoje: enquanto estão pregando a paz, se preparam para a guerra. Esta é a única ética neste nível de vida. Este é o método e a base ela glória de todos os imperialismos. Método em que se concordam todas as raças e povos, de todos os tempos e países do mundo.
Mas em outra forma o involuído se encontra também dentro da sociedade dos povos que se chamam civilizados. Como trata aquela maioria dominante, esse biótipo subdesenvolvido? Refiro me aos que na ordem social não conseguiram encontrar o seu lugar para viver e o procuraram fora daquela ordem como rebeldes ou delinqüentes. Ficando fora da organização coletiva, e representando eles só uma minoria, pelo menos nos períodos normais não revolucionários, sobre eles gravita o peso da maioria com a sua ética de domínio, que estabelece com as leis o que é direito e justiça. Esta minoria tem de ficar sujeita, quando não consegue romper os diques com as revoluções, às leis civis e religiosas que constituem a ordem que representa a defesa dos interesses da classe dominante. Os fatos da realidade biológica nos mostram que neste nível a vida se baseia na luta de todos contra todos, vigorando o método do ataque e defesa para que sobreviva só o vencedor. Disto se segue que os conceitos de direito, de justiça, de punição em nome de princípios ideais, até em nome de Deus, são só aparências exteriores, enquanto a substância dos fatos é outra coisa. Não há ser humano que não deseje a ordem, assim como a unidade. Mas subentende-se que ele admite só a ordem onde é ele que manda, e a unidade onde são os outros que obedecem.
Estamos apenas observando o fenômeno imparcialmente. E claro que a coisa mais urgente para todos é antes de tudo defender-se e não há motivo para que a sociedade faça exceção a essa regra, tanto mais que os criminosos conhecem mais do que todos o método do ataque e defesa. Ninguém pode negar à sociedade esse direito à legítima defesa. Mas isto quer dizer que estamos no terreno da luta, onde a vitória pertence ao mais forte. O mal-entendido está no fato de que esta luta e defesa ficam escondidas sob o manto do direito e da justiça. Quando nas revoluções são os rebeldes que estabelecem uma nova ordem para si, eles armam tribunais para condenar, conforme a justiça, os seus inimigos em nome da lei, como fazia antes contra eles a sociedade regularmente constituída. O espírito de luta, de agressividade e defesa é legítimo neste plano de vida e faz parte da lógica de sua ética. Estamos ainda na fase caótica do egocentrismo separatista, em que a defesa para a sobrevivência não pode ser confiada senão ao indivíduo isolado ou, por instinto gregário, unido em grupo com alguns semelhantes seus. O Estado com a sua autoridade em nossa sociedade dita civilizada, apesar de democrático e representativo, é constituído por um desses grupos, formado pela classe dominante que defende, contra todos, os seus interesses e vida Tudo isto se pode considerar lógico e justo se colocarmos a nossa sociedade no nível biológico ao qual ela pertence o da luta e da força
O engano se revela quando neste mundo queremos falar de verdadeira justiça, coisa que só aparece num mais alto nível de existência, ao qual o homem ainda não chegou. Não há dúvida que todos têm o direito de viver, em todos os planos de vida e em todas as relativas formas de ética. Mas com a evolução se modifica o método para atingir essa finalidade. Então não é mais o indivíduo que se defende, mesmo usando as leis como arma na sua luta contra o próximo numa contínua peleja de ataque e defesa, onde só o mais astuto ou rico tem razão; mas é a coletividade para a qual o indivíduo faz tudo, aquela que faz tudo para ele e o defende no seio duma ordem não mais partidária, mas imparcial e universal. Mas isto poderá acontecer somente quando a humanidade houver atingido o estado orgânico e o indivíduo tiver adquirido a consciência necessária para saber viver nele.
Se a substância do método atualmente vigorante em nossa sociedade é a da defesa, pode-se dizer que esse objetivo foi atingido. Mas aqui o mal-entendido reaparece quando, com tal método, essa sociedade pretende tratar e curar a doença da criminalidade. Perante esta, que deveria ser a suprema finalidade do poder judiciário, na atual conjuntura social, é uma falência. Mas para que isto não aconteça seria necessário usar a forma mental e a ética de um outro plano, onde a tarefa de quem domina não é a de defender contra todos a sua posição de domínio, mas a de levantar os inferiores, de educar e remir os criminosos, eliminando a semeadura de tanto mal, a qual diariamente se está realizando em nosso mundo na mais completa inconsciência das conseqüências. O atual método repressivo corresponde ao do cirurgião que procura curar cortando o tumor do câncer. Assim, com todas as providências da justiça humana, teoricamente perfeita, a doença da criminalidade, atravessando os séculos, ficou sempre de pé.
Infelizmente a realidade é que possuem todos a mesma forma mental, usam todos o mesmo método de luta, quem julga não está situado acima e fora da raça humana para que lhe seja possível julgar. Seguem todos o mesmo caminho, pelo qual à ordem não se pode chegar a não ser constrangido os rebeldes à obediência, porque o ponto de partida é o caos; não se pode chegar ao direito senão ordenando a força, e à justiça senão disciplinando a injustiça. E, seguindo este mesmo caminho, os diferentes grupos vencedores se alternam no palco da história, obedecendo aos mesmos instintos, os do seu nível biológico, usando as mesmas armas, para atingir as mesmas finalidades. Também na livre escolha democrática do pleito eleitoral, é sempre o poder da posição, da inteligência, dos recursos, o que permite que alguém vença os seus antagonistas políticos.
Eis qual é a luta entre o biótipo A2 e o A3, e ao contrário Ambos querem e têm o direito de viver. Mas o segundo não quer reconhecer esse direito ao primeiro, que então tem de conquistá-lo com a força. Para o tipo A2 não há lugar no castelo dos vencedores Por isso ele tem de ficar fora como rebelde Claro que se os revoltosos encontrassem um abrigo dentro do castelo, eles acabariam tornando-se homens da ordem. Para acabar com os homens da desordem, seria necessário colocá-los dentro da organização da ordem, porque, se então se tornassem inimigos dela, se tornariam inimigos de si próprios. Que eles se tornem defensores da ordem é o que de fato acontece, logo que um deles enriquece e consegue ocupar posições elevadas na sociedade. O mundo atual deveria compreender que é seu interesse que não haja expulsos, que é absurdo um banquete a sós, sem que aqueles que estão olhando não acabem furtando alguma coisa. A nossa sociedade não chega a compreender isso, porque não possui mais do que a forma mental do seu nível biológico, com a qual não sabe conceber tudo senão em função do eu particular e sua vantagem imediata. E assim que a coletividade fica continuamente repleta de rebeldes criminosos. Por este caminho o problema não se resolve, até que sejam suprimidas as causas primeiras que estão dentro do próprio corpo social dos vencedores, que assim continua sempre levando consigo a sua doença crônica.
Eis então o que acontece em nosso mundo. Justificando-se com um castelo teórico de princípios e leis, a classe dirigente que tem em mãos o poder, com a sua forma mental, estabelece uma ética, cujos conceitos abstratos de bem e mal na realidade significam só o bem ou o mal daquela classe. Na substancia se trata só de justificar em nome de princípios superiores a necessidade de constranger à obediência os rebeldes. O restante é problema longínquo, que fica na sombra. Este constrangimento se baseia no princípio da satisfação ou do sofrimento, e atua por meio do prêmio ou da pena. Assim aparece nas religiões a idéia de paraíso e inferno que corresponde à das leis civis, das honras ou da cadeia. Mas isto nau educa, não melhora, somente estimula à luta egoísta para ganhar a própria vantagem ou evitar o próprio dano. Mas é lógico que a ética do egocentrismo não possa gerar a não ser frutos da mesma natureza. Acontece assim que o biótipo A3 não levanta o A2 para um mais alto nível evolutivo, mas fica abraçado com ele no mesmo pântano.
Se o criminoso furta ou mata, faz isso porque a experiência que adquiriu no ambiente em que nasceu e cresceu lhe ensinou que era mais provável conseguir vencer na vida pelos atalhos da desordem e revolta, do que pelo caminho direto e longo do trabalho e da ordem. E de fato a vitória no caminho da delinqüência depende da inteligência, poder e recursos, como deles tudo depende na Terra. E o criminoso funciona conforme a ética vigorante. De fato quem cai na rede das leis é o delinqüente simplório, desarmado, isolado, sem recursos e inteligência ou mentalmente doente. A rede em geral pega só os peixes fracos e pequenos. Os grandes tubarões me escapam. O lema é: "A lei é igual para todos", ao qual alguns acrescentam: "os simplórios".
E o que acontece, depois, com esse criminoso que a lei consegue agarrar? Com uma pública e solene demonstração de justiça nos tribunais, isolam-se esses sujeitos, por um período de tempo arbitrário nas cadeias. Que faz o preso? Ele continua reagindo ainda mais contra a sociedade que, depois de haver gerado os ambientes onde tudo isto pôde nascer, agora pune o fruto deles com a prisão. Ele vai morar num ambiente saturado de criminalidade, onde quem nunca houvesse sido delinqüente seria levado a tornar-se tal. Escola às avessas. E, quando ele terminar esse curso de mau exemplo e de revolta interior, a sociedade o considera curado e o aceita de novo, em seu seio, aquele indivíduo que se tornou pior, porque a pena atormenta, não convence, mas gera nova revolta. Isto, do ponto de vista educativo, revela uma grande ignorância. Explica-se, porém, enquanto é fruto do passado, quando os segredos da psicologia humana eram desconhecidos, e vigorava aquela ética, descontrolado fruto do subconsciente instintivo.
O resultado lógico de tudo isto é que a delinqüência continua como câncer social permanente, o que revela a impotência dos métodos atuais para a solução do problema. Quando uma doença não se cura, em geral isto se atribui à ignorância do médico. Medicina repressiva - Mas a doença é uma fera a domar com a força, é antes um processo lógico que se penetra com a inteligência. A substância da penalogia é constituída por uma luta armada entre ações e reações da mesma natureza. Não é que defendemos o criminoso. Queremos só reconhecer que, enquanto esse método vigorar, nunca poderá acabar a luta entre o biótipo A3 e o A2, e ao contrário. Seria necessário antes de tudo educar os educadores. O método da luta não pode gerar senão luta, da guerra só pode nascer guerra. Seria necessário acabar com esse método, procurando compreender e ajudar, em vez de condenar e reprimir, reconhecendo que não se pode eliminar o direito à vida, sem que esta ressurja torcida em outra forma. Em vez de se ocuparem a cobrir a realidade com um manto de hipocrisia falando de justiça, quando a realidade é apenas a da defesa própria na luta, seria necessário que mais honestamente se enfrentasse o problema, usando de sinceridade para resolvê-lo, eliminando os ambientes onde nasce o mal, cuidando dos criminosos através da educação, fazendo desaparecer assim as causas do fenômeno.
Dado o seu nível biológico, toda a nossa vida social se baseia não na compreensão e colaboração, mas na rivalidade e na luta. Todavia o problema das relações sociais não se pode resolver com tais métodos. O criminoso luta contra as leis, que são as armas dos seus naturais inimigos, com uma estratégia mais ou menos perfeita e poderosa, como qualquer guerreiro lutaria contra outros guerreiros. Assim se desenvolve a inteligência, mas no sentido das astúcias e enganos, por caminhos oblíquos. Explica-se assim a função biológica da mentira, até dessa hipocrisia de que agora falávamos, como meio de defesa da vida. Quem não desenvolveu esse ínfimo grau de inteligência, ou a desenvolveu demais para que lhe seja possível retrogradar até esse nível, será sempre julgado um deficiente que, por isso, merece e deve ser condenado.
A vida nos seus níveis mais evoluídos se baseia sobre princípios diferentes. Para quem vive neste plano não há gente fora do castelo dos vencedores, porque todos se ajudam fraternalmente e sabem que são elementos da mesma unidade orgânica. Só quando, superando o método atual de desconfiança, chegarmos à compreensão fraternal, os problemas que hoje nos atormentam poderão ser resolvidos. O sistema vigorante da luta é contraproducente. A severidade das penas demonstra a fraqueza dos dominantes, fruto do temor para que os rebeldes não permaneçam contra o poder. Até há poucos anos a justiça dava, como exemplo educador, público espetáculo, punindo ou matando os criminosos. E o povo corria para ver. Mas o que passava como um exemplo educador, na realidade era um escândalo, e por isso gostoso e procurado. E, quanto mais feroz o espetáculo, tanto mais gente corria para gozar de tão saboreado petisco. Claro que assim se realizava uma educação às avessas, porque o povo aprendia a arte do crime, acrescentando a lição que ele se torna legítimo quando o comete quem tem o poder nas mãos. Mas todos ficam satisfeitos: 1) os chefes, porque acreditavam dar um exemplo de sua força, confirmando o seu domínio; 2) os juizes, porque, agradando ao seu senhor e mostrando o seu poder, fortaleciam a sua posição, ao mesmo tempo que a pública encenação da justiça tranqüilizava a sua consciência, porque tudo se havia realizado com o consentimento de todos, endosso universal que, deixando as condenações dentro dos limites da lei e da ética, as legitimava; 3) o povo ficava satisfeito porque podia estudar a arte de matar e vingar-se do próximo, e ao mesmo tempo com tão gostoso espetáculo de ferocidade, seguindo a sua ét‘.ca de luta, satisfazer o seu instinto de agressividade e destruição, que é qualidade do involuído. Deste modo, chefes, juizes e povo todos ficavam satisfeitos porque, cada um verificando a sua utilidade particular, todos juntos podiam, assim unidos, libertar-se de um inimigo comum e isso sem perigo, porque se tratava de um fraco vencido
Eis qual é, brevemente resumido, o jogo das ações e reações entre o tipo A3 e o A2, e ao contrário.
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Observemos agora o 2º caso, isto é, quando a maioria, que faz a lei para si, se dirige para os superiores evoluídos. Como o biótipo A3, hoje dono do planeta, trata o biótipo A4 que excepcionalmente aparece na Terra? Estudemos agora o recíproco jogo de ações e reações entre estes dois biótipos Se escolhermos como ponto de referência a posição A3, a do homem comum, o ser do nível A4 nos aparecerá um tipo de super-homem evolutivamente mais adiantado Mas, se escolhermos como ponto de referência a posição A4, o homem comum situado no nível A3, nos aparecerá um involuído, evolutivamente mais atrasado. Este é o sentido que demos, neste livro e nos precedentes, às palavras: evoluído e involuído, escolhendo como ponto de referência a posição ocupada pelo homem atual na escala da evolução.
Cada uma dessas duas posições traz consigo a sua forma mental e a sua correlativa ética e particular lei de conduta, bem diferentes, das quais já falamos bastante. O evoluído queria que neste mundo a vida fosse regida pela sua ética. Mas esta não é a do biótipo dominante. Daqui nasce o choque. Ao involuído não interessa nada se o outro é evolutivamente superior. Com a forma mental do seu plano e sua ética, ele sabe que o evoluído representa um caso isolado ou pequena minoria, e que por isso não tem direito algum; sabe que aquele tipo não está armado, não usa a força, e na prática é um fraco, um covarde, um vencido, com função somente de obedecer. Só a quem possui a força para dominar pertencem todos os direitos. Mas o evoluído não pode de maneira nenhuma viver conforme uma lei que para ele é de ferocidade. Nem pode ele, pela sua própria natureza, impor ao mundo com o método da força ou direito armado a sua ética feita de compreensão e bondade. Ninguém quer nada dele; no mundo não há lugar para ele. Aqui pode ser apenas um expulso, posto fora da vida.
Os dois tipos de personalidade são tão diferentes, que uma parece o emborcamento da outra. Esclarecemos com um exemplo. O evoluído encontra-se completamente deslocado no ambiente humano, como um homem civilizado que tivesse de morar numa aldeia de antropófagos no centro da África. Ele teria muito que adaptar-se para sobreviver naquele ambiente. Tudo o que é natural e justo para os selvagens não o é para ele. Que faria um homem das nossas cidades se, saindo do seu apartamento, em vez de cumprimentar o seu vizinho, visse que era hábito normal o agredi-lo para matá-lo e cozinhá-lo, para devorá-lo no almoço? Da mesma forma o evoluído fica horrorizado quando vê que em nosso mundo é na prática lícito e comum, violando as leis penais e civis, religiosas e morais, enganando e esmagando, aproveitar o próximo mais fraco, só para a sua vantagem egoísta, semeando ruína ao seu redor.
O involuído faz isso não na forma, mas na substância, não por maldade, mas por sua natureza, porque esta é a lei do seu plano, a sua ética espontânea. Para ele as qualidades de bondade do evoluído são ingenuidade condenável e fraqueza inadmissível, porque vale a força e a astúcia, que no mundo levam à vitória. Quem não atinge essa finalidade não tem valor, é coisa negativa e contraproducente, o que se chama com muito respeito: a loucura dos santos. Assim o evoluído é julgado um grande menino inexperiente, um utopista que vive de sonhos fora da realidade A conclusão rápida à qual chega o involuído, é que o evoluído seja um simplório, cuja fraqueza é justo aproveitar e explorar. Assim é a ética do involuído, a sua forma mental e como ele concebe coisas, e delas não sabe fugir. Não o poderá, senão quando conseguir evoluir, subindo para um mais adiantado plano de vida.
O problema é o de subir, e não o de julgarem-se, por orgulho, mais adiantados, sem o serem de verdade. Quem em seu nível atual renuncia a sua própria supervalorização? Isto faz parte da forma mental do ser deste plano, corresponde ao seu impulso egocêntrico e instinto de luta. Pelo contrário, o ser verdadeiramente adiantado se reconhece pelo seu constante dinamismo construtor, pela ausência de negatividade, pela sua bondade e inteligência. A conseqüência lógica desta, como do valor real do evoluído, é a falta de orgulho. Quem é de fato superior não precisa de se inchar de vento para aparecer maior, porque já o é, e por isso fica espontaneamente humilde. O evoluído é fundamentalmente honesto. Não pode por isso aceitar os métodos da mentira e engano vigorantes no mundo. Tudo isto é lógico, porque ele se encontra mais próximo do S, e mais afastado do AS. O problema para o involuído não é o de sinceramente procurar não fazer o mal, mas o de conseguir escondê-lo com a astúcia, enquanto procura fazê-lo para atingir a sua própria vantagem. Ele usa o intelecto não no sentido de obedecer às leis para viver na ordem que representa vantagem de todos3 mas o usa para evadir-se delas, escapando às suas sanções. Para quem está maduro para viver no estado orgânico de verdadeira sociedade humana, é duro ter de viver num estado caótico de egocentrismos desencadeados. Indivíduos desse tipo biológico, no plano de vida do evoluído, seriam isolados como criminosos, porque nesse nível é absurda e inadmissível a conduta descontro1ada da ética do subconsciente, vigente em nosso mundo.
De fato, pelo caminho percorrido, o evoluído chegou a criar instintos diferentes, de modo que para ele é natural e fácil (virtudes, altruísmo, inteligência, atividade etc.), tudo o que para o involuído é esforço difícil; e é difícil o que é fácil, instintivo, as vezes irresistível, para o involuído (ataque e defesa, egoísmo, ignorância, ócio etc.). Para um selvagem é facílimo escalar uma árvore, correr vários quilômetros, viver na mata entre as feras. Seria, porém, muito difícil proferir uma palestra, escrever um livro, trabalhar em escritórios, viver num apartamento. E ao contrário. Que problema sério, se um tivesse que mudar para o ambiente do outro! Evoluído e involuído se repelem reciprocamente. Um não se adapta a viver a vida do outro.
O evoluído é evangélico, fraternal, compreensivo para cooperar Ele usa a sua forca e inteligência, não para lutar contra os seus semelhantes, mas contra a animalidade, para atingir a sua sublimação. Ele aparece no mundo como um anjo, cuja lei natural é o Evangelho. Mas a lei dos outros é diferente. Ele, que dá tudo, ama e perdoa, neste mundo não pode ser senão espoliado e desprezado. Tal mundo, depois de haver tirado dele toda a sua possível vantagem egoísta, o repete desdenhosamente, como se faz com um fruto espremido. O involuído interessa-se pelo próximo para tirar dele proveito; o evoluído para beneficiar, ajudando-o a subir. Entretanto, uma vez que ele caiu no plano inferior da animalidade humana, tem de suportar o choque com a lei deste plano. Parece. porém, que a vida queira expulsá-lo de tal mundo, que não é o seu. Esta é a história de Cristo e de todos os que o seguem. O encontro entre os dois planos de vida não pode acabar senão no martírio do evoluído. O involuído quer expelir do seu reino o estrangeiro. E é a este que está confiada a função de ajudar o mundo na sua evolução! Este explora e atormenta quem trabalha e sofre para salvá-lo. Custa caro ser evoluído de verdade e, quem segue esse caminho só por vaidade, não pode deixar de fracassar ao primeiro passo.
Para a ciência o evoluído é um anormal. E princípio aceito em psicopatología que é psiquicamente doente o indivíduo rebelde ao ambiente, provido de forma mental diferente da maioria, enquanto é psiquicamente são o indivíduo que se adapta ajustando-se ao ambiente, com forma mental que corresponda à vigorante na coletividade Então o ponto de referência de todo o julgamento, a unidade de medida para todos, é a massa da maioria, que representa o modelo do biótipo ideal. Essa igualdade entre os conceitos de ambiente, maioria e valor do indivíduo, nivela todos no mesmo plano, expelindo os que são de outra medida, seja maior ou menor. Eis como os biótipos A4, ou seja, os mais adiantados, são repelidos, como o são os biótipos A2, ou seja, os delinqüentes. E como se um sábio fosse morar num hospital de doenças mentais, onde a normalidade da maioria é a loucura, para não ser expulso como louco, tivesse que se tornar louco. Trata-se, porém, de um ser superior que compreende e julga a loucura de todos os outros, procurando, pelo contrário, ajudá-los a voltar à razão, e não pode de maneira nenhuma adaptar-se àquele ambiente de loucos. Esse é o choque e o jogo de ações e reações, entre esses biótipos que pertencem a níveis evolutivos diferentes.
Tomemos novamente as nossas pesquisas, continuando o desenvolvimento do tema do Cap. I a respeito do esquema gráfico do processo involutivo-evolutivo, e do tema do Cap. 1V a respeito dos diversos pontos de referência. Volvamos assim à nossa figura, para observar outros aspectos do fenômeno que ela representa. No Cap. 1 observamos o caso geral do ciclo completo nos seus dois caminhos de ida e volta. No Cap. IV observamos o fenômeno menor que, conforme o mesmo modelo, se repete no caso particular de cada erro do ser.
É neste ponto, em que se verifica o erro do ser e a sua dor para corrigi-lo. Desponta assina a necessária forma orientadora para dirigir. a sua conduta, entrando no terreno específico da ética. Observemos o fenômeno representado em sua expressão gráfica, em nossa figura, Continuamos dessa forma levando as teorias dos dois livros: Deus e Universo e O Sistema às suas práticas conseqüências e aplicações.
Estudamos na primeira parte do Cap. IV o caso simples de um afastamento horizontal, nos seus dois movimentos, de ida e volta. Conhecemos agora o significado das expressões gráficas da figura, quais são a linha do erro NN1 e a linha da dor N1N, inversas e complementares. A primeira representa a vontade do ser, que quer o emborcamento, dirigida da positividade para a negatividade. A segunda representa a vontade de Deus, que quer a retificação, dirigida da negatividade para a positividade. Se escolhemos como ponto de referência o ser, a primeira linha representa a satisfação do rebelde que realiza a sua vontade de vencer contra Deus; e a segunda linha representa o sofrimento do rebelde que tem de renegar a sua vontade de revolta para obedecer à vontade de Deus. Se escolhemos como ponto de referência a Lei, a primeira linha representa o caminho que, com a violação da Lei, vai para a desordem; e a segunda linha representa o caminho que, em obediência à Lei, volta à ordem. Como já dissemos no Cap. IV, o fenômeno pode ser observado em função de dois diferentes pontos de referência, seja Deus e a Sua Lei, seja o ser rebelde e a sua vontade de revolta: pontos opostos, que representam os dois pólos do dualismo universal.
Procuremos agora compreender como funciona o mecanismo da correção do erro pela dor. A coluna central do fenômeno da queda é representada pelas duas linhas XY e YX. A primeira representa o desenvolvimento do impulso negativo da revolta, devido à vontade do ser, a segunda representa o desenvolvimento do impulso positivo do endireitamento, devido à vontade de Deus. O primeiro deslocamento XY quer destruir a positividade dirigindo-se para a negatividade; o segundo quer destruir a negatividade reconstruindo a positividade. O primeiro movimento vai contra Deus, o segundo contra o ser. Por isso o primeiro é erro, o segundo é dor. É erro a revolta para emborcar a vontade de Deus. É dor o endireitamento que emborca a vontade do ser. Com a dor este recebe de volta o seu próprio impulso de emborcamento, que por fim se volta contra si mesmo. Ele, que com a revolta quis torcer a Lei, fica constrangido por ela à obediência.
O caminho da evolução não é tranqüilo, mas se realiza no choque entre essas duas forças contrárias. Ele representa o esforço da reconstrução, que o ser tem de realizar contra a sua própria vontade de destruição. O caminho YX da evolução tem de ser percorrido pelo ser, constrangido pela dor, contra a sua vontade rebelde, que é de afastamento e não de retorno ao S.
Eis que chegamos ao ponto chave do problema e podemos compreender porque nasce o erro, isto é, a causa primeira do que se chama culpa ou pecado. A posição do ser situado ao longo do caminho YX da evolução, representa um contraste entre o impulso da Lei que impele o ser para o S, e o impulso do ser que opõe resistência porque, pelo contrário, ele quer dirigir-se para a realização do AS. A vontade da Lei é de levar a ser para o ponto X. A vontade do ser é de realizar a plenitude da sua revolta no ponto Y.
Disto se segue: 1) A linha do erro NN1 é produto da vontade do ser, contra a da Lei. 2) a linha da dor N1N é produto da vontade da Lei contra a do ser. 3) Este deslocamento lateral MAN é da mesma natureza do deslocamento maior XYX, do qual se apresenta como um caso menor. 4) Cada erro ou pecado representa uma tentativa de revolta contra o S para se aproximar do AS, movida por uma vontade rebelde à ordem de Deus, é efeito desse impulso de emborcamento se constitui uma queda que depois é necessário recuperar com a dor. 5) O deslocamento lateral NN1N representa um desabafo da vontade do ser que quer ir contra a da Lei. O afastamento se realiza em sentido lateral, porque aqui a vontade do rebelde encontra menor resistência do que se retrocedesse direto contra a da Lei em sentido vertical para Y. Neste caso, o ser, para atingir a satisfação da sua vontade, segue e caminho de menor resistência.
Este é o caso mais simples, que estudamos primeiramente. Mas veremos agora o caso diferente e mais complexo de, outros afastamentos não horizontais: afastamentos oblíquos, seja para cima como para baixo, em que por conseguinte prevalece em medida maior ou menor o impulso da vontade rebelde do ser contra a da Lei.
O ser, impulsionado pela sua vontade de revolta dirigida para o AS, contra a oposta vontade da Lei que quer levá-lo para o S, procura uma saída e solução para esse contraste com um compromisso que lhe permita atingir a sua satisfação, mas com o menor esforço possível, contra a vontade da Lei que o aperta do outro lado para levá-lo ao S. Em seu retrocesso para o AS, ao longo da linha XY, a resistência será muito maior. Do contraste entre esses dois impulsos opostos nascerão, segundo o poder do impulso de revolta do ser, diferente, modelos ou tipos de afastamento, como agora estudaremos. Veremos que as linhas do erro e da dor tomarão posições, medidas e valores diferentes, mas sempre obedecendo ao mesmo princípio de equilíbrio, que rege o caso mais simples NN1N, que já observamos, isto é, de exata correspondência e compensação entre o tamanho do erro e o da dor.
Estudaremos assim em vários dos seus aspectos esse fenômeno da tentativa do ser em busca de escapatórias laterais ao impulso corretor da Lei, para realizar a sua vontade de revolta sem ter de chocar-se com a reação da dor. Como já mencionamos, fomos até agora observando o caso mais simples, o do afastamento horizontal, em que as duas linhas, a do erro e a dor, são perpendiculares à da Lei e iguais entre elas. Observemos agora o caso em que a linha do erro não se afasta em sentido horizontal, perpendicular à linha da Lei, mas em direção oblíqua. Temos que considerar primeiro a linha do erro, que expressa o impulso gerador do fenômeno, fato que estabelece a forma do seu desenvolvimento, a medida da linha da dor e sua conseqüência.
A linha do erro pode então ser oblíqua em duas direções: 1) dirigindo-se para o alto, isto é, para o S; 2) dirigindo-se para baixo, isto é, para o AS. Como poderemos então calcular qual será a correspondente linha da dor que leva o ser à linha da Lei?
Aqui a direção oblíqua introduz no fenômeno novos elementos, já que ela implica um deslocamento não somente lateral, de afastamento da linha da lei, como no primeiro caso, mas também um deslocamento que se repercute ao longo daquela linha, em sentido vertical, seja de subida ou de descida. Assim se a posição oblíqua for dirigida para o alto da figura, então a linha do erro terá percorrido também um trecho da linha da Lei em sentido evolutivo, para o S; e se a posição oblíqua for dirigida para baixo, então a linha do erro terá percorrido também um trecho da linha da Lei em sentido involutivo, para o AS.
Nestes dois casos, que chamaremos o 2º e o 3º caso, tendo em vista o primeiro, horizontal, já estudado, o desvio adquire e representa valores diferentes, porque não se trata mais, como no 1º caso, só de um afastamento da linha da Lei, enquanto tudo permanece sempre à mesma altura na escala da evolução, isto é, à mesma distância e na mesma posição a respeito do S como do AS. Nestes dois casos, pelo contrário, o deslocamento da linha do erro, sendo oblíqua, gera também correspondentes deslocamentos na posição ao longo da linha da Lei. Mais exatamente, no 2º caso (oblíquo em subida) verifica-se um deslocamento de aproximação para o S, com todas as respectivas vantagens como conseqüência evolutiva; e no 3º caso (oblíquo em descida) verifica-se um deslocamento para o AS, com todas as respectivas perdas como conseqüência involutiva. No desenvolvimento do processo do endireitamento corretor, para chegar a conhecer quais são os seus resultados finais, é necessário então levar em conta e calcular o valor de todos esses movimentos, que vemos expressos pelo comprimento das linhas que observarmos na figura.
Aqui a linha da volta ou da dor não é constituída somente pela contrapartida igual à linha do erro, mas por um caminho mais longo e complexo. no qual aparecem outros elementos, cujo valor é necessário definir. Enfrentemos então o problema mais de perto, observando as suas diferentes posições em nossa figura. Ela nos apresenta três modelos ou casos fundamentais.
1º) – O primeiro caso e o do afastamento horizontal, de que já falamos. Ele está expresso pelo percurso NN1N, isto é, pelo comprimento da linha verde do erro e da linha vermelha da dor. A primeira linha nos expressa a medida do afastamento para fora da linha da Lei, ou caminho percorrido em sentido negativo na ida, o que é igual à segunda linha que nos expressa a medida do trabalho de nova aproximação à linha da Lei, ou caminho a percorrer em sentido positivo de volta.
A fórmula deste 1º caso é :
NN1 ( – ) = N1N ( + )
2º) – O segundo caso é o do afastamento oblíquo em subida. Aqui o problema se torna mais complexo, porque podemos encontrar muitas posições e relações diferentes entre as duas linhas, a do erro ( – ) e a da dor ( + ), a segunda encarregada de neutralizar a primeira. Para simplificar escolhemos, como na figura, só duas posições principais, representando todas as outras possíveis apenas variações destas. Cada posição pode ser expressa pela sua fórmula.
a) Posição a, do 2º caso. Esta posição do afastamento oblíquo em subida resulta do percurso NN2N3. Pelo fato de que a linha do erro é em subida, o caminho reconstrutor pela dor acaba no ponto final N3, e não no ponto de partida N, como no 1º caso. Assim neste caso o deslocamento lateral do erro implica também na trajeto NN3, percorrido em subida, em sentido positivo evolutivo, ao longo dia linha da Lei, em favor do ser. (Representa uma vantagem para ele tudo o que o leva para o S).
b) Posição b, do 2º caso. Esta posição resulta do percurso NN4N5, e é semelhante à precedente. A diferença é só esta: que o afastamento é ainda mais oblíquo em subida, com a conseqüência que assim se intensificam, acentuadas com maior evidência, as qualidades do caso precedente ou posição A. Pelo fato de que alinha do erro é ainda mais em subida, o caminho reconstrutor pela dor acaba não na ponto final N3, mas no ponto N5. Assim neste caso o deslocamento lateral do erro implica também no trajeto NN5, percorrido em subida, em sentido positivo evolutivo, ao longo da linha da Lei, maior que o precedente, em favor do ser.
3º) – O terceiro caso é o do afastamento oblíquo em descida. Aqui nos encontramos nos antípodas do 2º caso, precedente. O mesmo processo se repete, mas às avessas, em forma emborcada, gerando por isso valores opostos. Aqui também, como acima, para simplificar escolhemos só duas posições principais, deixando as outras possíveis posições intermediárias. Aqui também cada posição pode ser expressa pela sua fórmula, como veremos.
a) Posição a, do 3º caso. Esta posição do afastamento oblíquo em descida, resulta do percurso NN6N7. Pelo fato de que a linha do erro desta vez e era descida, o caminho reconstrutor pela dor acaba no ponto final N7, e não no ponto de partida N. Assim neste caso o deslocamento lateral do erro implica também no trajeto NN7 percorrido em descida, em sentido negativo involutivo, ao longo da linha da Lei, em prejuízo do ser. (Representa um da- no para ele tudo o que o leva para o AS).
b) Posição b, do 3º caso. Esta posição resulta do percurso NN8N9, e é semelhante à precedente. A diferença é só esta: que o afastamento é ainda mais oblíquo em descida, com a conseqüência que assim se intensificam, acentuadas com maior evidência, as qualidades do caso precedente ou posição a. Pelo fato de que a linha do erro é ainda mais em descida, o caminho reconstrutor pela dor acaba não no ponto final N7, mas no ponto N9. Assim neste caso o deslocamento lateral do erro implica também no trajeto NN9, percorrido em descida, em sentido negativo involutivo, ao longo da linha da Lei, maior que o precedente, em prejuízo do ser. Eis o esquema geral dos três casos e suas posições. Entrando em outros pormenores, explicaremos mais adiante tudo melhor.
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Analisemos agora os conceitos acima mencionados, para compreender o seu significado e o que a eles corresponde na realidade. Vigora sempre em todo o momento do fenômeno o contraste entre os dois impulsos opostos: o da negatividade devido à vontade de revolta do ser, dirigido para o AS, e o da positividade devido à vontade de ordem da Lei, que impulsiona para o S. Tudo o que é negativo esta marcado na figura em cor verde e com o sinal (–) Tudo o que é positivo esta marcado na figura em cor vermelha e com o sinal (+).
O impulso da negatividade gera a linha do erro, o da positividade gera a linha da dor. Então a linha verde do erro, de sinal –, representa o dano do ser porque, apesar de correr atrás de gozos efêmeros, por esse caminho ele se afasta da Lei que representa a sua verdadeira felicidade. E a linha vermelha da dor, de sinal +, representa a vantagem do ser porque, apesar de sofrer, por esse caminho ele neutraliza o erro e, recuperando o perdido, de novo se aproxima da Lei, em que está a felicidade.
Aqui, quando falamos de dano ou vantagem, o nosso ponto de referencia é o mais importante, isto é, Deus, o S, a Lei, em que se encontra o único verdadeiro bem-estar do ser; e não é o seu gozo momentâneo e ilusório, porque rouba à justiça da Lei e por isso é dívida a pagar, que leva ao estado completo e definitivo da sua felicidade.
Este novo modo de equacionar o problema em direção obliqua, com a conseqüente posição inclinada da linha do erro em relação à linha da Lei, introduz no fenômeno elementos e valores novos que é necessário levar em conta e definir. Nestes dois: 2º e 3º caso, não ha somente a linha do afastamento lateral, a do erro, mas verifica-se também um deslocamento no sentido vertical, ao longo da linha da Lei. Se esse deslocamento é em subida, para o S, ele se resolve num caminho percorrido no sentido da obediência; se ele é em descida, para o AS, se resolve num caminho percorrido no sentido da revolta.
Assim temos agora não somente que calcular os valores da linha do erro no sentido da negatividade e da linha da dor no sentido da positividade, mas tombem no 2º caso os valores positivos construtivos, produto do deslocamento ao longo da linha da Lei em subida (evolução), e no 3º caso os valores negativos destrutivos, produto do deslocamento ao longo da linha da Lei em descida (involução). O valor do resultado final atingido pelo ser nestes dois casos, será obtido comparando o valor expresso pelo comprimento do conjunto de todas as linhas positivas de um lado, considerado em relação ao valor do conjunto de todas as linhas negativas do outro, ou ao contrário.
Nestes dois casos temos então de observar o comprimento de 4 linhas, que nos expressa e dá a medida do conteúdo e valor delas.
1) A linha do erro ( – ), oblíqua, de afastamento da linha da Lei, em subida (2º caso), ou descida (3º caso).
2) A 1inha da dor ( + ), horizontal, de volta, dirigida para a linha da Lei.
3) A linha vertical ao longo da linha da Lei, em subida, em sentido positivo, dirigida para o S, como no 2º caso. Poderemos chamá-la a linha da obediência.
4) A mesma linha vertical, mas em descida, em sentido negativo, dirigida para o AS, como no 3º caso. Poderemos chamá-la a linha da revolta.
Então o resultado final do processo do 2º caso será dado pela soma do comprimento das linhas de sinal positivo (neste caso maiores), isto é, a linha da dor ( + ), mais a linha da obediência (+), menos a linha do erro ( – ), neste caso linha menor). Assim, agora prevalecem e vencem os valores positivos. Pelo contrário, o resultado final do processo do 3º caso será dado pela soma do comprimento das linhas de sinal negativo (neste caso maiores), isto é, a linha da erro ( – ), mais a linha da revolta ( – ), menos a linha da dor ( + ), (neste caso linha menor). Assim, agora prevalecem e vencem os valores negativos.
Qual é mais exatamente o significado contido nestas linhas?
A linha do erro expressa a nossa direção errada na procura da satisfação de um desejo fundamentalmente legítimo, para atingir a felicidade, porque a isso fomos criados. O caminho certo para ela é o da Lei, que vai direto para o S. Todos os outros caminhos são errados. É lógico porem que, como está expresso na figura, quanto mais é oblíqua a linha do erro, e com isso é menor o afastamento longe da linha da Lei, tanto menor tenha de ser o cumprimento da linha da dor, que e a de revolta à Lei e corretora do erro.
Mas o fenômeno não se esgota só com estas duas linhas, a do erro e a da dor. Se a primeira expressa a procura da felicidade em sentido errado, e a segunda a correção de tal erro pela penitência da dor, as duas linhas que, no 2º e 3º caso, aparecem em sentido vertical, não são escapatórias longe do caminho carreto da linha da Lei, mas constituem um deslocamento vertical que se dirige, no 2º caso, o da obediência, direto para o S, e no 3o. caso, o da revolta, direto para o AS. Nestes dois casos não se realiza só uma fuga longe do caminho da Lei, como na linha do erro, mas também um caminho direto ao longo da linha da Lei, seja para Deus, seja contra Deus para o Anti-Deus. Nestes dois casos, pelo fato de que o ser trabalha não se afastando da linha da Lei, mas ficando dentro dela, percorrendo um trecho seu, se repete o motivo fundamental da primeira revolta e queda para o AS, se o ser vai em descida, e o motivo da obediência e salvação para o S, se ele vai em subida.
Podemos agora compreender como se desenvolve o fenômeno. No 2º caso a linha do erro não se resolve só em puro valor negativo de erro mas, pelo fato de que é dirigida para o alto, resulta corrigida pelo valor da linha da obediência, que com a sua positividade neutraliza a negatividade da linha do erro, resolvendo caso com uma linha de dor, proporcionalmente menor.
No 3º caso, pelo contrário, a linha do erro não somente fica com o seu valor negativo de erro, não corrigido pelo valor de alguma linha positiva de obediência mas, pelo fato de que é dirigida para baixo, resulta aumentada, porque soma a sua negatividade com a da linha da revolta, resolvendo o caso com uma dor proporcionalmente maior, porque funciona duas vezes, uma para corrigir o afastamento do erro, voltando à linha da Lei; e outra para corrigir a revolta percorrendo em subida o caminho percorrido em descida, involuindo. Para neutralizar a negatividade de duas linhas em descida, seria necessária a presença de um correspondente caminho no positivo, isto é, de uma linha da dor maior, tal que neutraliza-se a linha do erro mais a linha da revolta. É lógico: o que pode levar os valores negativos destruidores para o seu endireitamento corretor que os neutralize, não pode ser senão um correspondente peso de valores positivos que atuem no sentido da reconstrução. Temos então neste 3º caso uma linha corretora dupla. Ela se realiza em dois momentos; 1) A linha do erro ( – ) resulta corrigida pela linha da dor ( + ), que se desenvolve em sentido horizontal. 2) O que, pela inclinação da linha do erro, foi uma descida, e com isso se tornou também linha de revolta, para ser corrigido, tem de ser percorrido de novo às avessas em subida, como linha da obediência, fato que, como veremos, representa um valor diferente.
É necessário compreender que o impulso gerador da linha revolta não é da mesma natureza que o da linha do erro. Esta, como há pouco mencionamos, deriva de um desejo de felicidade, que por si mesmo não constitui impulso errado, porque pertence ao ser como seu direito fundamental, que ele possuía em seu estado de origem como cidadão do S. Como tal, esse impulso pertence à positividade. O que o torna errado é a sua direção de afastamento da linha da Lei, e o leva à negatividade, na medida em que se realiza afastamento. Por outro lado, o princípio psicológico básico da linha da revolta é o egocentrismo separatista contra Deus, para substituir-se, a Ele. Aqui, pelo contrário, se trata de um impulso fundamentalmente errado, toda negatividade, porque dirigido somente como emborcamento do S no AS, para a derrota de Deus e a vitória do Anti-Deus. Neste caso não se trata de erro, mas de revolta. O pecado não é um dos pecados comuns de nossa vida, mas é o maior, o da rebeldia que gerou a queda; não e pecado que a criatura cometa contra si mesma, mas sim contra Deus. Se a linha do erro representa o princípio do afastamento, a linha da revolta expressa o princípio do emborcamento total. Este e o pecado de Lúcifer, pecado de orgulho que tenta agredir a Deus para destrui-Lo. Não se trata da comum fraqueza humana, caminho errado na busca do gozo, mas de uma revolta consciente, feita de propósito, para atingir a sua finalidade subversiva.
Seja em subida com a linha da obediência (2º caso), seja em descida com a linha da revolta (3º caso), se trata sempre de fundamentais deslocamentos evolutivos ou involutivos, cujo resultado e ou uma construção e adiantamento para o nosso bem, ou uma destruição e retrocesso, que depois e necessário pagar com um novo trabalho de construção e recuperação. Neste caso ao erro se junta a culpa da revolta. Isto se verifica quando se faz o mal de propósito, com conhecimento e vontade de fazer o mal. No 2º caso, em subida, há somente erro, sem vontade de revolta, mas pelo contrario, com desejo de obediência que contrabalança a descida do erro, porque leva para o alto ao invés de levar para baixo. Esta boa vontade de seguir a Lei, embora errando, significa introduzir no fenômeno uma dada percentagem de positividade apta a neutralizar a negatividade do erro; enquanto no 3º caso a má vontade de revolta contra a Lei significa introduzir no fenômeno ainda mais elementos de negatividade, que se somam aos negativos do erro. O ser e responsável também pelo erro sem vontade de revolta, porque ele é devido à sua ignorância, que é conseqüência da queda, que foi o fruto da sua vontade de revolta. É justo então que também esse erro o ser tenha que resgatar à sua custa pela dor.
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Analisemos ainda mais de perto o problema, escolhendo agora como ponto de referência, o ser, a sua verdadeira vantagem ou prejuízo.
Com a ajuda de nossa figura procuramos chegar ao cálculo geométrico dos fenômenos da ética. Colocamos aqui os seus princípios fundamentais, suscetíveis de desenvolvimento com teoremas, demonstrações e conclusões racionais.
Voltemos a observar o 2º e o 3º caso, nas suas duas posições a) e b), para resolvê-los em termos de débito ou crédito da parte do ser.
2º caso. Poderíamos chamar favorável este caso, porque o caminho das linhas positivas sendo maior do que o das negativas, o balanço se fecha em vantagem do ser.
Posição a) do 2º caso.
O cálculo neste caso se baseia sobre três linhas: 1) a ver- de negativa do erro, NN2; 2) a vermelha positiva da dor, N2N3; 3) a vermelha positiva da evolução ao longo da linha da Lei, NN3. Na balança entre os valores negativos e os positivos, vencem os positivos, pelo fato de que estes são representados por duas linhas contra uma só negativa. Do lado da negatividade temos a linha NN2 ( – ). Do lado da positividade temos
[ N2N3 ( + )] + [NN3 ( + )].
Então a linha do erro ( – ) fica compensada por duas linhas de sinal oposto, a da dor (+) e a da obediência (+). A diferença entre os caminhos destruidores de valores e os reconstrutores é em sentido positivo. Então o movimento todo no seu conjunto se resolve em proveito do ser, pelo fato de que a soma das duas linhas positivas é maior do que a negativa.
A fórmula da posição “a” do 2º caso tem de exprimir a vantagem ( + ) em termos de valores positivos em favor do ser, como no 3º caso, que é o seu oposto, a respectiva fórmula tem de exprimir, como veremos, o dano do ser ( – ) em termos de valores negativos. Assim, enquanto no 1º caso os dois valores opostos + e – se equilibram, sendo iguais, neste 2º caso há uma diferença em sentido positivo favorável de vantagem, como no oposto 3º caso é lógico haja uma diferença em sentido negativo contrário, de prejuízo.
Expressemos com a letra V( + ) o conceito dessa vantagem. Ela significa tudo o que o ser ganha em sentido de positividade, de subida do AS para o S, em termos de evolução e correlativo melhoramento.
Então a fórmula resolutiva da posição a) deste 2º caso é a seguinte :
V( + ) = [ (N2N3 ( + ) + NN3 ( + ) ) – NN2 ( - )
Posição b) do 2º caso. Nesta outra posição se repete em medida e evidência maior o que temos observado a respeito da posição a) do mesmo 2º caso. A fórmula contém os mesmos elementos, mas ainda mais deslocados para os valores positivos em favor do ser. Aqui selecionamos só estas duas posições a) e b) para simplificar. Mas é possível imaginar entre elas quantas posições intermediárias quisermos, conforme a medida de deslocamento de valores que escolhermos.
Aqui também o cálculo se baseia sobre três linhas: 1) a verde negativa do erro, NN4, 2) a vermelha positiva da dor, N4N3; 3) a vermelha positiva da evolução ao longo da linha, NN5. Aqui também vencem os valores positivos, representados por duas linhas contra só uma negativa. Do lado da negatividade temos a linha NN4 ( – ). Do lado da positividade temos [N4N5 ( + )]+ [NN5 ( + )], Aqui também a diferença é em sentido positivo e o movimento todo se resolve em proveito do ser.
Então a fórmula resolutiva da posição b) deste 2º caso é a seguinte :
V( + ) = [N4N5 ( + ) + NN5 ( + )] – NN4 ( – )
Algumas observações. Observamos que, quanto mais vertical e menos obliqua é a linha do erro, e com isso é menor o seu afastamento da linha da Lei, tanto mais diminui o comprimento da linha da dor e aumenta a linha do progresso em subida, isto é, o comprimento do trajeto percorrido em sentido evolutivo em favor do ser. Isto quer dizer: 1) que diminui sempre mais o caminho de volta para a Lei (dor); 2) que o ser realizou um trabalho útil de progresso ao longo da linha da Lei em seu proveito.
Não esqueçamos o que há pouco mencionamos, isto é, que aqui estudamos o fenômeno em função da vantagem ou dano do ser, e que por isso estes são agora os nossos pontos de referência.
Na posição a) deste 2º caso temos então que, se para corrigir o erro expresso pelo comprimento da linha NN2 é necessária a dor expressa pelo comprimento da linha N2N3 (dano), ao mesmo tempo o ser percorreu em sentido evolutivo o comprimento da linha NN3 em seu proveito. No 1º caso, NN1N o ponto de chegada é N, o mesmo que o de partida. Mas no 2º caso o ponto de partida é N, e o ponto de chegada é N3, o que quer dizer que, embora errando pelo caminho do mal, o ser realizou alguma coisa no caminho do bem, Isto não é absurdo nem impossível na realidade de nosso mundo, onde vemos que bem e mal muitas vezes se misturam no mesmo ser e na mesma obra. Acontece assim que o pagamento por meio da linha da dor não somente neutraliza a do erro, mas através desta experimentação deixa no fim o ser numa posição mais adiantada. Isto representa uma vantagem que compensa e anula parte do dano produzido pelo erro. Este trecho que foi ganho como progresso constitui como um abatimento na dívida que o ser tem de pagar para se resgatar do erro com a sua dor. Eis aí o significado da fórmula resolutiva da posição a) do 2º caso.
Na posição b) deste 2º caso as características do fenômeno vão sempre aumentando em favor do ser. A linha da dor, ao invés do comprimento NN3, fica reduzida à linha N4N5; e a linha do progresso em subida, ao invés do comprimento NN3, resulta aumentada a NN5. Desta vez o ponto de chegada é N5, o que quer dizer que foi percorrido em subida um caminho ainda maior, e que por conseguinte no fim o ser se encontra numa posição ainda mais adiantada. Isto representa uma vantagem maior em favor do ser. Este trecho a mais que foi ganho como progresso constitui um abatimento maior na dívida que o ser tem de pagar com a sua dor, ao mesmo tempo que o comprimento da linha da dor foi diminuindo. Eis aí o significado da fórmula resolutiva da posição b) no 2º caso.
Estas duas posições a) e b), como há pouco dizíamos, são só dois exemplos escolhidos para a nossa demonstração entre os muitos possíveis, que cada um pode multiplicar à vontade. Mas estes dois, como na figura, já bastam para nos mostrar a tendência do fenômeno de deslocar os seus valores no sentido de que, à posição cada vez menos oblíqua e inclinada da linha do erro, corresponde uma progressiva diminuição do comprimento da linha da dor (dano), e um progressivo aumento do comprimento da linha do progresso em subida (vantagem).
Esta tendência nos leva a considerar a posição limite deste processo, e a poderíamos chamar a posição c) deste 2º caso.
Esta tendência significa que o fenômeno está dirigido para uma quantidade de valores positivos conquistados, sempre maior, para a vantagem do ser, e para uma quantidade de valores negativos cada vez menor, a cargo e para o dano do ser. Não há somente o fato de que os primeiros funcionam em favor do ser, como resgate do seu erro; mas ao mesmo tempo há também uma diminuição progressiva do comprimento da linha da dor.
Ora, é claro que, se levarmos esse processo até ao seu caso limite, atingiremos uma posição em que a quantidade dos valores positivos conquistados será máxima, e com isso o será a vantagem do ser; e a quantidade dos valores negativos será anulada, e com isso o será o dano do ser. Acontece que no fim desaparece a linha da dor, e o erro não foi mais erro, mas só uma tentativa bem sucedida que se resolveu num progressivo caminho de subida. Isto é lógico, porque a crescente inclinação da linha do erro para o alto, cada vez mais a aproxima da linha da Lei,, até anular todo afastamento e com isso a linha da dor que é a sua conseqüência, porque representa o caminho de volta à Lei. É lógico que, não havendo mais afastamento, não haja também linha de dor. Neste caso limite o fenômeno chega então a esta posição: não mais afastamento, nem dívida a pagar, nem dano e dor para o ser, nem valores negativos a resgatar, restando somente a vantagem da evolução realizada. Este é o caso dos santos que, como Agostinho e Francisco de Assis, pecadores na sua juventude, do erro souberam tirar a experiência útil para realizar um progresso espiritual e, assim, transpuseram um nível de vida mais alto.
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Continuemos agora analisando este processo, mas em sentido oposto, igualmente nas suas duas posições a) e b).
3º caso. Poderíamos chamar desfavorável este caso, porque o caminho das linhas positivas sendo menor do que o das negativas, o balanço se fecha com prejuízo para o ser.
Posição a) do 3º caso.
O cálculo neste caso se baseia sobre três linhas: 1) verde negativa do erro, NN6; 2) a vermelha positiva da dor, N6N7; 3) a verde negativa da involução, percorrida em descida ao longo da linha da Lei, isto é, a linha NN7, que terá de ser corrigida em sentido oposto, positivo, evolução, como esforço de subida, N7N. Aqui na balança entre os valores negativos e positivos, vencem os negativos, pelo fato de que estes estão representados por duas linhas, contra uma positiva. Do lado da negatividade temos as linhas [NN6 ( – ) ] + [NN7 ( – )]. Do lado da positividade temos só a linha N6N7. Então à linha do erro ( – ) se junta outra linha negativa, a da descida involutiva. A diferença entre os caminhos destruidores de valores e os reconstrutores, é em sentido negativo. Então o movimento todo no seu conjunto se resolve em prejuízo do ser, pelo fato de que a soma das duas linhas negativas é maior do que a positiva. Se no fim do processo da posição a) do 2º caso o ser se encontrava em N3, com a vantagem do caminho percorrido em subida como progresso, agora no fim do processo da posição a) do 3º caso, o ser se encontra em N7, com a desvantagem do caminho percorrido em descida como involução, que depois é necessário pagar subindo de novo com o próprio esforço.
Então a fórmula desta posição a) do 3º caso tem de exprimir esta desvantagem (– ) em termos de valores negativos com dano para o ser, como acima mencionamos. Aqui nos encontramos na posição oposta à correspondente a) do 2º caso.
Expressemos com a letra D (– ) o conceito deste dano. Este significa tudo o que o ser perde em sentido de negatividade, de descida do S para o AS, em termos de involução e correlativo prejuízo.
Então a fórmula resolutiva da posição a) deste 3º caso é a seguinte :
D ( – ) = N6N7 ( + ) – [NN6 ( - ) + NN7 ( - )]
Posição b) do 3º caso. Nesta outra posição se repetem mais acentuadas e evidentes as condições da posição a) do mesmo 3º caso. É lógico então que os valores negativos prevaleçam ainda mais sobre os positivos, o que quer dizer para o ser aumento de desvantagem. A fórmula contém os mesmos elementos, mas ainda mais deslocados para os valores negativos, em desfavor do ser. Aqui vigoram os mesmos princípios, mas sempre piorando, o contrário da correspondente posição b) do 2º caso que iam sempre melhorando.
Aqui também o cálculo se baseia sobre três linhas: 1) a verde negativa do erro, NN8; 2) a vermelha positiva da dor. N8N9; 3) a verde negativa da involução, percorrida em descida ao 1ongo da linha da Lei, isto é, a linha NN9, que tem de ser corrigida em sentido oposto, positivo de evolução, como o esforço do ser, pelo caminho inverso N9N. Aqui vencem sempre mais os valores negativos, representados pelas duas linhas deste sinal, contra só uma positiva. Do lado da negatividade temos as linhas [NN8 ( – )]+ [NN9 ( – )] . Do lado da positividade temos só a linha N8N9 (+). Aqui também a diferença é em sentido negativo e o processo se resolve todo em desfavor do ser, pelo fato de que à linha do erro ( – ) se junta outra linha negativa, a da descida involutiva, e a soma das duas linhas negativas é maior do que a linha positiva. Se no fim do processo da posição a) do 3º caso o ser havia descido até ao ponto N7 da escala evolutiva, agora no fim do processo da posição b) do mesmo 3º caso, o ser desceu até ao ponto N9, o que exige depois um trabalho de recuperação muito maior.
Então a fórmula resolutiva da posição b) deste 3º caso é a seguinte :
D ( – ) = N8N9 ( + ) – [ NN8 ( – ) + NN9 ( – )]
Algumas observações. Se no 2º caso vai cada vez mais aumentando a linha percorrida em subida evolutiva em favor do ser, no 3º caso o mesmo fenômeno se repete às avessas, e assim vai cada vez mais aumentando a linha percorrida em descida involutiva em desfavor do ser. No 2º caso tudo está orientado em sentido positivo construtor, no 3º caso em sentido negativo destruidor, Trata-se de dois sistemas de forças opostas : um dirigido para o alto, o outro para baixo. No primeiro prevalecem os valores positivos, e é lógico então que o resultado final seja positivo: V(+). No segundo prevalecem os valores negativos e é lógico então que o resu1tado final seja negativo: D ( – ). Se no 2º caso, em subida, a linha verde ( – ) do erro resulta corrigida só pela linha vermelha ( + ) da dor, com a vantagem ( + ), porem, de ter atingido um ponto mais adiantado no caminho da evolução, no 3º caso, em descida, a linha do erro resulta corrigida pela linha vermelha ( + ) da dor, com a desvantagem ( – ), porém, de ter retrocedido para um ponto mais atrasado no caminho da evolução.
Para voltar ao ponto de partida N, recuperando o perdido, é necessário reconstruir o que foi destruído, isto é, com o próprio esforço ter de cumprir de novo o trabalho de percorrer em subida o caminho que foi percorrido em descida E por isso que no 3º caso o trabalho necessário para chegar ao resgate do erro é muito maior. Enquanto no 2º caso a linha em sentido evolutivo representa um abatimento na dívida do ser, o que constitui um crédito em seu favor, no 3º caso não somente não existe essa compensação, mas a linha percorrida em sentido involutivo representa um acréscimo na dívida do ser, enquanto gerou um novo débito a pagar, que vai aumentar o outro expresso pela linha do erro.
Se olharmos para as posições a) e b) do 3º caso, veremos a mesma tendência a um deslocamento de valores sempre maior que, se no 2º caso é em sentido positivo, pelo contrário neste 3º caso é em sentido negativo. Em outros termos, quanto no 2º caso a tendência é dirigida para um contínuo aumento em favor do ser, no 3º caso ela o é para um contínuo aumento em desfavor dele.
Continuando por este caminho, chega-se, como vimos no 2º caso, à posição limite do fenômeno. Nesta posição a linha do erro tanto se inclinou para baixo, que acabou sobrepondo-se à linha da Lei, mas às avessas, isto é, em sentido emborcado, todo negatividade, não em subida mas em descida.
Esta é o que podemos chamar a posição c) do 3º caso.
Se no 2º caso a anulação do afastamento da linha do erro da linha da Lei levou à anulação da linha da dor, e no fim ficou só o trabalho positivo realizado em sentido evolutivo, neste 3º caso a mesma anulação do referido afastamento leva à anulação da linha da dor em outro sentido. Não há outros meios de recuperação que não sejam aqueles de repetir, sozinho, o esforço de quem, involuindo, caiu no fundo de um abismo e tem de subir novamente, escalando à sua custa as íngremes paredes. Não se trata mais só de uma penitência que neutraliza o pecado. Pela sua descida o ser retrocedeu um mais baixo nível de vida, repetindo e confirmando com vontade de revolta um trecho do mesmo caminho da primeira grande queda.
Para o ser abismado nesta posição, ficou anulada até a linha vermelha da dor (+) com os seus poderes reconstrutores de positividade. Com isso desaparece a possibilidade do resgate pelo caminho do arrependimento e da dor, que representam o meio com que pode corrigir o erro quem ficou no mesmo nível de evolução. O ser desta vez se tornou fera, porque involuiu num trecho do caminho para o AS e com isso adquiriu mais qualidades deste ao mesmo tempo perdendo as do S; perdeu o que tinha conquistado em conhecimento, felicidade, vida, liberdade, proporcionalmente decaindo para a ignorância, o sofrimento, a morte, o determinismo e o caos do inferno. Este é o justo galardão que recebe, porque merecido, quem cumpre o crime da revolta absoluta contra Deus, não por erro mas, como mencionamos, por orgulho, por espírito de revolta, com conhecimento e vontade de praticar o mal. Este caso é mais raro que o do erro comum, porque requer um impulso muito mais decidido para a negatividade, impulso de revolta que tem de ser tanto mais poderoso quanto mais for inclinada a linha do erro, até ao caso limite em que ela não é mais lateral, mas só descida vertical, involução, posição de revolta absoluta para a vitória do AS, vontade do ser contra a da Lei. Não se trata mais do pecado do homem, mas, como dissemos, do de Lúcifer, que não se resolve só com o arrependimento percorrendo a linha da dor, mas de novo transformando-se e amadurecendo pela profunda e dura fadiga redentora da evolução.
Neste caso não se trata de uma negatividade acidental, de superfície, fácil de corrigir, porque o erro por si só não subverte fundamentalmente a natureza do ser. Mas se trata, pelo contrário, de uma negatividade central, profunda, e para endireitar é necessário um renovamento igualmente central e profundo no sentido da positividade, pelo fato de que neste caso, por causa do regresso, acordam e voltam a desencadear-se as forças obscuras do AS. Este é o caso oposto ao dos santos, acima mencionados, que erraram na procura da verdade e do bem, para acabar santificando-se. Neste 3º caso em descida se trata, pelo contrário, de seres que quiseram fazer o mal, pelo mal, em pleno conhecimento, não por erro, mas por vontade decisivamente resolvida a realizar o emborcamento do S no AS. Este não é só pecado secundário devido à ignorância e fraqueza do ser, erro que pode gerar somente um afastamento lateral, que a penitência da dor pode corrigir; mas é o pecado fundamental, o primeiro e maior, devido ao espírito de revolta, o que gerou o processo involutivo da queda e o desmoronamento de todo o nosso universo.
Eis o significado das duas posições limites c) do 2º e 3º caso. A primeira é toda em subida, fato que neutraliza o erro e acaba reabsorvendo a linha da dor. A segunda é toda em descida, fato que transforma o erro em crime, que não há arrependimento e sacrifício comum que possa facilmente apagar. A progressiva inclinação da linha do erro para o alto no 2º caso, até à referida posição limite, tende a transformar cada vez mais o erro (-) em trabalho da evolução (+); e esta transformação se realiza em cheio na posição limite c) do fenômeno, em que triunfa toda a positividade. Ao contrário, a progressiva inclinação da linha do erro para baixo no 3º caso, até à sua posição limite, tende a transformar cada vez mais o erro (-) em trabalho de involução (-); e esta transformação se realiza em cheio na posição limite e) do fenômeno, em que triunfa toda a negatividade.
Na primeira destas duas posições limites venceu a Lei e, em obediência, o ser ganhou. Na segunda venceu o ser e, com a revolta, ele perdeu. Nestas duas posições limites todo o movimento se realiza não de lado, mas dentro da linha da Lei. Adquire por isso, seja no sentido da positividade como no da negatividade, sentido resolutivo de progresso que é vida, ou de regresso que é morte. Nestes casos o deslocamento não é só afastamento lateral, que deixa o ser no mesmo plano de vida, mas é deslocamento de nível biológico para o S, ou para o AS, com todas as suas conseqüências. No 3º caso se trata do emborcamento dos valores fundamentais do existir, de regresso, de gênese do mal, como no caso da primeira revolta. A inclinação da linha do erro para o alto expressa a boa vontade, que é tanto maior quanto maior for a inclinação, até ser toda completa, quando as duas linhas coincidem na posição limite A inclinação da linha do erro para baixo expressa a má vontade, que é tanto maior quanto maior for a inclinação, até se completar quando as duas linhas coincidem na posição limite.
Erro e boa ou má vontade são elementos que todos conhecemos pela nossa prática quotidiana, e que de fato vemos misturar-se em cada ato nosso, em proporções diferentes. Eis que este estudo geométrico de nossa figura, apesar de poder parecer trabalho abstrato afastado da realidade, nos leva a compreender o valor e as conseqüências de nossa conduta, e a formular racionalmente as normas dessa nova ética, cujos alicerces estamos aqui construindo, com a enunciação dos seus princípios.
Antes de continuar a nossa pesquisa no terreno da ética, paremos um pouco para nos orientar. O nosso caminho se dirige do universal para o particular, do tronco para os ramos. Depois de ter explicado as teorias gerais nos nossos livros: Deus e Universo e O Sistema, agora entramos no terreno das suas conseqüências práticas. Isto é útil porque aproxima o absoluto de nosso relativo, transforma os longínquos princípios abstratos em normas práticas à nossa vida. É necessário, porém, não perder contato com aqueles princípios fundamentais, porque se nos afastarmos daquele fio condutor que tudo orienta, há o risco de nos perdermos no labirinto das particularidades de que está feita a realidade dos fatos. Ficaremos imersos na ilusão das aparências da superfície e nos escapará o verdadeiro sentido das coisas.
Eis então as linhas gerais de nosso caminho, no qual procuramos conciliar as duas exigências opostas. A primeira visão apareceu na sua forma mais abstrata no livro: Deus e Universo. Aí a concepção é cósmica, científica3 esquemática, fria, tão acima da realidade de nosso mundo, que parecia não ter contato com esta, nem relação possível para nos interessar. Por isso esse livro não foi compreendido, porque ele, iniciando das primeiras origens, ficava no terreno do absoluto, longe de nosso relativo, não no concreto, mas no abstrato, não no prático, mas no teórico, não no particular, mas no universal; ficava bem afastado da realidade que nos cerca e, por isso, melhor compreendemos.
Continuando, porém, no mesmo caminho, eis que o segundo volume, O Sistema, se aproxima de nosso mundo, para nele encontrar as primeiras conseqüências concretas e particulares dos princípios abstratos e universais do primeiro volume. A maneira de tratar o assunto humaniza-se então, aproximando-se cada vez mais da forma mental humana, apoiando-se nos seus pontos de referência. Por isso esse livro foi melhor compreendido.
Por esse caminho chegamos ao presente volume: Queda e Salvação, no qual a primeira visão, atingindo as suas últimas conseqüências, se enxerta em cheio e se funde em nossa vida humana, como lei de salvação. Podemos agora explicar-nos como estamos no momento presente chegando a este ponto final de nosso caminho, e a sua ética; podemos compreender como, depois de ter nos outros livros falado da teoria geral da criação, acabamos agora falando da conduta humana, do erro e da dor, da Lei e da redenção. Eis o valor prático e o fruto concreto das abstrações do livro: Deus e Universo.
O caminho foi longo, mas era necessário percorrê-lo todo, porque se não tivéssemos começado das primeiras origens das coisas, não teria sido possível chegar a esse tipo de ética, isto é, não empírica e arbitrária, mas ética racional, justificada pelo fato de que, por lógica dedução, ela desce dos princípios absolutos de Deus e da Sua primeira criação. Se quiséssemos traçar o fio condutor que liga esses três livros, poderíamos dizer que eles representam o mesmo caminho pelo qual Deus vai progressivamente sempre mais se aproximando de nós. Esta ética é a etapa final, o ponto de chegada deste caminho, é o momento em que Deus aparece entre nós vivo na Sua Lei, para nos salvar, dirigindo-nos e impulsionando-nos para o S. É assim que da teoria da queda chegamos à demonstração desta nova ética racional, que constitui o objetivo deste livro.
O mundo precisa desse novo tipo de ética, bem sólida, porque de um lado derivada dos princípios fundamentais que regem o universo, logicamente apresentados, que a demonstram e sustentam, e de outro lado concorde com os fatos de nossa vida prática, que ela explica até às suas primeiras causas, fatos que nesta ética confirmam os princípios universais.
A ética hoje vigorante em nosso mundo, e as regras de vida que de fato o homem para si estabelece. não são produtos nem da lógica nem do conhecimento, mas são desabafo de instintos, produto do subconsciente. O ponto de partida desta ética é a fera, o seu ponto de referência é a animalidade. Pelo próprio fato de que a ética ensina a superação do nível biológico da fera, com isso ela reconhece e prova que o homem pertence a esse plano de vida. Quando os mandamentos dizem: "não matarás", com isso significam que o desejo do homem é o de matar, e quem quer agir assim é fera. Tanto isto é verdade, que o homem, apesar de todas as leis e sanções penais e religiosas, continua matando. A ética representa uma tentativa de regular, disciplinar, apagar esses instintos, que demonstram o seu conteúdo fundamental.
As grandes massas humanas vivem nesse nível. Estes instintos encontram-se momentaneamente adormecidos, pois estão sempre prontos a reaparecer, como vimos nas últimas duas guerras, e também fora do terreno bélico, como cada dia vemos na delinqüência. E o que constitui as verdades que vigoram na prática, é a da maioria a cuja vontade os chefes mais iluminados têm de adaptar-se se querem ser obedecidos, caso eles não sejam da mesma raça e mão possuam os mesmos instintos. Infelizmente o homem não é de forma alguma civilizado. Se ele assim se considera, é por orgulho. A civilização é apenas um verniz colocado na superfície, pintado por fora. Nos fatos o homem vive a lei a sua animalidade.
Isto não quer dizer que não exista na Terra uma ética superior. Mas ela não é produto do homem, desceu do Alto por revelação, ditada a seres superiores excepcionais que no-la ensinaram. Mas esta é a ética oficial, a que está nos livros e nas leis, a que se prega, não a que se pratica. Ela representa uma tentativa para civilizar o animal humano. A este convite e ajuda do Alto para se melhorar e subir, os instintos inferiores gravados no subconsciente responderam com o método dos rebeldes do AS, lutando para eximir-se do esforço evolutivo, para se evadir desse jugo e libertar-se desse constrangimento. Os seres inferiores, ainda criaturas de AS, apegados à sua forma mental de rebeldes, procuraram, pelo contrário, aprender a arte de esquivar-se da disciplina. Da escola da ética saiu uma contra-escola às avessas, a da sabedoria dos emborcamentos, própria do AS, a da sabedoria das adaptações, sagacidades, astúcias e escapatórias. Seguindo o instinto fundamental que é o do egocentrismo, ao invés de praticar as virtudes para se melhorar, a ética se emborcou na procura e na perseguição dos defeitos do próximo. Assim o homem conseguiu emborcar a lógica do S, na do AS. Infelizmente o maior trabalho de todas as formas de cristianismo na Terra, isto é, dos seguidores de Cristo. em última análise se transforma, em grande parte, na arte de enganá-Lo, logrando a Deus por achar que aprendeu a evadir das Suas leis e respectivas sanções. Como verdadeiro cidadão do AS, o homem preferiu colocar-se na posição de luta contra a Lei do S, não para se transformar conforme os seus ditames mas para torcê-la, adaptando-a aos seus instintos inferiores. Assim a sabedoria dos deveres se tornou, nas mãos do homem, a sabedoria das escapatórias.
O homem acabou criando para si um Deus à sua imagem e semelhança, conforme a sua forma mental e instintos. Tudo isto foi trabalho despercebido, fruto de instintos, feito sem querer, nem saber, sem má fé, trabalho realizado no passado quando o controle positivo das ciências psicológicas que analisam esses fenômenos era desconhecido; trabalho profundo do subconsciente das massas, do qual as próprias Igrejas fazem parte, porque elas no seu conjunto não podem ser constituídas por biótipos diferentes do comum.
Aconteceu deste modo porque, na luta entre o ideal e o homem, quem no momento venceu na Terra foi o homem. A ele pertencem o passado e o presente, ao ideal somente o futuro. O homem criou para si, apesar das revelações das religiões, uma idéia absurda de Deus, vigorante na prática, produto da forma mental do homem, a única que ele sabe compreender porque cor responde aos seus instintos. A lei dele é a luta pela vida, que impõe a necessidade de vencer se quiser sobreviver. Donde o instinto fundamental do homem de se afirmar contra todos. Eis então que o Deus concebido pelo homem, para ser obedecido, tem de ser antes de tudo o mais forte, o todo-poderoso no sentido humano de arbítrio, embora se contradizendo, impondo com o milagre uma correção à Sua própria Lei, efeito do capricho duma vontade desordenada inadmissível na perfeita organicidade do universo. Este Deus pode operar graças à vontade, fora da lógica e dos justos equilíbrios do merecimento. Ele é respeitado não pela Sua inteligência, justiça e bondade, mas porque está armado de punições infernais eternas. Isto revela o homem primitivo que não raciocina, não age por convencimento porque compreendeu, mas só pelo terror do seu prejuízo. Este homem não pode ser dirigido pelos caminhos duma inteligência que ele ainda não desenvolveu, mas só pelo temor do mais forte: temor que gera o desejo de escapar à força de Deus. Eis então que Ele se tornou um pobre ser, enganável com astúcias, susceptível de ser amansado com sacrifícios, ofertas e preces.
Ninguém pode sair da sua forma mental e conceber mais do que a sua ignorância permite. Se a psicologia do homem é a de subjugar o fraco e enganar o simplório, e se não possui outro cérebro senão este, como pode ele compreender que Deus está completamente acima desta forma mental? Outro Deus representa para ele um inconcebível. De tal cérebro humano, filho das necessidades da vida material e feito para resolver os problemas desta, não podia sair outra concepção a não ser esta. O homem comum pensa: quem é o mais forte seja também o mais perigoso, porque a experiência com a qual ele construiu a sua forma mental lhe ensina que quem tem o poder nas mãos costuma fazer dele um uso egoísta, só para a sua vantagem e o dano dos outros. Os chefes que o homem conhece na Terra são, na maioria dos casos, dominadores que escravizam e exploram os seus súditos. Os cidadãos, por experiência milenária, consideram os governantes como patrões, seus naturais inimigos, como o é cada dono para o seu criado. Então é dever defender-se, é mérito e valor usar a inteligência não para obedecer, mas para torcer tais leis inimigas, a elas escapando com a astúcia.
Eis o que está no cérebro do involuído. Mas logo que se desenvolver um pouco a inteligência, aparece o absurdo de tudo isto. Deus não é de maneira nenhuma um chefe desse tipo, Ele não domina para escravizar e explorar as Suas criaturas, as Suas leis são sábias, e benfazejas, obedecer a elas não é dano, mas vantagem. Tal Deus é muito inteligente, justo e bom. Pode-se falar com Ele, porque sabe bem compreender, e o homem honesto nada tem o que temer Dele. Ele não está morando nos céus qual soberano no meio da Sua corte, olhando de longe para o nosso inferno selvagem só para receber na Sua glória egoísta as nossas humildes homenagens. Mas Ele está sempre presente, vivo entre nós operando ao nosso lado, tomando parte na vida e nas dores dos Seus filhos; não precisa de ministros e intermediários hierárquicos para nos comunicarmos com Ele, e quando falarmos de coração aberto e tivermos o ouvido bastante sensibilizado para ouvir a Sua voz profunda, Ele responde, dizendo-nos coisas maravilhosas, bem diferentes das que dizem os homens. Descortina-se então um mundo novo, que a Terra não conhece e onde tudo é claro, justo e bom, duma sabedoria e duma beleza indescritíveis. Aparece então todo o absurdo da corrente concepção de Deus, pela qual não se pode chegar à obediência a não ser pelo caminho do terror, como exigem os selvagens, enquanto, pelo contrário. é vantagem e festa tornar-se, mesmo que seja em medida mínima, conforme as próprias forças, operários colaboradores de Deus na grande obra da evolução redentora da criatura decaída.
Se o homem concebe tudo às avessas, isto é devido ao fato de que ele está situado no AS. E a sua posição de emborcado que o leva a imaginar um Deus emborcado, que domina à força, que faz mau uso do Seu poder, nos atormentando com punições dolorosas, enquanto a causa dos nossos sofrimentos não é Deus nem a Lei Dele, mas a nossa desordem e desobediência a Ele e à Sua Lei. Deus não pune. Somos nós que nos punimos a nós mesmos. Somente nós que estamos no AS podemos fazer alguma coisa de negativo, que vai contra a vida e a nossa felicidade. Representa o maior absurdo acreditar que alguma coisa desse gênero possa sair das mãos de Deus, que existe no S, representando o centro de toda a positividade. Mas quem está situado no AS não pode conceber tudo o que se encontra perfeitamente lógico no S, senão emborcado no absurdo de que está feito o AS. Tal é a lógica do AS, a lógica do absurdo. E é lógico também que a lógica do AS não possa sei. senão a lógica do absurdo.
Eis a ética atual e as suas bases psicológicas. O tipo de ética que aqui explicamos é diferente. Nela não há lugar para enganos. Encontramos finalmente uma ética sem escapatórias. Ela é sincera, evidente, claramente demonstrada. Nela funciona em toda a hora e lugar, automática e infalível, a justiça de um Deus, que não é fruto pequenino da forma mental do homem, mas está bem acima de nosso mundo, porque junto de Sua bondade. Deus é tão inteligente que não há astúcia humana que O possa enganar. Embora o primeiro desejo do homem seja o de aproveitar-se da bondade alheia, porque a julga fraqueza, Deus tudo isto previu e arrumou as coisas de maneira tão justa e perfeita, que Ele pode continuar infinitamente bom, sem que por isso seja possível aos seres inferiores explorar esta Sua bondade. Pelo contrário, como estamos demonstrando neste livro, substancialmente vigora uma lá de justiça, soberana e absoluta, pela qual tudo volta à fonte que o gerou e quem faz o mal o faz a si mesmo.
Quem entendeu a lógica e a técnica desse fenômeno sabe uma grande verdade que o mundo não conhece, ignorância que lhe custa caro, isto é, que fazer o mal nunca pode levar à própria vantagem, mas só ao próprio dano; sabe que querer ser astuto para lograr a Deus, significa só querer ser astuto para intrujar a si mesmo. Perante tal sabedoria da Lei as armas humanas da forca e da astúcia não têm poder algum. Finalmente a Lei corta as garras à fera e a justiça triunfa. Os inferiores podem gerar o inferno só para si. Que Deus se possa enganar é um absurdo em que só o involuído na sua ignorância pode acreditar. O que de fato vigora na substância é a lei do merecimento. Isto quer dizer o triunfo da sinceridade. bondade e honestidade, qualidades hoje tão desvalorizadas em nosso mundo que, seguindo a Lei do mais forte, as considera quase imperdoáveis fraquezas de doentes. Este é um Deus em que se pode confiar porque dá prova de ser de fato invencível, mais inteligente, cuja Lei não pode ser torcida: pode-se acreditar Nele e segui-Lo porque Ele sabe garantir a vida a quem segue a Sua Lei, que o inundo julga loucura; pode-se segui-Lo em segurança porque Ele é inviolável justiça que tudo retribui segundo o merecimento.
É interessante observar a técnica dessa luta em que, contra a força e a astúcia do homem, vence a sabedoria e a justiça de Deus. O ponto fraco do método do homem é a sua posição emborcada de cidadão do AS. Ele é forte e astuto, mas o seu egocentrismo separatista o expulsa do terreno do S, que é o do conhecimento, e o deixa isolado na sua ignorância. E no fundo dessa sua ignorância ele continua acreditando saber tudo. A revolta, filha do egocentrismo, significa orgulho; e o orgulho tira a visão. Mas, apesar de cego, o homem se julga bem apto a dirigir-se. Isto o faz um alucinado que acredita nas ilusões do mundo, nas miragens criadas pelos seus desejos, pronto a cair em todas as armadilhas de que o seu ambiente terreno está cheio.
É o exagerado crescimento do "eu", é o orgulho deixando-o acreditar que bastam a força e a astúcia individual para vencer, sem levar em conta o fator merecimento. Mas só este pode constituir os alicerces firmes da construção de nosso destino e posição na vida, porque só o merecimento representa o verdadeiro valor. Apoiando-se sobre estas bases certas, respeitando os princípios de equilíbrio e ordem da Lei, qualquer posição pode resistir, porque é real e não arrancada com a força ou fingindo fruto de mentira.
Sabemos que esta ética não pode satisfazer os fortes e os astutos do mundo, ser compreendida e aceita por eles, Mas somente pelos maduros que a merecem Nada se pode ganhar de graça e os que não fizeram o esforço necessário para subir, têm de ficar em sua ignorância, com erros e sofrimentos, até ter aprendido toda a lição, Seria fácil demais resolver o problema da evolução e salvação só porque alguém nos explicou o método com palavras. Os mestres ensinam, mas nós mesmos temos de fazer o trabalho de nosso amadurecimento, temos de aprender à nossa custa pagando as conseqüências dos erros para não cometê-los mais. É assim que os fortes e os astutos ficam surdos aos conselhos, e, acreditando saber tudo, não querem abrir os olhos para ver e, como é justo, ficam imersos no inferno que merecem. Acontece então que todos encontram no mesmo ambiente terreno as mesmas oportunidades e os mesmos perigos, mas cada um escolhe segundo o seu tipo, assim revelando a sua natureza e acolhendo as conseqüências que merece. E lógico que quem entendeu o jogo das ilusões da vida não cai mais nelas. É justo que quem tem cobiça seja por ela atraído e caia nos perigos e que os que não têm cobiça os evitem, porque isto é o que cada um merece e porque é bom que quem não sabe, aprenda.
Assim quem ainda não subiu tem de subir. Quanto mais o ser se encontra atrasado em baixo na escala evolutiva, tanto mais para ele a lei é a forca. Mas quanto mais ele progride, tanto mais esta se transforma em justiça. Assim à lei do "eu" separado e rebelde, se substitui a lei do "eu" organizado e disciplinado. A primeira é a dura lei do AS, a segunda é a do S. Tudo isto também é lógico e justo, e corresponde ao merecimento. Para quem com o seu esforço subiu, acima de todas as prepotências humanas funciona uma lei de justiça, que ninguém pode torcer ou enganar. Se o passado e o presente pertencem ao mal, por lei de evolução o futuro pertence ao bem, que não pode deixar de ser o vencedor final. Das profundidades da vida responde uma voz que satisfaz a procura desesperada dos honestos em busca de justiça. Esta voz nos diz que há para todos uma lei de justiça à qual ninguém pode escapar, torcendo-a ou enganando-a.
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Eis o conteúdo deste novo tipo de ética. Finalmente ao trabalho milenário do homem para torcer e adaptar as verdades eternas aos seus instintos inferiores e para enganar a Deus escapando às suas leis, é possível hoje contrapor uma concepção diferente da vida. em que o jogo contra a Lei é um absurdo anti-utilitário, perigoso e contraproducente. Finalmente um lugar onde há justiça, onde é possível ser sincero e honesto sem ter de pagar caro por isso. Finalmente alguém em que se pode confiar e colaborar com amizade, um amigo que ajuda e não um todo-poderoso que vive só para si, contra o qual teríamos que nos defender. Finalmente um Deus inteligente, não apegado à forma, mas que compreende a substância, que vive ao nosso lado, luta e sofre conosco, que com justiça imparcial é vencedor absoluto dos maus onde quer que eles estejam, sem favorecer grupo algum para condenar todos os demais. Caem assim as barreiras interesseiras humanas: cada um é julgado não pela sua posição terrena, mas segundo o que ele é e merece, e os maus ficam maus e pagam, e os bons ficam bons e recebem, qualquer que seja a sua nação, grupo, partido ou religião.
Deus não é chefe desta ou daquela hierarquia religiosa. por ela monopolizado, armado contra os deuses de todas as outras religiões. Ele é universal, abraça todos, sem preferências e exclusividades; usa a Sua Lei e medida igual para todos. e não uma para um grupo e outro para os demais. Sua justiça está acima de todas as injustiças humanas. é universal e não particular; é amiga de todos os justos e não somente dos seguidores de um dado grupo. considerados bons, e inimiga dos seguidores de outros grupos. somente por isso considerados maus. Acabe-se com essa psicologia animal de vencedor e vencido, pela qual tudo o que o primeiro faz está certo, e o que o derrotado faz está errado!
Encontramos nessa ética uma verdade firme, positiva. acima da luta, dos poderes e dos enganados do mundo. Ninguém lhe escapa. Não adianta possuir comando de grande chefe, recursos econômicos, força bélica ou política, nem ser massa de povo que, representando à maioria, faz o que quer. Não há como fugir. As nações têm de pagar como os indivíduos. Ninguém pode fazer o mal impunemente. A Lei é um torno de ferro que nos prende a todos, nos aperta dentro do canal das conseqüências das nossas ações, ao longo da linha dos efeitos que têm de amadurecer, sem distância de espaço ou de tempo que os possa parar. Cada um tem de colher o fruto do que semeou. Têm de pagar os grandes os pequenos os homens de todos os partidos ou religiões. É a derrota dos finórios do mundo, contra os quais se levanta a lei do merecimento. O mundo quer outras verdades, em função dos seus interesses. Mas aqui encontramos uma verdade mais profunda que ninguém pode abalar.
Eis a ética por nós sustentada. Ela representa uma revolta à revolta, uma reação contra o AS, para voltar ao S. Isto significa trabalho de retificação para chegar à salvação. Procuramos aplicar à ética o método positivo da lógica, para convencer os que sabem pensar, oferecendo um produto de razão iluminada e não dos instintos do subconsciente.
Estamos percorrendo o caminho da reconstrução. Com a revolta, o "eu" da criatura (menor), que no S existia em função de l)eus (maior), quis realizar o absurdo que Deus (maior) existisse em função do "eu" da criatura (menor) . Esse absurdo, isto é, que o maior possa existir em função do menor, constitui o ponto fraco do AS, o que nos garante a vitória final do S. Esse contraste, que lemos agora observado entre dois tipos de ética, expressa em nosso pequeno mundo a cisão e a contraposição dualista entre S e AS. Também o AS tem a sua ética, que é a do mundo. E nós sustentamos, em contraposição a ela, a ética do S. Ora, se a vitória do S está garantida, o mesmo acontece com a ética. Isso significa que ela está destinada a vencer a do mundo, que com o tempo terá de ficar abandonada nos níveis inferiores da evolução.
Essa nova ética não é novo invento, porque, na substância, não é senão a do Evangelho. É, porém, um Evangelho racionalmente demonstrado, compreendido na sua lógica férrea e profunda, e sobretudo tomado a sério para ser vivido e não somente pregado. E é lógico que o Evangelho se encontra na linha que vai para o S. Esta ética não pode então deixar de repeti-lo. Ele, porém, aqui adquire outro sentido e importância. Ele se universaliza, sai dos limites de urna religião e se torna lei biológica, psicológica social, entrando no terreno positivo da ciência, que não poderá mais como até agora, afastar o problema como o seu agnosticismo. Assim entendida, a doutrina de Cristo não é somente produto histórico, fruto de uma casta sacerdotal, bastando pertencer a outra religião ou ser ateu para não ter mais valor; ela é fruto vivo da vida em evolução, fenômeno sempre presente e atual. O Evangelho expressa uma lei biológica que terá fatalmente que se realizar no futuro. Trata-se de princípios universais, em que neles, acima de tudo, o homem pode acreditar, pensar e realizar-se. São princípios que permanecem independentes de sua aceitação e que ninguém pode alterar ou destruir.
Trata-se de uma ética universal, hoje vigorante na Terra, como caso particular no tempo e no espaço. Nem ela é concebida como fenômeno estático, mas em evolução, como é tudo o que existe no relativo. A ética do mundo é então relativa e progressiva e, no seu estado atual, representa apenas um nível de vida ou degrau da escada de subida que do AS vai para o S.
Assim se deslocam as nossas concepções comuns da ética. ‘Ela se torna um momento do fenômeno do transformismo universal. É assim que, como já mencionamos, cada plano de vida tem a sua ética diferente. As feras têm a sua ética que não é a do homem. Este tem a sua ética que não é a do super-homem. Dessa forma, desde os mais baixos níveis que se abismam no AS até aos mais altos que S levantam para o S, a ética, concebida no sentido mais vasto, de ordem e regra que dirige a vida do ser, se vai transformando, assumindo qualidades diferentes conforme a sua posição mais atrasada ou adiantada ao longo do caminho da subida, ou regresso do universo decaído para Deus. Eis então que a vemos tornar-se tanto mais determinística e compulsória quanto mais o ser que ela rege se encontra em baixo, perto do AS; e tanto mais livre e convicta, quanto mais o ser que ela rege se encontra no alto, perto do S. Fenômeno que tem a sua lógica e razão profunda.
Não foi Deus quem tirou a liberdade do ser, quando este involuiu pela revolta. mas foi o próprio impulso do ser que tudo emborcou; por ter iniciado um caminho às avessas, não pôde deixar de tudo emborcar, inclusive a sua liberdade na escravidão do determinismo, que é o seu oposto - A vontade do ser rebelde era de destruir a Lei para se lhe substituir - Mas ela estava acima de toda tentativa de destruição - Aconteceu então que o ser conseguiu só emborcar a sua posição dentro da Lei e relativamente a sua liberdade. Todavia a Lei ficou de pé, mas para o ser não se conservou jia forma livre do S, e sim na forma compulsória do AS. Tanto mais o fenômeno ocorreu, quanto mais o ser se aprofundou no AS. Eis a lógica e a razão desse fenômeno.
Tornou-se assim constrangimento á força o que antes era livre aceitação. O ser pôde transformar a ordem em caos no AS, mas além deste a ordem ficou íntegra para lhe impor o regresso do caos à ordem, deterministicamente, impondo ao rebelde louco a sua salvação. Não se pode admitir o absurdo de um Deus vencido pela Sua criatura, a parte ser mais poderosa do que o todo, uma revolução que pudesse sobrepor-se ti Lei e destruir a obra de Deus -
Esse fenômeno se explica também como o lato de que com a queda e involução a linha da livre expansão do ser se foi sempre mais curvando sobre si mesma, o seu dinamismo se foi contraindo numa cinética sempre mais apertada em si mesma, até atingir a forma de movimento fechado nas trajetórias do átomo - Os seus elementos não podem sair delas, escravos completos das leis da matéria. Esta é a sua ética, obediência forçada no AS, nos antípodas da obediência livre dos espíritos no S. Os cristais têm de orientar as suas moléculas e moldar as suas formas conforme modelos exatamente pré-estabelecidos. Esta é a sua ética. No mundo inferior da matéria não se concebe desobediência. Ninguém pode desobedecer à Lei, isto é, a Deus. A obediência se realiza sempre: no AS como no S, mas no AS às avessas, sem liberdade. Assim o resultado automático da revolta foi para o ser ficar aprisionado no determinismo. No homem, que está subindo ao longo do caminho da evolução, há liberdade, mas limitada e logo que cometer erros, serão sempre corrigidos à força pela dor. Permanece a regra geral: perde-se toda a vantagem, logo que se fizer mau uso dela. Quem quer emborcar, acaba emborcando. A violação da Lei gera dor.
Tudo se vai transformando com a evolução. Quanto mais o ser sobe na escala evolutiva, tanto mais o determinismo se abranda e suaviza, tende a desaparecer, reabsorvido na liberdade que sempre mais se amplia, se expande e prevalece, à medida que o ser se avizinha do seu estado de origem. A planta se liberta mais do que o mineral, o animal mais do que a planta, o homem mais do que o animal. independência e amplitude de movimento cada vez maior, da água dos mares à superfície da Terra, á atmosfera com o vôo, e agora no mundo planetário. O homem possui urna vastidão de escolha que os animais regidos pelo instinto não conhecem, mas isto só na sua parte mais adiantada, a espiritual, enquanto nele sobrevivem os determinismos, que ele tem de aceitar, dos mundos inferiores (estrutura atômica e molecular na parte mineral, o metabolismo no nível vegetal, os instintos no nível animal). A grande liberdade começa a aparecer só em cima no espírito, gradativamente, em proporção ao desenvolvimento deste, tanto mais quanto mais o ser se aproxima do S. Como a nossa ética e mais adiantada que a das feras, assim a do homem de amanhã será mais adiantada que a do homem de hoje, que as gerações futuras julgarão selvagem, como nós julgamos os nossos antepassados das épocas primárias . Quanto mais o ser sobe, tanto mais ele se torna consciente e com isso cada vez menos coupulsoriamente e mais livremente obediente à Lei. Assim se vai transformando essa ética universal do seu ponto mais baixo no AS, até ao seu ponto mais alto no S. Não é estranha essa maneira de conceber a ética, porque tudo o que existe está fundido em Deus numa só Lei unitária.
Chegamos assim ao conceito duma ética cósmica, em que se revela a presença universal da Lei de Deus, ética que nos seus níveis diferentes sustenta, em todos os seus andares, o edifício do ser, regulando a existência e dirigindo a evolução para reorganizar o caos na ordem. Ela representa a assistência contínua de Deus, no Seu aspecto imanente, ao lado e em favor do ser para que ele siga o caminho fatal de sua salvação. Ética viva, inteligente, sempre em ação. Ela dirige o contínuo transformismo do relativo, operando pouco a pouco, tudo disciplinando, para reconduzir o caos ao estado orgânico do S. Neste tudo estava a devida ordem. Se a revolta tudo deslocou na desordem, é por esse caminho que tudo vai voltando àquela ordem. Os egocentrismos separados, filhos da revelia, têm de fundir-se para colaborar em unidades coletivas sempre maiores até reconstruir a organicidade do Todo, voltando ao S.
Ética estupenda que desce do infinito e do absoluto. Ela expressa a suprema vontade de ordem contida na Lei de Deus. Ética global, presente em todos os níveis da evolução, em formas diferentes, cada uma adaptada à posição de cada ser. Temos assim diversas formas de manifestação da ética: atômica, molecular, celular, dos grupos celulares reunidos em tecidos, de cada órgão, para cada organismo no seu conjunto, do sistema nervoso e cerebral, dos sentidos, psíquica, espiritual, reguladora da ordem de uma determinada unidade. Assim todo os seres, caminhando na grande marcha da evolução, são orientados para um objetivo único, e embora adaptando-se às exigências de cada caso particular do relativo. a Lei, dirigindo-os todos por um mesmo princípio, os leva para a unidade.
Agora na Terra está nascendo a nova ética social, internacional, mundial, que terá de reger em unidade o novo organismo coletivo da humanidade. Se a ética do homem primitivo do passado teve de basear-se no princípio da seleção do mais forte, que 1eva à agressividade e à luta, e se ao ter usado essa ética o homem atual deve o fato de ser o vencedor, dono do planeta, eis que hoje os objetivos que a vida tem de atingir são diferentes e por isso tem de mudar- a ética que dirige a conduta do homem. Assim apareceu a civilização com as suas leis civis e religiosas, e com isso uma nova ética, pela qual furtar e matar, que no mundo selvagem eram virtudes do mais forte, são pelo menos em alguns casos oficialmente reconhecidos como culpa e crime. Isto porque a humanidade começou a encaminhar-se para o estado coletivo social orgânico o da convivência pacífica na colaboração. A humanidade, sem dúvida, está atingindo um novo plano de existência, com a mudança das regras que a dirigem: ética diferente, porque tem de atingir finalidades mais adiantadas, sendo necessário conquistar outras qualidades com outras normas de conduta. Eis por que o Evangelho que as representa não tem, como há pouco dizíamos, somente um significado religioso, mas também social e biológico. Está sendo construída hoje a nova unidade coletiva constituída pelo estado orgânico da sociedade humana, fato que requer uma nova ordem e uma nova disciplina de cada indivíduo em função do interesse comum: conceitos antes desconhecidos e contraproducentes, hoje úteis e que por isso se valorizam, virtudes novas, mas adiantadas e inteligentes, que tomam o lugar das velhas, da força individual, desorganizada e destruidora, velhas virtudes superadas, socialmente negativas e criminosas, inadmissíveis nas novas condições de vida
Ética diferente, em função de outras finalidades a atingir, porque a vida nunca pára no seu trabalho de construção e agora quer levantar um outro andar do seu edifício e levar o homem para um mais alto plano de existência regido por leis diferentes, que têm de sobrepor-se ao passado, até apagá-lo. Assim o método da luta entre egoísmos separados se tornará cada vez mais antivital e por isso condenado e repelido como desordem perigosa dentro da harmonia da nova ordem, dentro da qual é vantagem e interesse de todos ficar unidos em colaboração. A evolução progride pelo caminho da organização em unidades coletivas, cada vez mais vastas e complexas, dos seus elementos. O ponto final desse caminho é o estado orgânico completo do S, que abrange em unidade fundida em Deus todos os seres do universo O período da descida foi uma queda no separatismo, ou pulverização da unidade do S, num caos desordenado de elementos, no AS. O atual período de subida é representado por um inverso processo de reunião e fusão dos elementos separados, no originário estado orgânico do S. A humanidade não pôde deixar o caminho da evolução universal e agora tem de galgar um novo degrau em sua escada ascensional.
Eis a razão positiva pela qual chegou a hora do Evangelho, razão também científica, porque ele representa a lei biológica no novo nível evolutivo que o homem agora tem de atingir. O Evangelho é exatamente a lei do "ama o teu próximo", isto é, da convivência pacífica, da colaboração, do altruísmo que funde os egocentrismos rivais até agora em luta. O biótipo, modelo da raça, julgado o melhor, será quem tiver perdido as qualidades desagregantes do involuído egoísta de hoje, as virtudes da fera, substituindo-as pelas do homem civilizado.
E para explicar esse fenômeno e orientar o homem neste sentido, obedecendo às leis da vida, que aqui estamos falando no momento histórico e~ que a evolução está amadurecendo os novos destinos da humanidade. Tudo está pronto para se realizar, e se realizará esse novo destino, logo que a inteligência humana se desenvolver bastante para chegar a compreender.
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Uma das características da ética deveria ser preventiva e não repressiva. É inútil chegar depois que o mal foi feito. Uma ética eficiente previne e evita o mal, impede que ele se realize, mais do que reprimi-lo depois com a punição. E o que acontece no S, onde a Lei estabelece qual tem de ser a ordem, os seres compreendendo e obedecendo, e o mal não se verificando. Estamos no terreno da positividade, onde não há lugar para nenhuma forma de negatividade: o mal e a sua punição e repressão. Aqui tudo está previsto e prevenido e naquela ordem a desordem não pode nascer.
Nós existimos nos antípodas, no AS, onde prevalecem princípios opostos. A mesma Lei de Deus irradia do S para o AS, aqui também presente, impulsionando para a sua ordem, mas o biótipo que aqui mora é um rebelde, que quer impor a sua vontade contra a da Lei e, apesar de ser à sua custa, pode fazê-lo, porque ele é livre. Estamos aqui no terreno da revolta, da desordem e da luta. Só o fato de que este é o tipo de ética vigorante em nosso mundo, constituiria uma prova bastante para demonstrar a teoria da queda.
Nós explicamos assim, porque a nossa ética não é filha da compreensão que espontaneamente evita o mal, mas é filha da luta; em vez de ser uma ética positiva, altruísta e educativa, cujo objetivo é realizar o bem, é uma ética negativa, egoísta e defensiva contra o prejuízo do grupo. Vemos aqui revelarem-se os dois métodos opostos: o do S e o do AS. A nossa ética é também educativa ma na forma emborcada que revela a posição do rebelde do AS, isto é, educativa não a priori, mas a posteriori, deixa o mal acontecer e depois intervém para corrigi-lo . Em outras palavras: para respeitar a liberdade de um ser rebelde, lhe é permitido errar e depois endireitar o erro por intermédio da dor. E é lógico que no mundo do AS, emborcado na negatividade, não haja outro caminho para chegar ao bem, a não ser o da dura lição de sofrimento.
Os seres do S ficaram inteligentes como Deus os criou compreendem que é a sua vantagem permanecer na ordem em obediência à Lei. Os seres do AS com a queda se tornaram ignorantes, o que lhes deixa acreditar que é vantagem existir em posição emborcada na desordem do caos . Mas a Lei continua firme em sua vontade de ensinar, o que neste caso é ainda mais urgente porque se trata da salvação de criaturas extraviadas. Como é possível ensinar a seres ignorantes, incapazes por isso de compreender onde está a sua vantagem e o seu bem‘? Como é possível ensinar-lhes senão por intermédio do sofrimento? É a única coisa que conseguem entender, porque aparece depois do erro, como sua conseqüência, para ensinar a não cometê-lo mais.
Eis a razão pela qual a ética humana é ética a posteriori e não a priori, como a lógica exigiria. Mas tratando-se de um S emborcado no AS, é lógico também que no AS vigore uma lógica emborcada no absurdo. Dada a sua posição o biótipo comum não pode aprender a regra certa da vida, senão pelo caminho do sofrimento. E é o que de fato acontece. Na lógica emborcada do AS, este absurdo é perfeitamente lógico. Explica-se assim a técnica da tentativa, vigorante em nosso mundo; técnica de cegos ignorantes A automática condenação para os cidadãos do AS está no fato de que eles não podem chegar à positividade a não ser pelo caminho de negatividade, isto é, à felicidade, senão pelo caminho do sofrimento. Assim o homem tem de aprender à força a ética da sua salvação, constrangido pela dor a seguir a vereda que o leva para a felicidade, que ao mesmo tempo representa o seu maior desejo. Eis em que estranho jogo de absurdos se emborca a lógica do S quando o ser cai de cabeça para baixo no AS, constrangido à força a atingir a realização do seu maior anseio: a felicidade, que o ser vai invocando e procurando desesperadamente, mas que a cegueira em que ele decaiu lhe impede de ver onde o seu alvo está situado! Mas tudo é absurdo enquanto o ser usa a psicologia do AS, mas volta a ser lógico, tão logo seja visto e julgado com a psicologia do S. E de fato a dor corrige o erro, ensina e ilumina a consciência, destrói a ignorância e reconstrói a sabedoria, reabsorve a negatividade do AS e reconstitui a positividade do S. Eis a razão profunda dessa estrutura e técnica, a do erro e sofrimento, com a qual a Lei se realiza em nosso mundo; eis a lógica fatal dessa ética a posteriori, corretiva e não preventiva, como a vigorante em nosso mundo.
Tudo o que existe na Terra assume as qualidades do AS. E por isso que aqui vigora não uma ética interior, mas exterior, não de dentro para fora, porque o ponto de partida é o espírito do S, mas de fora para dentro, porque o ponto de partida é a matéria do AS. Não urna ética de substância, mas de forma, não regra de pensamento, mas de atos, não urna ética baseada nos princípios gerais que orientam nas grandes linhas, respeitando a liberdade de quem compreende, mas uma ética apoiada sobre particularidades materiais, amarrada aos pormenores farisaicos, constrangendo quem não merece liberdade, porque não sabe e não quer compreender.
O deslocamento do S para o AS tudo transformou. Aqui, como prova da verdade dessa teoria, vemos os efeitos vigorantes no mundo humano. Eis então que, enquanto no S, porque o sei é obediente, tudo é livre e espontâneo, no AS, porque o ser rebelde, tudo é constrangimento à obediência. Isto é o que a criatura gerou com a sua revolta. A Lei ficou inatingível, acima de toda revolta e o ser rebelde ficou preso dentro dela, nem pode fugir. Logo que ele se arrisca a fazê-lo, a tentativa gera a dor que o paralisa. Quanto mais ele procurar rebelar-se, tanto mais a dor o aperta, até que ele tem de desistir. De fato quem vai chocar-se com as reações da Lei? São os indisciplinados. Para os que obedecem e a seguem ordenadamente, a Lei não reage. Ela então fala somente da bondade de Deus. Para quem quer ficar dentro da ordem, tudo corre bem. São os desordenados que recebem de volta o choque que eles pretendiam lançar contra a ordem. A Lei não agride a ninguém, mas quer ficar íntegra, de pé, e responde com a mesma agressividade, de quando a sua ordem for agredida por uma vontade de desordem.
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Para encerrar este assunto, observemos, em resumo, outras qualidades principais que caracterizam esta nova ética. Já lhes tocamos rapidamente, para uma primeira orientação geral do leitor, no início do Prefácio, no fim da Introdução e na metade do cap. III deste volume. O assunto foi desenvolvido, não como teoria geral da ética, mas de outro ponto de vista, mais fácil e prático em nosso livro: A Lei de Deus, que contém uma série de vinte e quatro palestras que proferi na Rádio Cultura de S. Vicente no ano de 1958, publicadas também no Diário de Santos. Aqui completamos estes conceitos, os reunimos e resumimos, para concluir
Tal ética é teórica e prática ao mesmo tempo, no sentido que, enquanto ela se justifica até às suas primeiras origens porque as suas raízes se encontram nos princípios do S que regem a criação, tal ética se realiza até às suas últimas conseqüências práticas dentro do AS, em nossa vida de cada dia. Ética completa porque vai do S ao AS, do absoluto de Deus ao relativo da criatura, e assim tudo abrange de um ao outro pólo ao existir. Ética universal porque contém todos os tempos, todos os planos de evolução, todas as éticas relativas; universal porque colocada no quadro geral do todo, desde as primeiras origens até atingir as últimas finalidades e a conclusão da obra de Deus. Ética máxima porque na sua substância coincide com a Lei de Deus, e ao mesmo tempo mínima porque rege o universo até aos seus mínimos pormenores.
Porque está escrita na Lei de Deus, que está acima de todas as divisões do relativo, essa ética é verdadeira para todos, acima de todos os partidos e religiões, independente da orientação e posição étnica, política, filosófica ou religiosa do sujeito. Ética verdadeira porque imparcial e positiva, não mais empírica concebida em função do homem, moral biológica, concebida cm função das leis da vida, da evolução e do funcionamento orgânico do universo. Ética à qual não se pode fugir, só pelo fato de ser descrente, cético ou ateu materialista. Não adianta negar, rebelar-se, pensar e agir com outra psicologia. A Lei continua funcionando igual para todos. Ela vence os vencedores do mundo, porque é mais poderosa e inteligente do que a força e a astúcia deles. Ela sabe se fazer compreender por todos, também pelo tipo involuído e ignorante, porque fala a linguagem da dor, linguagem que todo homem compreende, qualquer que seja a sua raça, nível social, crença ou forma mental. A cada erro segue automaticamente a dor corretora, pela qual cada um tem de se corrigir à sua custa. Trata-se de uma lei que está dentro da substância das coisas, sempre funcionando, que ninguém pode agredir e destruir, inatacável porque invisível, indestrutível porque inatingível. Ela constitui a essência do ser e este não a pode aniquilar, sem com isso ter de se aniquilar a si mesmo.
Trata-se de uma ética racional, que não se baseia no princípio de autoridade, mas na lógica e na demonstração das razões pelas quais é nossa vantagem obedecer. Sem mistérios são oferecidas as provas do motivo por que se afirma, porque temos de operar duma forma e não de outra, se explicam e justificam as conseqüências necessárias e inevitáveis de cada ato nosso. Assim ela é também uma ética utilitária, porque impõe virtudes que levam ao bem e à felicidade de quem as pratica, deste modo não oprimindo. mas reconhecendo o direito à vida e à expansão.
Ela é uma ética objetiva, impessoal, que está acima dos instintos e forma mental da qual depende a ética comum, ética da própria vida e não só em função do homem e do momento histórico; não ética subjetiva, pessoal, relativa ao tempo e a quem a definiu para o seu uso, seguindo os seus gostos, os não controlados irracionais impulsos do subconsciente, seja do legislador, seja da massas, que para si estabelecem verdades pelo direito da maioria.
Chegamos assim, como já foi anunciado em A Grande Síntese (caps. LXXV e LXXXVI), a uma ética cientificamente concebida em forma exata, não só racionalmente demonstrada e positivamente acertada e controlada, baseada na lógica dos fatos, mas geometricamente representável e matematicamente calculável, porque suscetível de expressão gráfica dos fenômenos da ética em forma de linhas e de campos de forças. Isto nos permite, como já mencionamos (no fim da Introdução) medir o valor quantitativo e qualitativo dos diferentes impulsos do ser, e das correspondentes reações da Lei, como também a extensão das superfícies dos campos de forças cobertos. ou volume do dinamismo conquistado pela positividade ou negatividade na luta entre S e AS no caminho evolutivo ou involutivo. A ética, assim, pode ser estudada como um momento vivo do grande fenômeno do dualismo universal, como um dinamismo de contínuos choques, isto é, ações e reações entre os dois termos opostos ( + e - ) do Todo, isto é: a Lei e o ser rebelde, o S e o AS. Ética sólida, como um teorema de geometria. A novidade está no fato de se mostrar a possibilidade de se aplicar os métodos científicos exatos à ética de estudar e definir os movimentos dos seus impulsos, com a aplicação dos processos da matemática no cálculo dos seus valores.
Esta é a ética que aqui oferecemos. a moral da qual o homem moderno precisa (proporcionada ao seu atual merecimento); ética séria, a única que os inteligentes, pela sua forma mental crítica e positiva, podem aceitar; moral prática, razoável, honesta, utilitária, que calcula com justiça e por isso convence, que dá o que promete e de tudo explica o porquê, a razão pela qual nos convém obedecer, e o bem que temos o direito de receber em troca do sacrifício que ela nos pede. Ética evidente, onde tudo está claro, porque cada um pode calcular o efeito dos seus pensamentos e atos. Ética justa, que nos devolve o que lhe apresentamos, conforme o que merecemos, premiando os justos e golpeando os injustos com a dor e a desilusão. Elas se explicam como conseqüência lógica e automática do caminho errado, para a negatividade, que o ser toma quando desobedece à Lei. Tudo isto é implícito e fatal, pela própria estrutura de todo o fenômeno do universo.
O que oferecemos neste livro é somente um esquema dessa nova ética, apresentada nos seus elementos básicos, quanto basta para uma orientação geral que permita depois o assunto ser desenvolvido e os princípios gerais serem aprofundados nos seus pormenores, submetidos a cálculo matemático e à medição exata dos valores e das suas transformações.
Entraremos nestes capítulos cada vez mais no terreno específico da ética, para estabelecer as suas bases positivas. Tivemos de nos afastar do assunto central da figura, demorando em problemas colaterais e exemplos demonstrativos, porque este era trabalho útil para esclarecer e compreender melhor o tema fundamental.
Uma vez estabelecido o jogo da ação do ser contra a Lei, e da reação da Lei contra o ser, isto é, do erro e da dor, o problema da ética aparece por si mesmo, como norma de conduta indispensável para evitar esse choque, filho da revolta, conduzindo tudo para a ordem da Lei. Esta é a gênese, o ponto de partida e a finalidade da ética.
Antes de penetrarmos ainda mais no estudo da técnica do fenômeno do erro e sua correção pela dor, será útil resumir brevemente o assunto, esclarecendo melhor o significado destes conceitos e definindo o valor destes dois impulsos opostos que entram em choque. O problema, assim observado de novos pontos de vista, nos poderá aparecer sob novos aspectos. Voltamos às vezes ao mesmo assunto, embora isto possa parecer repetição, quer porque não podemos evitar que em última análise o assunto seja ‘sempre substancialmente um só – o do nosso universo, seja porque nunca há verdadeira repetição pelo fato de que não se pode deixar de dizer á mesma coisa de modo diferente, que a explica melhor, nem se pode deixar de acrescentar alguma observação que ilumina o assunto com uma nova luz, que no-lo esclarece sempre mais em todos os seus aspectos.
Um dos efeitos da revolta foi a queda do estado orgânico do S no estado de separatismo do AS. A unidade se pulverizou em muitas unidades menores. Nasceram assim os “eus” não mais fundidos em unidade orgânica, mas separados uns dos outros, em posição de antagonismo, como os encontramos nas diferentes individuações de nosso universo, entre as quais a personalidade humana. Nestes níveis inferiores, próximos do AS, vigora o princípio do egocentrismo e do separatismo, que o encontramos em nosso mundo, Esta é a razão pela qual este é regido pela lei da luta. É por isso que o homem, por sua natureza, é espontaneamente levado a agredir tudo para subjugar, para que vença somente o seu "eu".
Que acontece então quando o homem se encontra perante, a Lei? Ele, pelo seu método, entra em choque com tudo, porque não quer colaborar, mas só subjugar e dominar, Enquanto ele fica imerso no seu nível, este método pode ser útil para superar os seres do seu mundo. Mas quando, com este sistema de agressividade pelo triunfo apenas do seu “eu”, o homem enfrenta a Lei, a viola rebelando-se, então ele, com a sua conduta excita uma automática reação em forma de dor, da qual não há força que permita e o faça fugir. É assim que se realiza a ação saneadora por meio da dor, porque o homem, realizando as suas experiências, vai aprendendo pelas reações dolorosas que recebe, e com isso, adquirindo uma sabedoria que lhe ensina a não mais se rebelar, ou seja, a não mais se desviar por meio do erro fora do caminho certo da Lei. A dor existe como método de ensino e educação na escola dos primitivos.
Os involuídos são ignorantes porque, decaindo no AS, perderam a luz da inteligência, que é qualidade das criaturas da S. Ora, para ensinar aos ignorantes não se podem usar os meios duma inteligência que eles não possuem. Por isso é necessária e aparece a dor, porque este é o único raciocínio que eles podem compreender. Não há outro meio para que na forma mental. de um rebelde possa entrar o convencimento de que o caminho da desobediência não representa uma vantagem, mas é prejuízo, não leva à felicidade, como só um emborcado na lógica do absurdo pode acreditar, mas de fato leva à dor. O ser ignaro, por falta de conhecimento, vai experimentando ao acaso, por tentativas, de todos os lados. E para ele aprender o caminho certo, é necessário, todas as vezes que entrar na porta errada, ser repelido para trás, porque ao invés de encontrar a almejada felicidade, encontrou a dor. Até ele, pelo muito experimentar, descobrir a porta certa e entrar nela. Isto se verifica quando o ser, cansado de todas as experiências realizadas no terreno do AS, desiludido por não ter aí encontrado a felicidade, acaba apercebendo-se de que esta é inatingível no AS. Então é constrangido a procurá-la alhures, com uma fuga do mundo inferior que o traiu. Inicia então uma nova tentativa em direção diferente, evadindo-se nos céus, isto é, em superiores níveis de evolução. Verifica-se assim o fenômeno da sublimação dos instintos e aparece o homem superior e o santo. Quando o homem tiver assimilado todo o fruto da sua escola terrena, então não será mais ignorante e tão simplório que vá de encontro à Lei, errando, mas pelo contrário se terá tornado inteligente, e por isso acabará com a loucura de cometer erros, de modo que não receberá mais o seu efeito, que é a dor.
Esse choque entre tais impulsos opostos nos mostro de um lado a loucura do homem que quer procurar a felicidade, onde é absurdo que ela se encontre, e de outro lado a sabedoria da Lei. que usa a dor como meio seguro para que o ser compreenda qual é o caminho para atingir essa fe1icidade. De um lado é lógico que o ser, porque é um revoltado, seja levado a percorrer o caminho às avessas. De outro lado é lógico também que a Lei, sábia e boa, o endireite com o único meio possível a dor, deste modo dirigindo-o para o único caminho que leva à felicidade, Dada a estrutura do sistema do universo, é absurdo que esta possa ser encontrada pelos caminhos da revolta à ordem de Deus, enquanto é lógico que, procurando a felicidade no AS, isto é, às avessas, com a revolta, em vez da obediência, não se possa encontrar senão o oposto, isto é, uma felicidade, emborcada, o que quer dizer: a dor .
Esta é a estrutura da lógica desse jogo entre os dois impulsos opostos: o erro, da parte do ser, e a dor da parte da lei. O se! está livre de movimentar-se à vontade, mas só dentro das paredes da gaiola de ferro que é a Lei. Ele, com a sua experimentação, livremente. tem de aprender a dirigir-se com exatidão, sem fazer movimentos errados que o levem a bater a cabeça contra as paredes. Se age em harmonia com a Lei, tudo corre bem, sem choques, Mas se vai contra Ela, eis que se realiza o atrito que se chama dor. Quanto maior for a desobediência do ser e o seu desvio fora da ordem, tanto maior será o oposto impulso da reação da parte da Lei, na forma de dor, para restabelecer o equilíbrio. Quanto mais baixo o nível evolutivo do ser e mais rebelde ele é contra a ordem, tanto maior é a reação da Lei, para que tudo volte à ordem, Tudo automaticamente se equilibra em perfeita justiça.
O ser está livre e pode cometer à vontade todo os erros que quiser. A eles, porém, segue a dor que queima, Fica assim a regra absoluta à qual. ninguém pode fugir, e o ser não deseja cair na dor. logo ele tem de aprender e seguir as normas da boa conduta. O S é como um grande relógio que funciona com perfeição, porque cada roda está no seu devido lugar funcionando em devida ordem. O AS é um relógio cujas rodas se deslocaram emborcando os seus movimentos, numa desordem que gera atrito, isto é, dor. Para sair desse estado de sofrimento, o ser tem, com o seu, esforço, de eliminar os atritos que o geram, e, para eliminar os atritos, é necessário reordenar toda esta desordem, colocando cada coisa no seu devido lugar e aprendendo a movimentar-se ordenadamente. Este duro trabalho lhe pertence, porque foi ele que com a revolta gerou a desordem. Os seres são as rodas do relógio que saíram de posição e se atritam, gerando dor que não pode acabar enquanto não voltar ao seu lugar de origem, para funcionar em ordem.
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Podemos agora compreender quais são as primeiras origens e as causas profundas do fenômeno da dor. Quando falamos que a Lei reage contra o rebelde, só usamos uma imagem antropomórfica que facilita a compreensão do homem, que concebe em função do seu instinto de luta para dominar. A Lei não é um “eu” livre e pessoal que queira dominar sobre alguém, mas é uma vontade determinística e impessoal que automaticamente exige a realização dos princípios que a constituem. Por isso não há lugar para a idéia de que exista na Lei uma específica vontade inimiga, de vingança contra o ser, porque ele errou, de ofensa e reação punitiva no sentido humano. Tal idéia é fruto da forma mental do homem que concebe tudo à sua imagem e semelhança. A Lei não odeia e não pune, mas só restabelece equilíbrios quando eles são violados, A Lei é somente um absoluto e universal princípio de ordem, que tens de se realizar, regendo o funcionamento de todo fenômeno.
Dada essa estrutura da Lei, há efeitos necessários, já marcados com antecedência, que têm de se verificar como conseqüência de cada movimento, conforme sua natureza. Não se pode negar o fato de que vemos a Lei de ordem reagir e aparecer a dor quando violamos a ordem. Mas se olharmos melhor, veremos que quem gera a fricção, que é sofrimento, quem com a sua ação errada movimenta a reação da Lei e estabelece a forma e medida dessa reação, é o ser com a sua revolta. A reação da Lei é apenas uma resposta automática, determinística, que se pode calcular com antecedência, como estamos fazendo neste volume: uma resposta que, apesar de bem ativa em sentido contrário, parece passiva, porque ela obedece ao impulso do ser e nada, por si mesma, inicia ou provoca. A Lei quer somente permanecer em sua ordem, reconstruindo os equilíbrios violados. Fora disso ela existe para permanecer imóvel em sua perfeição e nada mais exige, até que a vontade livre do ser gere impulsos contrários que querem deslocar os seus equilíbrios. Quando do isto acontece, a Lei simplesmente os reconstrói. Se isto implica dor, esta pertence ao ser que quis deslocar os equilíbrios, O seu trabalho e a função da dor é que ele aprenda a não deslocá-los mais.
A Lei é um perfeito organismo de ordem que ninguém pode violar. Ela é toda positiva, afirmativa. Nela não existe a cisão dualística dos contrários, não há lugar para a negatividade. Se, saindo da ordem, com o erro, geramos um vazio de negatividade, com isso movimentamos os impulsos reequilibradores da Lei, que têm de encher esse vazio, e eles o fazem na única maneira possível, isto é, à nossa custa, tirando de nós e reabsorvendo o que nós furtamos àqueles equilíbrios. Então a positividade tem de ser reconstituída com o nosso esforço e dor, porque se trata de um nosso débito para com a ordem e temos que lho pagar .
O problema está todo aqui: a Lei é ordem e ninguém pode mudar este fato. O ser quis substituir esta ordem, por outra sua oposta, a do AS, que para a Lei do S e desordem, e continua repetindo esse mesmo motivo toda vez que comete um erro desobedecendo à Lei. Eis como nasce a luta entre os dois princípios opostos, e a encontramos no humano egocêntrico instinto de revolta. Em que está a origem da dor. Ela e gerada pelo contraste e atrito entre a vontade da Lei e essa outra vontade de desordem da parte do ser. O que leva ao constrangimento a que ele, da parte da Lei, está submetido, para que à força volte à ordem. Tudo isto é dor porque, se para a Lei do S a revolta foi emborcamento, para o ser rebelde criador do AS a retificação para o S representa a negação da sua afirmação, o emborcamento da ansiada revolta e a destruição da sua construção: o AS.
Eis a íntima técnica do fenômeno erro-dor. O ser no caso maior da queda e em todos os erros menores repetidos por ele, não é ferido pela Lei, mas pela própria vontade de ferir a Lei. Esta nunca age em sentido destrutivo e não faz nada contra o ser: só lhe devolve o seu impulso destruidor, deixando-o ricochetear para trás, em sua direção, ao invés de absorvê-lo. como o quereria. A completa positividade do S constitui uma barreira insuperável para que nela seja possível qualquer penetração de negatividade. Mas é exatamente pela completa positividade do S, que nada de negatividade pode sair da Lei, isso prova que a negatividade recebida como reação da Lei, não provem dela, pois não é senão o que o ser lançou contra ela, isto é, a sua própria negatividade. No S não há, nem pode sair dele, tudo o que seja mal, agressividade, dor, negatividade, qualidades exclusivas do AS, filhas da revolta. É importante compreender este conceito, porque ele nos mostra como conseqüência que a causa primeira dos nossos sofrimentos está em nós e em nossa conduta errada, e não está na Lei que nos responde sempre benfazeja, reconstituindo para o nosso bem os equilíbrios violados. Nós inculpamo-la porque ela faz isso à nossa custa, com a nossa dor. Mas a Lei não pode deixar de ser justa. Exigir o pagamento da parte de quem está culpado, faz parte dos seus invioláveis equilíbrios. Explica-se assim como, no terreno da ética, foi possível chegar à conclusão que quem faz o bem, como quem faz o mal, acaba fazendo-o a si mesmo.
Temos à nossa custa de compreender que, levar a desordem da desobediência para dentro do organismo da ordem da Lei, é o maior absurdo, que só um ser ignorante pode conceber. Revolta ou não, não há coisa que não fique contida na Lei de Deus. O ser rebelde não construiu para si outra lei, mas somente se colocou em posição emborcada dentro da organização perfeita do S e dos princípios da sua Lei.
Chega-se deste modo a um resultado que pode parecer estranho, em que se conciliam duas posições que parecem inconciliáveis: a Lei permanece perfeitamente justa, enquanto o ser recebe a sua punição. Ele cai na dor sem que possa inculpar senão a si mesmo. Nada do mal que a revolta produziu pode atingir Deus e a sua Lei, mas fere quem foi a causa desse mal. Triunfa assim a bondade de Deus, que não nos deixa no sofrimento, senão para nos corrigir a fim de atingirmos a felicidade. Triunfa a justiça de Deus que não deixa a dor atingir senão quem a mereceu. Não é necessário que Deus se torne mau para que Sua justiça seja feita; a dor ministra a sua lição, fazendo com que tudo, respeitando-se a liberdade do ser, seja ao mesmo tempo deterministicamente retificado para a salvação. Quando erramos, Deus não nos pune, lançando--nos no inferno por Ele criado para se vingar das ofensas recebidas. Essa psicologia é do homem, não de Deus. Mas a Lei está construída de tal maneira que, quando erramos, com isso nos punimos a nós mesmos, lançando-nos no inferno que, para nós, a nossa desordem criou na feliz ordem da Lei. É pela nossa ignorância que assim ocorre, o que é justo, porque a ignorância é fruto merecido da revolta que destruiu a sua qualidade aposta, a inteligência, que é característica do S. Não podemos deixar de ficar admirados perante tanta sabedoria, e é agradável contemplar a perfeição da Lei que, soberana sempre triunfa de tudo.
O único resultado que o ser podia atingir e atingiu, foi a efetivação, somente para si mesmo, do princípio da desordem e da luta que o atormenta. Dada a estrutura da Lei, a revolta, desde o inicio, não podia ser senão uma derrota, e o rebelde senão um vencido. Isto fazia parte da própria lógica do S, em que não pode haver possibilidade que Deus seja vencido. Se houvesse, Deus não seria mais Deus.
Pelo contrário, o que sempre vemos triunfar é a sabedoria Dele. Esta se revela também na revolta, apesar de poder parecer um erro e um defeito do S. A revolta gerou ignorância, luta, sofrimento. Mas eis que por este caminho emborcado a Lei sabe atingir o objetivo oposto, e com seus meios sabe realizar o endireitamento, porque com a experimentação na luta e na dor, desenvolve e reconstrói a inteligência. Assim a Lei destrói a ignorância, causa de tanto mal, acabando com o sofrimento, porque o rebelde chega a compreender que a causa das suas dores está na desobediência e que não há outro caminho que conduza à felicidade que não seja o da obediência na ordem. É assim que, pela sabedoria da Lei, o caminho da perdição, iniciado pelo ser rebelde, tem automaticamente que se endireitar dentro do caminho da salvação. Seja no caso maior da queda e grande ciclo involutivo-evolutivo, ou, no que já estudamos, erro-dor, a sabedoria da Lei, substituindo ao mal o bem, continua sempre corrigindo e reconstruindo, lá onde o ser errou e destruiu.
Aquela sabedoria nos mostra que, com a revolta, surgiu não somente o modelo do fenômeno da queda, mas também do endireitamento-sa1varção, que o corrige. Esse segundo modelo estava implícito no primeiro, contido, latente, à espera de tornar-se atual, logo que o ser apertasse o botão da revolta. E já noutro lugar observamos que o universo, assim como, mais de perto de nós, a natureza, funcionam por repetição dos tipos de fenômenos ou modelos que antes construíram, e que depois voltam como hábitos adquiridos, e assim continuam ecoando em série na economia do todo. Podemos por isso considerar o caso erro-dor, que aqui estudamos, uma repetição menor do modelo do fenômeno da revolta-endireitamento ou queda-salvação, que estabelece a estrutura do objeto de nossas pesquisas atuais. Eis que, antes de enfrentar o estudo do fenômeno erro-dor, dele possuímos, no ciclo queda-salvação, o esquema fundamental, e aqui o vemos repetir-se nas suas características fundamentais.
Como no ciclo involutivo-evolutivo o ser está constrangido a voltar para o S para fugir aos sofrimentos que encontrou no AS, assim no deslocamento de ida e volta do fenômeno erro-dor, o ser está constrangido a voltar para a Lei pela dor, que não pode terminar até que tenha acabado todo o trabalho de recuperação. Em ambos os casos vigora a mesma lógica pela qual não se pode fugir aos efeitos do mau funcionamento da máquina, até que seja eliminada a causa que é a desordem. Para quem sai do caos não é fácil funcionar organicamente na ordem. Com o seu esforço o ser tem de reconstruir a sua inteligência, a qual é necessária para chegar àquele funcionamento. Ele quer fugir a este esforço, mas não pode, até que, com a sua dura experiência, conquiste de novo a inteligência perdida; ele, com seus movimentos errados, continuará chocando-se com a Lei e recebendo dor. Para afastar-se do inferno do AS e atingir o paraíso do S, há só um caminho: o da evolução. Quem não quer com a sua luta ir para a frente e subir, tem de ficar no sofrimento. Se o ser quer libertar-se da dor, tem de reconstruir para si a ordem que destruiu.
O binômio erro-dor é um momento do dualismo universal em que, com a revolta, se despedaçou a unidade do todo. Não existe mais uma felicidade duradoura em posição estável de equilíbrio, mas felicidade instável, porque fruto desequilibrado de deslocamentos contínuos no sentido do erro, depois corrigido pela dor.
Eis de onde nasceu essa oscilação erro-dor, que caracteriza a nossa vida. No reino da revolta, carregado de negatividade, não é possível um tipo de felicidade contínua, toda positividade, mas só temporária, dívida a pagar, sempre misturada com o seu termo oposto (AS) no dualismo, isto é, a dor.
Se esta oscilação erro-dor representa os contínuos deslocamentos dum estado de desequilíbrio, a Lei esta. no meio para equilibrar a cada passo a balança e restituir tudo à ordem conforme a justiça. Quando funciona o erro (revolta), a agulha da balança se desloca para a esquerda, no sentido da negatividade. Quando funciona a dor (em obediência), a agulha da balança se desloca para a direita, no sentido da positividade, assim corrigindo e equilibrando o deslocamento oposto. É lógico então que, quanto maior for o erro e seu deslocamento para a esquerda, tanto maior terá de ser a dor, isto é, o deslocamento para a direita. A medida da dor é estabelecida pela medida do erro. Quanto mais o ser com a revolta se afasta da positividade e se aprofunda na negatividade, tanto mais cai no sofrimento e maior será o trabalho necessário para sair dele. É o homem que, com a sua conduta errada, determina a quantidade das suas dores. Nisto ele está totalmente livre, dono de sofrer à vontade. Mas ele, porque filho do S, não gosta de sofrimento, e isto é o que constrange o ser para a sua salvação. Ele, livremente, não pode deixar de cumprir o duro esforço da subida, porque se não o fizer, terá de sofrer até o fim do seu resgate.
Se o erro representa o afastamento da positividade para a negatividade, é lógico que, quanto maior for o erro, ou o afastamento da positividade para a negatividade, tanto maior terá de ser o caminho a percorrer da negatividade para voltar à positividade. É lógico também que, como e a negatividade da revolta que destrói a positividade da obediência à Lei, assim e a positividade da obediência que neutraliza a negatividade da revolta e recupera o que foi perdido. É a Lei quem tudo domina e, a respeito dela, é negatividade a revolta que afasta e destrói, e é positividade a dor que de novo aproxima e reconstrói. Eis o valor e o significado ao qual está confiada a função da reconstrução dos equilíbrios deslocados. Eis como a dor corrige o erro. Neutralizando o efeito do erro, ou seja a dor, ela não somente corrige o erro, mas destrói-se a si mesma. Com o seu funcionamento ela se consome, se autodestrói, se elimina como negatividade, deixando o lugar livre para o seu oposto, a positividade da alegria. É assim que se realiza, automática e fatal, a correção do caso particular, a qual no conjunto leva à salvação final. Foi-nos possível aqui contemplar a maravilhosa sabedoria da Lei que se revela neste jogo de equilíbrios entre opostos, e que no contraste entre impulsos contrários chega a reordenar a desordem, por choques compensados que, quer seja repelindo, quer seja atraindo, sempre impulsionam o ser para a sua salvação.
A revolta foi o erro maior e a evolução representa o esforço maior que o ser tem de cumprir para corrigir aquele erro. A dor é o peso que o ser tem de carregar, percorrendo todo o caminho da subida, e só esse peso de um lado pode equilibrar o outro prato da balança saturado de erro. A evolução corrige a involução, a dura obediência corrige a louca desobediência, a culpa tem de ser reabsorvida pelo sofrimento. Cada afastamento da linha da Lei gera uma carência de positividade, um vazio feito de negatividade que é necessário encher de novo, se não quisermos ficar para sempre nesse estado, que e dor. Esta nasce da exigência de satisfazer essa carência, de saciar o pedido desse abismo esfaimado de equilíbrio compensador. da sua negatividade em que a vida morre. Por isso a dor, no organismo universal, representa a função da recuperação, um meio de salvação. Tivemos que explicar tucano isto, porque só assim e possível compreender a função benfazeja da dor, o seu valor positivo, o único que lhe podemos atribuir num sistema perfeito que tem de ser o de Deus, regendo o universo. O mundo concebe a dor em sentido oposto, como empecilho ao invés de uma ajuda, como um inimigo, não como um amigo; e isto porque o ponto de referência do homem não e a Lei do S, mas o seu “eu” rebelde. Esta maneira de conceber às avessas prova que o homem em relação à Lei vive em posição emborcada, à espera de ser retificada pela evolução.
Eis o sentido deste jogo de contradições e compensações entre os doiS OPostos, erro e dor, que vamos estudando sempre mais de perto. Por isso chamamos a este volume de: Queda e Salvação, Por isso vemos estes dois elementos contrários e complementares correr um atrás do outro, inimigos abraçados e indivisíveis, em contínua luta um contra o outro só com o fim de colaborarem juntos para reconstruir a unidade despedaçada, ponto de partida e de chegada do imenso ciclo da queda e salvação.
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Vamos explicando estas verdades tão vivas e tão pouco conhecidas, que tanto nos tocam de perto e que tão pouco levamos em conta em nossa conduta, mas das quais, se errarmos, temos depois de pagar as duras conseqüências. Não há, quem não tenha reparado que na solução dos acontecimentos de nossa vida há uma parte que escapa ao nosso conhecimento e vontade, e que obedece a outras forças e leis, que chamamos de imponderável. Um imponderável bem ponderável nas suas conseqüências, porque resolve contra os cá1culos humanos, de modo diferente do que pensamos e queríamos. Qual é o conteúdo desse misterioso imponderável? Esta outra inteligência e vontade, que está. alem do conhecimento e vontade do homem, é a Lei. Se o homem conhecesse a Lei, não haveria mais para ele imponderável. Ele está imerso nesta Lei, que é um mundo de forças poderosas que tudo dirigem para as suas finalidades bem definidas, forças que reagem contra quem faz movimentos errados violando a sua ordem, forças contra as quais o homem, pela sua ignorância e espírito de revolta, se vai chocando a cada passo, para depois ter de pagar. Eis como aparece o binômio erro-dor.
Que acontece então? É lógico que o homem procure a sua vantagem. Mas os sentidos que o guiam podem facilmente enganá-lo a respeito da sua vantagem, e dirigi-lo para um bem-estar imediato que representa um prejuízo futuro. O fato é que o homem não sabe qual é a sua verdadeira utilidade, que em geral não é a imediata que ele escolhe porque é mais visível, mas sim uma outra, a longo prazo; nem sabe qual é o caminho para atingi-la. Então é facílimo que ele escolha o caminho errado. Acontece assim que ele, ao invés de ir ao encontro da Lei para que esta venha ao seu encontro, ele vai de encontro à Lei, de modo que esta reage contra ele. A Lei não permite ser torcida e opõe resistência quem não segue a sua vontade e corrente de forcas. Essa resistência contra o ser que quereria subjugá-las em favor do seu “eu”, é o que chamamos a reação da Lei. Esta é como a corrente dum rio, que representa um impulso para que tudo avance na sua direção. Como tudo o que existe, nós estamos nesse rio – a Lei.
O resultado de tudo isto é que, se o ser seguir os impulsos da Lei acompanhando o seu caminho, esta o envolve em sua corrente e com isso o ajuda. Mas se, pelo contrário, o ser quer seguir somente os seus impulsos, com outra vontade para outro caminho, eis que a Lei com a sua corrente contrária resiste, não o ajuda, mas o arrasta e persegue, porque a vontade dela é que tudo avance para os seus objetivos. Muitas vezes o sucesso é devido ao peso de uma série de circunstâncias que em concordância obedecem a uma vontade que nos favorece, sem que ela seja a nossa. Isto nos escapa no que chamamos de imponderável. Mas o imponderável é a Lei, e a sua vontade é a sua corrente, que nos ajuda quando seguimo-la. No caso oposto muitas vezes o fracasso é devido ao peso de uma série de circunstâncias que, de acordo umas com as outras, obedecem a uma vontade que está contra nós, até vencer a nossa e todos os nossos esforços. Eis aí o outro imponderável tremendo, que se manifesta como um fardo, dirigido pelas mãos de Deus. Esse imponderável é sempre a Lei, essa vontade inimiga é a sua corrente, que contra nós se rebela, e recebemos de volta o que semeamos. É essa nossa revolta que automaticamente nos condena ao fracasso. Então o imponderável, isto é, a Lei, ao invés de nos salvar, nos arruina. Explicam-se assim muitos fracassos de indivíduos, como de acontecimentos históricos, de outro modo inexplicáveis.
Tudo isto se refere ao nosso tema atual, o do fenômeno erro-dor. A tentativa do ser de procurar a sua utilidade contra a corrente da Lei se chama: erro. O impulso da Lei para reconduzir o ser dentro da corrente e com esta levá-lo para a sua salvação, contra a sua vontade que quer o contrário, produz o atrito que se chama: dor, (o peso do imponderável). A causa é a ação do ser. A reação da Lei é o efeito. É lógico que o tamanho do efeito seja proporcionado ao da causa, isto é, que a medida da dor seja estabelecida pelo homem com o seu erro. É lógico que, quanto maior for o erro, isto é, o impulso do ser contra a corrente da Lei, tanto maior será a sua resistência e se manifestará o impulso contrário para arrastar o ser em sua direção. Esta imagem da corrente e, dentro dela, a vontade, contrária do ser, nos oferece uma idéia bastante clara do que significa a reação da Lei.
De tudo isto se segue que, quanto mais formos a favor da corrente da Lei, tanto mais fácil será o nosso caminho, aquela corrente nos ajudará e por isso sairemos fortes; e ao contrário, quanto mais nos rebelarmos à corrente da Lei com as nossas tentativas de desvio, tanto mais difícil será o nosso caminho, porque na corrente contrária encontraremos, não ajuda, mas resistência, o que nos levará não para o sucesso, mas ao fracasso. Quanto maior for o nosso erro, tanto mais seremos vulneráveis e fracos, e tanto maior será a reação da Lei contra nós e por isso padeceremos o contraste de nossa amargura. A desordem gerada pela vontade do ser é proporcional ao impulso corretor da Lei, para reconduzi-lo à ordem. A esta ele terá de voltar, porque quanto mais se afastar da Lei, maior será o seu esforço para vencer a corrente contrária, com isso gerando atrito e sofrimento. Assim, par um automático jogo d forças, o ser ficando livre, não pode deixar de voltar à corrente da Lei, renegando e reabsorvendo o seu próprio impulso de rebelde, porque é este impulso o que gera a sua dor, que não acabará de atormentá-lo até que ele tenha tudo pago e voltado à ordem em obediência à Lei.
A conclusão é que, pela própria lógica de todo o processo, a dor é destino dos rebeldes, enquanto e a própria Lei que com a sua corrente leva os que a seguem para o sucesso final. Então o segredo do sucesso está em conhecer a Lei e em lhe obedecer. Mas como pode fazer isso o homem que, por ser ignorante, não conhece a Lei, e por ser filho da revolta, é levado à desobediência? Este mundo para ele é um mundo de forças desconhecidas, que ele chama de imponderável, como se fosse alguma coisa de irreal, que lhe escapasse, fora da vida, enquanto é o imponderável a causa primeira do que depois, na sua fase de efeito, se torna bem ponderável. Eis como o mundo vai amontoando erros em cima de erros, e tudo tende para o fracasso. É assim que, tudo funcionando contra a corrente da Lei, às avessas, não se pode recolher a não ser desilusões e sofrimentos.
Trata-se de forças sutis, contra as quais a prepotência do homem nao tem poder algum. Elas trabalham no íntimo das coisas, de dentro para fora e não de fora para dentro, como acontece no mundo. Elas agem lentas e constantes, despercebidas na superfície, escapando aos nossos sentidos, tudo construindo e aumentando em nosso favor, da profundeza para cima, coma nossas amigas, porque navegamos obedientes à corrente da Lei; ou tudo roendo e consumindo em nossa perda, elas operam como nossas inimigas, porque navegamos rebeldes, contra a corrente da Lei.
Os nossos olhos não percebem o movimento do sol. Mas vemos que ao por-se, ele deu a volta a todo o céu. Assim em nossa vida os acontecimentos amadurecem por pequenos deslocamentos imperceptíveis que, quando movidos por um impulso constante numa dada direção acabam traduzindo os efeitos gigantescos de uma avalanche. A vida se constrói com a soma de instantes com que se fazem minutos, com que se fazem horas, com horas dias, com dias meses e anos, com anos vidas inteiras, séculos e milênios etc. No tempo vigora o mesmo princípio das unidades coletivas que vigora no espaço, princípio pelo qual partículas elementares se juntam para construir o átomo, átomos para formar a molécula, moléculas para formar células, e depois órgãos, organismos, famílias de seres, cidades, nações, humanidades; da mesma forma que as moléculas da matéria constróem jazidas geológicas, planetas, sistemas solares, galáxias e sistemas galácticos etc. Assim em todos os campos cada elemento menor, associando-se com outros iguais, constrói uma unidade coletiva maior, que por sua vez, jungindo-se a outras iguais, forma outra unidade coletiva ainda maior, e assim por diante.
Assim cada unidade resulta constituída pela junção de tantas menores partículas elementares; e, seja no espaço como no tempo, se organiza conforme o mesmo modelo de agrupamento de elementos por ritmo de ciclos, em que a confederação as unidades menores edifica a unidade maior. É, deste modo que como no espaço se organizam os planetas, os sistemas planetários, solares e galácticos, e no terreno da vida os grupos humanos, até a humanidades e sistemas de humanidades, assim o desenvolvimento dos nossos destinos se realiza pelos deslocamentos mínimos de cada minuto, que juntando-se produzem deslocamentos de horas, dias, anos, séculos, sempre maiores, tudo ordenadamente segundo um ritmo de ciclos menores incluídos em ciclos maiores, estes em outros ainda maiores, até se cumprir o destino maior do ser, que é o da queda e salvação.
Criados pela corrente da Lei, cada deslocamento mínimo vai se somando ate produzir um deslocamento maior que, somando-se a outros maiores, gera outro ainda maior etc. Transcorre assim uma quantidade de ciclos miúdos, que constituem os maiores e que, pela sua pequenez, passam despercebidos. Mas não há instante de nossa vida em que um destes deslocamentos não se realize. amadurecendo alguma coisa. Assim por sucessivos movimentos imperceptíveis, do nascimento chegamos à velhice e a morte. Mas no momento nada vemos, tudo parece ser imóvel, como o sol no céu. Porém no fim vemos que tudo mudou, o mundo se transformou, muitos desapareceram e não conhecemos a nova geração, porque nós mesmos nos tornamos diferentes. Uma mudança profunda se realizou, amontoando tantas transformações pequenas mas constantes, dirigidas no mesmo sentido.
Os nossos olhos míopes, a nossa forma mental feita para ver as coisas miúdas da vida, percebem só as linhas deste desenho menor e lhes escapam as do maior, o desenho geral. Ficamos fechados no ritmo pequeno de nossa vida de cada dia. sem nos apercebermos do ciclo maior do qual ela faz parte, Conhecemos bem a volta quotidiana do trabalho, refeições, repouso, do dia e da noite, mas não sabemos para onde tudo isto avança, Vivemos a realização de princípios gerais que nos escapam, efetuamos amadurecimentos que, nos levam para bem longe, atravessando transformações profundas, estamos desenvolvendo o nosso destino, e de tudo isto não vemos senão uma sucessão de pormenores miúdos e episódios desconexos, cujo desenho geral, que constitui a nossa verdadeira vida, nos escapa. Só os evoluídos, que aprenderam a olhar nas profundezas, vivem conscientemente em função dos grandes ciclos da vida, onde mais evidente se revela a presença desses vastos impulsos da corrente da Lei, os que aqui estamos estudando.
Quanto mais o indivíduo é involuído, tanto mais e apertado o círculo dos seus horizontes, é estreita a vista que ele domina e menor é o ciclo de sua vida, que ele conhece e regula. Para os momentos sucessivos ficam separados, colocados um após o outro, sem fio condutor que deles faça uma unidade maior, que os organize dirigindo-os para um objetivo único, os explique e justifique quais elementos de um plano geral que confere outro sentido à vida. É para atingir esse outro modo, mais profundo de concebê-la, que aqui vamos estudando o funcionamento da Lei e as conseqüências de nossos erros a seu respeito. Se nos acostumarmos a ver os acontecimentos de nossa vida não divididos como momentos isolados, cada um separado do outro, mas todos unidos ao longo de um fio condutor que os liga num desenvolvimento lógico comum, nos aparecerá em uma outra vida a longo prazo, em que se torna visível, além dos pormenores do momento, as grandes linhas de nosso destino. Veremos então o que escapa ao homem comum, imerso nas particularidades de sua vida: veremos a presença da Lei e o funcionamento do imponderável, realizando os princípios que aqui sustentamos.
O problema que iremos agora focalizar cada vez mais de perto, não é mais o da grande queda que já estudamos em outros volumes, e que na figura está expressa pela vertical XY; mas é os das quedas menores laterais, que há pouco nos referimos, para observarmos as conseqüências desses afastamentos da linha da Lei, da ética, que estabelece qual deve ser a conduta correta. Estas quedas menores são o que chamamos de erro ou culpa. Podemos agora dar a estas palavras um significado positivo de deslocamento para a desordem, longe da devida posição de ordem estabelecida pela Lei: ordem que a universal lei de equilíbrio impõe seja reconstituída todas as vezes que for violada. Podemos assim dar um valor exato também às palavras expiação e redenção, em função desse processo de reordenação. Revela-se--nos assim toda a valorização da dor, como meio de recuperação e elemento fundamental na lógica do fenômeno da salvação.
Essa linha da ética representa a espinha dorsal do processo de salvação. Este é o percurso dentro do qual está canalizado o caminho da evolução, que o ser tem de percorrer para recuperar o que com a queda perdeu. Todas as vezes que o ser se afastar dessa linha de retorno dirigido para o S, comete erro e terá de sofrer até ser neutralizado, tudo reconstruindo com o seu esforço e sofrimento. Também no processo desses afastamentos laterais, temos uma linha verde de descida para a negatividade, representando o afastamento ou trabalho de destruição; e temos uma linha vermelha, de volta para a positividade, representando a aproximação de retorno ou trabalho de reconstrução. Como a força de atração terrestre constrange tudo a ficar em equilíbrio aderente à superfície do solo, e voltar a ele quando se afasta, assim a Lei, que representa a divina bondade e vontade de salvação, constrange tudo a ficar em equilíbrio aderente à linha da Lei, e a voltar a ela se se afastar.
Essa é a função da linha da Lei. Ela representa um raio do pensamento e da vontade de Deus, que desce no próprio centro do universo dos rebeldes para libertá-los da destruição em que de outro modo acabariam. Além da pequena redenção realizada por Cristo num dado momento em favor de uma das infinitas humanidades que povoam o universo, existe uma redenção muito maior, contínua, realizada por Deus no Seu aspecto imanente, em favor de todas as humanidades e de tudo que existe. Essa maior redenção está expressa na figura pela linha da Lei, YX, que sustenta o triângulo da mesma cor vermelha e sinal positivo, e o respectivo campo de forças que esse triângulo com a sua superfície representa e contém. Ele com a sua base no S e a ponta dirigida para baixo, penetra todo o triângulo do AS até o fundo, como uma projeção da positividade lançada no campo da negatividade, para salvá-lo com o seu impulso reconstrutor do aniquilamento, que seria a conclusão lógica do processo.
Tudo o que na figura é vermelho representa o princípio de positividade do S, a presença de Deus, a salvação. De tudo isto deriva a grande importância de conhecer a Lei, o seu conteúdo, a técnica do seu funcionamento, as normas de ética com as quais ela nos dirige; porque conhecer tudo isto significa ver o roteiro a seguir, e ter nas mãos o leme para dirigir no oceano da evolução, o nosso barco para a salvação. Nós existimos e temos de funcionar dentro dessa grande máquina do universo, e não conhecemos a Lei que a dirige. Assim a nossa conduta é a de um cego ignorante que vai sempre cometendo erro, e jamais acaba de pagar as conseqüências. Quantas dores se poderiam evitar, se o homem aprendesse a movimentar-se com inteligência, dentro dessa máquina, porque ela é dirigida com muita inteligência, a inteligência de Deus! É necessário compreender essa máquina, para funcionar de acordo com ela, em disciplina, e não na desordem, violando-a a cada passo, batendo com a cabeça de encontro às suas sábias resistências. Enquanto não aprendermos a movimentar-nos deste modo, teremos que aceitar a dura lição da dor, necessária para aprender. Não se trata de teorias longínquas, mas dos mais vivos e próximos problemas de nossa existência. Trata-se de conhecer a Lei, o que não constitui só uma grande vantagem, mas também imenso consolo, porque ela representa o princípio do Amor de Deus, que tudo reordena, reconstrói e salva.
Este é o significado da linha da Lei. Ela representa o centro dos fenômenos que iremos estudando. Observaremos o percurso da linha, verde da negatividade que o ser origina lateralmente, quando se afasta da linha da Lei; e depois a linha vermelha do retorno a esta: tudo isto reproduzindo em medida menor o trajeto XY e YX. O processo da queda repete-se nestas menores tentativas da revolta, dirigidas para a construção de menores anti-sistemas laterais, que se constróem e se destroem, se desenvolvem e são reabsorvidos com o mesmo método de ida e volta. Obedecendo ao impulso inicial da desobediência, o fenômeno avança ao longo da linha verde, até que o impulso se esgote. A reabsorção se realiza ao longo de uma paralela correspondente linha vermelha, que representa a correção dos valores negativos e a recuperação dos valores positivos. Na figura podemos controlar o fenômeno nos seus movimentos, posições e medida.
Vemos assim que o nosso erro tenta gerar um pequeno AS lateral, fugindo da linha da Lei YX, como na primeira queda o ser fugiu da linha WW1 do S. E igualmente esse processo tem de ser neutralizado por um equivalente caminho de regresso. O trajeto percorrido na ida pela linha verde lateral, tem de ser compensado por uma proporcional linha vermelha de regresso. Trata-se de um processo menor, dentro do maior da involução-evolução, regido pelo mesmo princípio. Eis por que vemos aqui, novamente, aparecer o modelo dualista da oposição de contrários. Por isso este processo se desenvolve em forma de inversão recíproca, de erro e sua correção. A linha da desobediência sai da linha da Lei, e volta a ela transformada em linha de dor. O movimento que se iniciou com o sinal negativo, volta à fonte com o sinal positivo. O ser adoece para voltar à saúde. É o princípio de equilíbrio que aprisiona o fenômeno dentro do jogo de reciprocidade.
Vemos assim repetir-se os motivos fundamentais do universo até aos últimos pormenores do particular. Isto é lógico. No Todo existia somente o modelo do S, em que existia Deus. Não possuindo a criatura poder de criar, era incapaz de gerar outros modelos; sendo efeito e não causa, ela não podia ser causa de efeitos novos. Tudo o que ela podia fazer era alterar o que já existia. Se o S era tudo o que havia, o que podia surgir era somente a sua negação. Como o S permaneceu o centro de tudo, a negação não pôde seguir outro caminho senão o seu endireitamento para o positivo, isto é, reafirmando o que foi negado. Eis por que no caso ora observado, aparece primeiro a linha verde e depois a vermelha. Aqui também a primeira fase é a da queda, e a segunda é a da salvação. Tudo foi criado de tal modo que, para qualquer acontecimento ou negatividade do ser, nada se perde, tudo se resolve e se redime nos braços de Deus, sempre centro de tudo.
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Analisemos de perto como se desenvolve esse processo do erro e sua correção. Entramos agora no terreno específico da ética, para estabelecer as suas bases positivas. Colocando-nos perante a figura, escolhemos ao longo da linha vermelha YX da Lei o ponto N, situado num dado nível de evolução. Suponhamos que esta seja a posição do ser cujos movimentos agora estudamos, posição intermediária ao longo do caminho da evolução do homem, por exemplo. A linha YN representa o caminho percorrido, a NX o caminho ainda a percorrer. Este é trecho que lhe falta para acabar de cumprir a sua redenção, e ele o deveria seguir porque constitui o caminho direto, o mais curto para voltar ao S. Mas eis que retorna o motivo da revolta, de mo- do que, como uma vez o ser se afastou do S para o AS, agora ele se afasta da linha da Lei. Até que tudo o que pertence ao AS seja neutralizado pela evolução, este impulso secessionista pode continuar ecoando em casos menores, até que tenha desaparecido. No primeiro caso, o da queda, o ser desceu a linha XY e agora tem de subi-la às avessas. Neste segundo caso menor o ser percorre a linha NN1 a do afastamento, para depois ter de seguir a da revolta, N1N. O ponto de partida desse processo é N, onde se manifesta o impulso da revolta. O ponto onde esse impulso se esgota é N1, onde sobre ele leva vantagem a atração da Lei que, por um processo inverso, tudo restaura na sua ordem. Esse é o esquema do fenômeno que aqui estamos estudando.
Temos assim dois momentos ou elementos fundamentais neste processo: o da linha verde NN1, e o da vermelha N1N. Ambas juntas constituem o ciclo completo de ida e volta: NN1N, correspondente ao ciclo completo da queda e salvação: XYX. Trata-se do mesmo processo de emborcamento e endireitamento que, no caso da queda vemos desenvolver-se na figura em sentido vertical de descida e subida, e que neste caso se cumpre em sentido horizontal de afastamento e aproximação. O princípio é sempre o mesmo: um erro devido à vontade da criatura, e depois uma reintegração devida à vontade de Deus.
A expressão gráfica, que na figura demos ao fenômeno, nos ajudará a compreender melhor o seu desenvolvimento. Mas para que tudo seja claro é necessário antes de mais nada estabelecer o valor das palavras e conceitos que usamos, e o ponto de referência em função do qual os usamos. Já tocamos ligeiramente no assunto no Cap. III. Dissemos que o ponto de referência do fenômeno é a Lei. Foi em relação a este ponto que a linha verde do afastamento da linha da Lei tomou o sinal negativo e que a linha vermelha de aproximação a ela tomou o sinal positivo. O primeiro trecho verde é negativo porque nele opera o impulso do ser contra a Lei. O segundo, vermelho, é positivo, porque nele opera o impulso da Lei contra o do ser. Dado que o ponto de referência é a Lei, o sinal negativo expressa o período em que prevalece o emborcamento e a Lei está vencida; e o sinal positivo expressa o período em que prevalece o endireitamento e a Lei triunfa.
A negatividade expressa a atividade destrutiva dos valores positivos da Lei; a positividade expressa a atividade reconstrutiva daqueles valores. Tudo o que na figura tem a cor verde ou o sinal negativo é fruto da vontade rebelde da criatura e se dirige em posição emborcada para o AS. Tudo o que tem cor vermelha ou sinal positivo é fruto da vontade de Deus e se dirige para as posições emborcadas pela revolta, para endireitá-las no S. A nossa figura está concebida em função desse ponto fundamental dc referência que é Deus, o S, a Lei que o representa. É em relação à positividade desse ponto de referência, que todos os movimentos gerados pelo impulso da revolta tomaram o sinal negativo.
Mas é possível escolher como ponto de referência o outro termo do dualismo, que também existe, isto é, não Deus, ou o S, ou a Lei, mas a criatura rebelde, ou o AS, ou anti-Lei. Então tudo adquire um valor oposto, porque está correlacionado não com a positividade, mas com a negatividade. Neste caso tudo o que na figura é positivo, se torna negativo. Por outras palavras, se o ser com a sua revolta quer o contrário do que Deus quer, tudo concebendo com a sua função e não em função de Deus, é lógico que os valores se emborquem, adquirindo o valor oposto. E de fato o homem, doente de antropomorfismo crônico, costuma erguer-se em centro do universo, substituindo o seu "eu" ao de Deus, o que acontece a toda hora e representa a maior prova da teoria da revolta. Tal é o ponto de referência humano e é lógico que seja às avessas, porque o ser que decaiu no AS se encontra em posição emborcada e não pode conceber senão nessa posição, que é a sua forma mental.
Temos então, frente a frente, dois centros opostos, que querem impor-se como "eu" absoluto: o "Eu" de Deus e o "eu" da criatura. A oposição nasceu com a revolta, pela qual o segundo "eu" se mudou da posição de coordenação dentro do S, para a de insubordinação fora e nos antípodas dele.
Ora, se aceitamos como centro o "Eu" de Deus, o fenômeno se nos apresenta na sua posição direta; se aceitamos como centro o "eu" individual da criatura, o mesmo fenômeno, observado do seu pólo oposto, se nos apresenta na sua posição emborcada. No primeiro caso o ponto de partida é X no S, ou N na linha Lei, no segundo caso é Y no AS, ou N1, oposto à linha da Lei. Então, se o ponto de referência é a linha da Lei, a linha NN1 que agora estudamos, é de sinal negativo, e a N1N de sinal positivo; e se escolhemos ao invés como ponto de referência a posição do ser em revolta, a linha NN1 é de sinal positivo, e a N1N de sinal negativo.
É lógico que aqui temos de estudar o fenômeno na sua posição direta, em função de Deus e da Lei, e não em posição emborcada, em função do ser que se faz centro de tudo, com seu "eu" separado e egoísta. A nossa figura foi concebida em relação ao ponto de referência: Deus, ou S, ou Lei. É por isso que a linha NN1 tomou o sinal negativo, e a N1N o sinal positivo. Veremos daqui a pouco o significado prático desses sinais.
Era porém necessário explicar o sentido da posição oposta. Para o ser rebelde a linha NN1 representa o triunfo da sua vontade secessionista, o que para um rebelde é positividade; enquanto a linha N1N representa o triunfo da renúncia à sua vontade na obediência e no dever, significa a penitência do regresso na ordem e no esforço da subida, o que para um rebelde é negatividade.
Cada um dos dois "eu" quer atingir uma plenitude de realização aposta à do outro. O objetivo de Deus é o S, o do ser rebelde é o AS. O primeiro leva o sinal positivo, enquanto o segundo recebe o sinal negativo, na realização do objetivo de cada um. Como duas vontades opostas, o caminho de ida XY ou NN1 vai do + para o -, e é negativo em relação ao S, porque gera o AS : mas também se pode considerar que esse caminho vai do - para o +, e assim é positivo em relação ao AS que nasce afirmativo para o rebelde, porque deseja substituir a ordem de Deus pela sua desordem. E paralelamente o caminho de volta YX ou N1N vai do - para o + e é positivo em relação ao S em que tudo se reconstrói para a salvação do ser, destruindo o AS; mas esse caminho sob o ponto de vista da criatura vai do + para o -, e assim é negativo em relação ao AS, que deste modo morre, negativo para o rebelde que gostaria de se afastar da ordem do S e agora tem de voltar a ela.
Esse jogo de contínua inversão de opostos é devido ao emborcamento gerado pela revolta. É assim que, ao afastar-se do S, tudo em relação à Lei, para o ser, é negativo; enquanto que, em relação a ele próprio, emborca o sinal e se torna positivo. E ao contrário, no caso do regresso do ser ao S, tudo em relação à Lei é positivo; enquanto que, visto em relação a si próprio, emborca o sinal e se torna negativo.
A posição direta em que aqui observamos o fenômeno, escolhendo como ponto de referência a positividade de Deus, é verdadeira e básica, é a predominante. A posição do ser representa somente um desvio lateral, um deslocamento fora da ordem, uma exceção à regra, uma desordem, um erro, infelizmente, porém, é esta estranha posição emborcada a que o homem mais usa. Nós, humanos, estamos mergulhados no AS; somos por isso levados a conceber tudo em função do nosso "eu", usando o segundo dos dois pontos de referência, o que foi efeito da revolta. A nossa posição atual nasceu da vontade de emborcar o S, e representa o antagonismo entre o nosso "eu" e o "Eu" de Deus. O nosso instinto nos levaria a estudar o fenômeno às avessas, construindo uma tábua de valores não em função de Deus, mas do nosso "eu", e dando o primeiro lugar não à ordem do estado orgânico do Todo, mas ao separatismo individualista da vantagem egoísta (a lei da seleção do mais forte).
Se a afirmação de Deus é: "Eu sou o senhor teu Deus (....), Não terás outros deuses diante de mim"1 ; a afirmação do homem é: "Eu sou o senhor de tudo. Não terás outros senhores diante de mim". Afirmação emborcada, que diante de Deus é uma negação. A afirmação do homem é a negação de Deus, como a afirmação de Deus é a obediência do homem. O modelo é só um, e o fenômeno se baseia sobre o processo do seu emborcamento, se o olharmos de cima para baixo, ele toma o sinal +, porque é Deus que afirma. Se o olharmos ele baixo para cima, o modelo toma o sinal -, porque é o homem que nega. Por isso pode parecer que a concepção mosaica de um Deus que quer dominar sozinho, cioso de todos os rivais, seja a reprodução da psicologia de qualquer rei humano, cuja primeira preocuparão é a de defender o seu reino matando todos os rivais do seu trono. Mas isto é lógico, porque o modelo é um só, o do egocentrismo, que com a revolta se tornou em dois pólos, que alternativamente podem funcionar como pontos de referência: o egocentrismo positivo de Deus e o negativo do ser rebelde. O mesmo modelo quer dizer o mesmo tipo de forma mental, que impõe o próprio "eu" ser o centro de tudo.
Agora que temos determinado o nosso ponto de referência, em função do qual foi concebida a figura e agora estudamos o caso dos afastamentos da linha da Lei, é necessário, como há pouco dissemos, definir o valor dos conceitos e o sentido das palavras que usamos. Qual é na prática o significado e conteúdo destes conceitos de positivo c negativo? Eles têm de corresponder a alguma coisa de concreto, que vemos existir em nossa vida, porque o objetivo destas nossas pesquisas é o de estabelecer as normas que a dirigem orientando a nossa conduta. Poderemos assim saber com mais exatidão a correspondência, na figura, da cor vermelha ou verde com o sinal + ou sinal -.
Positividade quer dizer: Deus, ou S, ou Lei, isto é, a vontade que tudo fique na ordem, e o domínio do respectivo impulso de levar novamente para essa ordem tudo o que saiu dela. Negatividade quer dizer: a criatura rebelde, o ser que com a revolta se colocou na posição de egocentrismo oposto ao de Deus. Isto significa vontade de sair da ordem, e o domínio do impulso de sempre mais afastar-se Dele para ficar no pólo oposto, no AS. Veremos assim as duas linhas, a verde, sinal --, e a vermelho, sinal +, sempre contrapostas e compensadas num dúplice movimento de ida e volta, que tudo acaba reequilibrando na ordem.
O fato é que o verdadeiro e fundamental ponto de referência é o primeiro, isto é, Deus. O outro é só pseudo ponto de referência que, por estar no campo da negatividade, não é centro real como o primeiro, nada pode por isso sustentar de definitivo, fora do seu terreno relativo. Por isso a figura nos mostra não somente a contraposição entre a primeira vontade que é de ordem, e a segunda que é de revolta; mas também nos indica que, neste contraste, a primeira acaba vencendo a segunda.
Eis então que positividade, vontade de ordem, significa também impulso para a salvação; e eis que negatividade, vontade de revolta, significa também impulso para a perdição, na qual tudo pereceria se não fosse salvo pelo primeiro impulso de positividade que é o de Deus. Assim a linha vermelha nos expressa, em função do ponto de referência Deus, o que para o ser, contra a sua, vontade que é de revolta, é a linha da recuperação ou vantagem, a da vida, representando o impulso da positividade de Deus contra o impulso da negatividade da criatura que, percorrendo a linha verde da perda, se dirige loucamente para o seu aniquilamento.
Os conceitos de positividade e negatividade são conceitos centrais sintéticos, que em nosso mundo relativo vão-se ramificando no particular periférico analítico, em muitos conceitos menores. Assim os sinais + e - podem ser entendidos de várias maneiras, dando-se-lhes diferentes sentidos e conteúdos. Positividade pode significar não somente Deus, o S, a Lei, a vontade de ordem, o impulso para a salvação, mas igualmente o bem, o Amor, a espiritualização, a linha da correção do erro ou culpa na obediência e na dor que purifica, o caminho de volta e recuperação para a vida, a sabedoria, a liberdade, a felicidade, a perfeição. Negatividade pode significar não somente a criatura rebelde, o AS, o caos, a vontade de revolta, o impulso para a perdição, mas também o mal, o ódio, a materialidade, a linha do desvio no erro ou culpa pela desobediência e pelo gozo desordenado, o caminho do afastamento para a morte, a ignorância, a escravidão, a infelicidade, o estado manco e falho da imperfeição.
Por isso a linha verde NN1 que representa o caminho do afastamento do ser do seu ponto de referência: a Lei, poderemos chamá-la de "linha do erro ou culpa", dirigida para o mal ( - ); e a oposta linha vermelha N1N, que representa o caminho de regresso do ser para a Lei, seu ponto de partida, poderemos chamá-la de "correção na dor", dirigida para o bem ( + ). Na figura estudaremos o fenômeno nesta ordem, isto é, primeiro a linha da negatividade, e segundo a da positividade, porque é a linha verde do afastamento ou perda a que nasce primeiro como filha da revolta, e é a linha vermelha da volta ou recuperação a que aparece depois para corrigir e reabsorver a outra.
Esclarecemos assim o sentido de várias palavras que temos de usar no estudo da ética, tais como: bem e mal, amor e ódio, erro e culpa, obediência e recuperação, revolta e perdição etc.; além das acima mencionadas, outras existem que adquirem um significado exato e profundo, encontrando a sua explicação lógica em função da estrutura do grande organismo do universo e da solução dos maiores problemas do conhecimento.
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Procuremos penetrar agora ainda mais no terreno especifico da ética, que é o nosso objetivo, explicando sempre melhor estes conceitos.
Vimos que o conteúdo da idéia de negatividade é a de erro ou culpa, dirigida para o mal, no sentido de perda, porque é afastamento da linha da Lei, nosso ponto de referência; vimos também que o conteúdo da idéia de positividade é a de correção na dor, dirigida para o bem, no sentido de recuperação, porque é retorno à mesma linha da Lei. O primeiro movimento, sendo do + para o -, vai para a perdição. O segundo movimento, sendo do - para o +, vai para a salvação. Temos assim de um lado os conceitos de erro ou culpa e afastamento para o mal e a perdição. no outro lado temos os conceitos de dor e de volta para o bem e a salvação.
Mas os princípios de negatividade e positividade contêm também outros conceitos e aspectos. Vimos que a Lei reage retificando o primeiro movimento com o segundo, isto é, corrige o erro com a dor. Por quê e como acontece isto? Qual é a mecânica desse processo? Com que técnica se cumpre o fenômeno da salvação ou redenção? Eis o que vamos estudando, com esse conteúdo e objetivo ético: a norma que dirige a nossa conduta, premiando os nossos esforços positivos, refreando e endireitando os afastamentos para o negativo, e sempre nos reconduzindo para o caminho certo da salvação. O ser rebelde é louco. A Lei é sábia. O ser quer encontrar as qualidades positivas nos caminhos das negativas. A Lei, para salvá-lo, o reconduz com a dor aos caminhos da positividade. Esse é o jogo da mecânica da salvação. O ser rebelde quer encontrar a luz nas trevas, mas a Lei o reconduz à luz; quer encontrar a vida na morte, mas a Lei o leva novamente para a vida.
Descemos aqui o terreno das teorias gerais, penetrando sempre mais na prática de nossa vida. Problemas que nos tocam de perto e nos interessam, porque se trata de nosso sofrimento ou bem-estar. Com a revolta o ser foi à procura de felicidade, mas fora da ordem, da regra e justa medida, o que representa um absurdo. É lógico então que, seguindo o caminho da revolta que é emborcamento, o ser encontrasse o sofrimento. Poderia perguntar-se: por que motivo o caminho da volta, reconstrução, é feito de dor? Porque o ser procurou a felicidade, que é qualidade positiva, no terreno da negatividade, com a desobediência na desordem e não com a obediência na ordem, no AS fora do S, isto é, às avessas. É lógico que ele encontrasse felicidade às avessas, isto é, dor. Aqui está a tragédia da revolta. Eis o erro fundamental do ser, o que o fez fracassar no absurdo. Para crescer demais fora da ordem, ele entrou na desordem; para se afirmar além dos limites devidos, entrou a negação. Para se estender além da lei da sua existência, o ser saiu do S, isto é, da positividade e de todas as suas qualidades, e entrou no AS, isto é, na negatividade com todas as suas qualidades. Assim, do bem o ser caiu no mal, da luz nas trevas, da vida na morte, da felicidade na dor etc. Tudo é lógico. Então ele tem de ficar no mal, nas trevas, na morte, na dor, imerso nesse mar de tristeza, até o ter atravessado todo, reabsorvendo a negatividade que passou a ter com a revolta e, assim neutralizando-a, voltar à Lei, reintegrando-se na positividade perdida.
Com a revolta, quis fazer de si mesmo centro e ponto de referência, enquanto o centro só pode ser Deus e nada pode existir senão em função desse ponto de referência. Eis por que com a revolta o ser não podia adquirir senão qualidades negativas. Elas agora são suas e não há outro caminho para libertar-se delas senão a marcha à ré da reabsorção da negatividade e da recuperação da positividade. Para endireitar-se, é necessário que o ser cumpra à sua custa o trabalho de redimir-se e com o seu retorno cumprir, no caminho da fuga da ordem, a fadiga de voltar atrás em disciplina, assimilando a sua culpa. Isto é dor, e eis porque ela adquire qualidades positivas de recuperação. Eis a sua origem, a razão da sua presença, a função que cumpre, o objetivo que deve atingir.
O impulso fundamental do existir é sempre o do S, isto é, positivo, o da própria vantagem. Mas o ser tinha de realizar esse impulso positivo neste sentido, dentro da ordem. O erro do ser foi querer realizá-lo em sentido negativo, fora da ordem, dai o seu dano. Eis por que a linha NN1 a do erro, é também a linha de prejuízo do ser, enquanto a linha N1N, a da dor, é a de sua vantagem. Assim pelo fato de que a linha do erro é a do emborcamento ( - ), e a dor é a do endireitamento ( + ).
Mas as linhas da negatividade e positividade têm também outros significados afins e paralelos. Observemo-las para esclarecer melhor o assunto. A primeira é a linha dos rebeldes, dos criminosos, dos guerreiros, dos chamados fortes que, à disciplina de todos os seres no estado orgânico do S, ao redor do centro único ou "Eu" de Deus, substituíram a revolta na desordem do caos, cada ser por si mesmo, ao redor de tantos pequenos centros ou egocentrismos individuais das criaturas. O método delas nessa sua posição, não é a espontânea colaboração, mas a imposição pela força. Podemos agora compreender por que existe na Terra a lei do mais forte, o que ela significa e por que se pratica esse método de vida. Podemos compreender como o princípio vigorante em nosso mundo, o da luta e da vitória do mais forte, represente um princípio separatista e, por isso, próprio do AS e não do S. Isto quer dizer um estado primitivo, involuído, mais próximo da animalidade que do homem evoluído. Então essa lei biológica não é uma expressão de positividade, isto é, de poder construtor, como se acredita, mas de negatividade, isto é, de poder destruidor; já que é uma sobrevivência de estados involuídos do passado, perante a Lei que quer o evoluído do S e não o involuído do AS, representa não força, mas fraqueza, não virtude, mas defeito, não vitória, mas derrota. O principio da força parece ser de afirmação, mas o é só em função do ponto de referência: homem. Mas isso significa caminhar às avessas, contra a Lei, Perante Deus quer dizer afastamento ao longo da linha do erro.
De fato, o método do triunfo do mais forte leva a ganhar não em sentido positivo, gerando e construindo, para o bem dos outros, o que conduz para o S, mas em sentido negativo, escravizando, destruindo, matando, semeando para os outros, como acontece em todas as guerras, mal e sofrimentos, o inferno do AS. O vencedor não cria nada, mas só ganha espaço vital subtraindo-o aos demais. Tal é o método das rivalidades, oposto ao da concórdia. Estamos no caminho da negatividade, no qual se conquista a vida própria tirando-a dos seus semelhantes enquanto que no caminho da positividade para conquistar a vida é necessário procurá-la para os outros. Eis os dois tipos: o do guerreiro, egoísta e agressivo, e o do homem pacífico do Evangelho, altruísta, pronto a colaborar. O primeiro é positivo só em relação à gota de água, que é o seu mundo, do qual ele se faz centro; mas ele é negativo em relação ao universo, do qual sem saber faz parte e cujo centro é Deus. O mártir do sacrifício para o bem de todos é negativo dentro da gota d’água humana, mas é positivo dentro do universo perante Deus. Tudo está emborcado em nosso ambiente terreno e, por isso, se julga fraco e se condena como tolo quem se sacrifica para o bem do próximo. Explica-se assim por que há um absoluto antagonismo entre o mundo e o Evangelho, porque existem, e o que significam esses dois métodos opostos. O homem do dever sacrifica-se, mas constrói na ordem, o homem da força triunfa em proveito próprio, mas destrói porque é rebelde à ordem; o mártir morre, mas semeia vida, o herói do mundo vence e vive, mas semeia morte. O sacrifício em obediência à Lei reconstrói ao longo da linha positiva da dor; a força na revolta à Lei destrói ao longo da linha negativa do erro e do mal. O triunfo do mundo é emborcado ao negativo, nos antípodas do triunfo positivo, nos céus; representa a vitória das células do câncer; e não a das células sadias do organismo. O triunfo do mundo se constrói esvaziando e destruindo e não gerando e construindo valores. Por isso o homem fica sempre insaciável, porque aquele nutrimento é fingido, negativo, não satisfaz, mas apenas dá fome.
Verifica-se então esse fenômeno: o caminho representa como um trabalho que aspira fora do S ou da linha da Lei uma quantidade de substância (a que constitui os espíritos rebeldes), a qual se inverte em negativa. Este processo gera um espaço negativo que se vai enchendo (AS) fora do campo da positividade (S); e paralelamente um vazio correspondente dentro desse campo da positividade (S). Tudo isto, como é lógico, gera um desequilíbrio que é necessário equilibrar de novo. Isto quer dizer que o deslocamento da positividade para a negatividade tem de ser compensado por um equivalente caminho de regresso da negatividade para a positividade. Então o vazio que se formou dentro do campo da positividade (S), tem de ser preenchido com o que saiu dele, esvaziando o terreno da negatividade (AS), com sua reintegração no estado positivo do S.
Eis por que existe a linha da dor. Explica-se dessa forma, a marcha à ré compensadora de todo o afastamento, o caminho de ida e volta, a necessidade de recuperação. Compreende-se, também, como a linha do erro, que vai para o mal, não pode representar senão uma pseudo-vantagem, uma perda, porque é ganho ao negativo. É uma dívida, um enriquecer momentâneo que depois é necessário pagar. É uma fácil descida que depois temos de subir de novo com o nosso esforço, um atalho para uma felicidade mentirosa que se resolve no engano, e não podemos sair senão recuperando tudo com o nosso sofrimento. Tudo isso, nos mostra a verdade e nos ensina que a desobediência é erro. Infelizmente não há outro meio. O raciocínio que demonstra e convence não tem valor para o rebelde, porque quem vive neste estado de negatividade não possui a forma mental da lógica, mas a do absurdo. É necessária a dor que se pode imprimir no subconsciente; só ela queimando tem o poder de fincar nos instintos um marco indelével.
Eis a razão e a técnica dessa justiça compensadora, pela qual automaticamente todo afastamento tem de se endireitar com o regresso à Lei. O ser que quis gerar o impulso do emborcamento tem de ficar sujeito a esse mesmo princípio até ao fim, isto é, até à completa reconstrução da ordem violada. Trata-se do mesmo impulso de emborcamento que por inércia tem de continuar, automaticamente, até ao seu desemborcamento, retificando tudo. No microcosmo de nosso mundo parece que a linha do desenvolvimento causa-efeito seja uma reta como são as linhas de nosso pequeno espaço terrestre. E o encadear-se dos trechos causa-efeito aparece como uma junção de retas, uma após a outra. Todavia, saindo desse pequeno espaço terrestre encontramos no universo astronômico outro tipo de espaço, o espaço-curvo, logo a sucessão causa-efeito, vista no seu conjunto ou totalidade do seu ciclo completo, se torna uma curva fechando-se sobre si mesma. Disto se conclui que o efeito não é mais um conseqüente que, ao longo duma reta, se afasta do seu ponto de partida; mas é um momento na continuação duma curva que tem de voltar àquele ponto, à causa de tudo que a gerou. Entre os dois termos: causa e efeito não são mais os dois extremos duma reta, mas são o mesmo ponto onde se inicia e se fecha o mesmo ciclo. No todo não podem existir afastamentos verdadeiros e definitivos, nem o ser pode gerar deslocamentos nas imutáveis posições da ordem universal. Podem existir oscilações parciais e compensadas, aparentes e particulares, como as das ondas do mar ou das vibrações da matéria, movimentos que nada deslocam e tudo acabam reintegrando no estado de origem, como Deus o quis. Eis a razão pela qual a involução tem de ser corrigida pela evolução, e à linha do afastamento da Lei ou linha do erro, tem de seguir a linha de regresso ou linha da dor. A obra de Deus é inviolável e nada em definitivo o ser pode nela mudar. E, se este pela sua liberdade, pode realizar alguma mudança, então tudo tem de voltar ao seu ponto de partida e ser restaurado na integridade do seu estado de origem.
Vamos assim observando sempre ,mais em profundidade o significado das linhas de negatividade e de positividade. Vemos que a contraposição entre estes dois termos opostos, na substância não é cisão, mas um conjunto dualista, que constitui a forma e o conteúdo da unidade. Eis então que o dualismo não divide, como se poderia acreditar, mas une; não afasta, mas liga e funde no mesmo ciclo os dois termos opostos que o constituem e que em última análise, não são senão as suas duas metades. O dualismo não é cisão, mas complementariedade entre dois movimentos contrários compensados, que se invertem um no outro, o segundo neutralizando o primeiro. Isto porque o movimento que vai do + para o - gera uma carência no campo do +, um débito que a negatividade tem de pagar à positividade, ou seja um crédito que a positividade exige da negatividade. Se o ser encontra satisfação na culpa que o afasta da Lei, ele nada ganha com isso, porque se trata de um empréstimo que o ser tem de devolver aos equilíbrios da Lei com o seu esforço e sofrimentos. A linha do erro NN1 expressa o primeiro destes dois movimentos ( + para - ); a linha da dor N1N expressa o segundo movimento ( - para + ). Com o -, a dor, fica pago o seu débito ao +, satisfazendo o crédito do +.
Uma conseqüência desta oposição de contrários é que o homem da força que triunfa no mundo, é vencedor somente enquanto o ponto de referência é o AS, mas ele é derrotado em relação ao S, que representa o organismo maior e mais poderoso. Trata-se então de uma vitória em pura perda, como dizíamos, de um débito a pagar, de um empréstimo a devolver, mais exatamente de um roubo aos equilíbrios da Lei, roubo que perante a justiça de Deus é culpa que exige a sua penitência. O S está representado na Terra pelo homem do altruísmo e do sacrifício. O AS está representado pelo homem do egoísmo e da prepotência. Que S e AS não são teorias fora da realidade está provado pela presença destes seus dois exemplos vivos e concretos. O julgamento que o homem comum em geral faz desses dois tipos é lógico: às avessas, porque ele é filho emborcado da revolta e, por isso, o seu ponto de referência é o anticentro, negativo, do AS. O choque entre esses dois tipos é contínuo na Terra, como o da luz e trevas, da verdade e erro etc. O terreno da vida e da evolução é de luta entre a criatura e o Criador e ao contrário. Há inconciliável antagonismo, como diz o Evangelho, entre os dois opostos: Deus e o mundo. Por isso Cristo falou que não se pode servir ao mesmo tempo a dois senhores. A tarefa da evolução é a de destruir o tipo separatista do homem da violência, substituindo-lhe pelo tipo colaboracionista do homem do amor. Este é o conteúdo do percurso da linha YX da evolução, como da linha N1N.
Explica-se, assim, a psicologia dos santos e dos mártires do ideal, que ao mundo parece loucura. Eles vivem no caminho da dor, que é o trecho de regresso para a positividade, N1N, indo para a Lei, seu ponto de referência e objetivo. Para quem vive neste caminho, orientado nesta direção, a morte é vida. O homem comum não pode entender essa psicologia, porque está percorrendo o caminho oposto, o de ida para negatividade, NN1, que o afasta da Lei. Aqui o ponto de referência é o próprio "eu". Eis então que o sacrifício é perda, e a morte é morte. É lógico que esses valores sejam em função do seu próprio ponto de referência. E se esses pontos são opostos, é lógico que as mesmas coisas adquiram um valor oposto. É assim que a morte pode significar vida e a vida, morte. É assim que, quando o ser se encontra na posição direta de positividade, cujo ponto de referência é Deus, o "eu" universal, vive em obediência e em função do S, e a vida, então, tem valor de vida, e a morte, de morte. Mas quando pelo contrário o ser se encontra na posição emborcada de negatividade, cujo ponto de referência é o "eu" individual, em função do AS, a vida assim concebida tem de adquirir o valor de morte, e a morte valor de vida. Para quem vai do + para o -, é lógico que tudo seja às avessas de quem vai do - para o +.
Eis um exemplo que nos mostra como a mente humana, ainda emborcada no AS, é levada a conceber tudo às avessas: as religiões concebem a ressurreição de Cristo como um milagre (prova de sobrevivência), encarando-a como prova da morte. Ela é prova de vida para a psicologia do involuído do AS, porque para ele a vida está no corpo; mas ela é morte para a forma mental do evoluído, porque para ele a vida está no espírito. O dato de que o homem concebe a ressurreição de Cristo como prova de vida física, demonstra que ele concebe como positivo o que é negativo, julgando ser vida o que é morte. Somente pode fazer isto o ser que está situado na negatividade do AS. Para o ser situado no pólo oposto ( + ): o corpo ( - ) representa apenas a forma, a casca que aprisiona o espírito, não vida mas morte, o abismar-se da positividade na negatividade. O mito da ressurreição de Cristo, satisfazendo o instinto do homem, deifica este produto da negatividade, a matéria, levando-o para fora da Terra, o único ambiente onde ele pode ter uma razão de existir, razão que não há nos céus.
Que a maior paixão de Cristo consista em ter descido até à matéria, isto é inconcebível. Mas que Ele tivesse de levar consigo aos céus as ferramentas da sua maior tortura, é difícil compreender. Tanto mais isto é verdade, que essa sobrevivência nos céus, dum corpo feito só para a Terra, e em nada proporcionado ao seu ambiente, implicava o fato de o espírito de Cristo continuar morando aprisionado nele, a não ser que o colocasse dc lado como uma relíquia sem vida, outro cadáver para enterrar. Então essa ressurreição não seria a continuação da vida de Cristo, mas a do seu aprisionamento na negatividade da matéria, o que para o espírito é morte, Impor a Cristo essa condenação para sempre, mesmo depois de Ele com a morte ter atingido a libertação, é crueldade demais, E sem essa libertação pela destruição do corpo físico, como podia com o invólucro de animalidade humana voltar ao Pai?
O homem, porque vive na negatividade do AS, acredita que a vida e o "eu" consistam no corpo. Para ele a morte é morte e não libertação. A verdadeira ressurreição está nessa destruição material, que liberta o espírito. A sobrevivência física é morte. Mas, para o homem que concebe a sobrevivência às avessas, é necessário que esse corpo saia do túmulo, para continuar vivendo. o homem concebe tudo à sua imagem e semelhança, porque não pode pensar senão com o seu cérebro e a sua forma mental, que é filha do plano físico onde ele se encontra. Tudo o que sai desse seu mundo desaparece como morto, não existe mais, porque não é percebido. As idéias do homem saem do seu cérebro para satisfazer as suas necessidades. Ele assim tudo transforma em mito para o seu uso conforme as suas exigências mentais. E isto é justo porque as religiões são feitas para o homem. O mito é uma adaptação dos fatos às necessidades de sua psicologia humana, que assim os transforma. A verdade é outra coisa, que existe de modo independente da maneira como o homem a vê. Prova-o o fato de que as interpretações que dela o homem faz mudam e evoluem com o seu cérebro, o que prova o ponto de referência é o "eu" humano. Isto quer dizer antropomorfismo, que é egocentrismo, demonstrando que o ser humano pertence ao AS.
O mundo, pelo fato de que está imerso no AS, é ignorante E por isso que vive enganado e acredita que a vida, seja vida, enquanto é morte, que o caminho da desobediência o leve à felicidade, enquanto o leva à dor. E quanto mais ele se apega a essa sua vida de emborcado em busca de gozo, tanto mais se aproxima do sofrimento. Tudo isto se explica com plena logicidade e justiça, porque para quem vive na negatividade, não observa senão o contrario do que aparece, porque todas as afirmações se tornam negações. Por isso o mundo foi definido como a Grande Maya2 ou ilusão. Quem tem a sua forma mental, que é emborcamento na negatividade, ao invés de vida encontra a morte.
Acontece que, quando o herói da forca acredita obter vida vencendo na Terra, de fato ele obtém morte, porque endividando-se, depois tem de pagar; com a violência lucra e triunfa, mas involuindo, isto é, descendo a dor do AS, positividade aleatória que é dívida de negatividade, vida temporária que amarra à necessidade de morrer. E quando o mártir do sacrifício perde vida vencido na Terra. de fato ele ganha vida porque dá, assim adquirindo crédito, pelo qual terá de ser compensado; com a bondade e o seu sofrimento perde, é vencido, mas evoluindo, sobe para a felicidade do S, positividade estável que não é empréstimo a devolver, vida eterna. onde a morte não existe. O primeiro método parece certo, mas esta errado porque é contraproducente, isto é, gera dano ao invés de vantagem. O segundo método parece errado, mas está certo porque é produtivo, isto é, gera verdadeira vantagem e não dano como parece, e não pode ser de outro modo. No terreno do emborcamento não pode existir senão verdade às avessas, isto é, engano. Tal é o método do mal, o de prometer vantagem, e fazendo o contrário.
E lógico que as vitórias do mundo sejam contraproducentes, porque o caminho é o da negatividade. Os triunfos do mal são como o afirmar-se da vida do câncer. Quanto mais ele cresce e vence, tanto mais se aproxima da morte, porque é negativo, não tem vida própria e não pode viver senão destruindo a vida dos outros. Esta é a automática punição dos vencedores à custa dos outros, dos que com a força ou a astúcia, quereriam furtar-se à justiça da Lei. Nada se pode ganha ganhar com o roubo. O que é fictício não pode dar senão frutos fingidos. Mais cedo ou mais tarde cada um tem de ficar reduzido aos seus valores substanciais. O que é negativo e quereria viver à custa da positividade dos outros, tem de acabar aniquilado no vazio da sua negatividade, Quem age, positivamente, ganha vida, quem age, negativamente, ganha morte. O primeiro evolui para o S e vai-se enchendo de vida e enriquecendo de todas as qualidades positivas. O segundo involui para o AS e vai-se esvaziando de vida e empobrecendo de todas as qualidades positivas e adquirindo as negativas. Por isso, como já há pouco nos referimos, as conquistas do mundo nunca chegam a satisfazer a insaciável fome de nossa negatividade.
O vencedor no mundo não é vencedor‘. Na sua vitória está a sua condenação, porque com ela ele penetrou mais e se tornou rei no reino do AS, que é o reino das dores. As vitórias humanas vacilam e acabam caindo, porque não têm base Não se pode adquirir coisa alguma furtando-a aos equilíbrios da Lei. A felicidade só pode ser atingida permanecendo-se na ordem do S, com o método positivo. Pela própria estrutura do fenômeno, com o método da negatividade, nunca se poderá encontrar senão felicidade emborcada, isto é, dor. A condenação do rebelde está no fato de que ele não pode seguir outro caminho. A sua meta natural e fatal é o fracasso, Furtar felicidade não pode dar felicidade, mas carência de felicidade. A punição está no fato de que o rebelde pela sua própria posição tem de acreditar no absurdo, e na possibilidade de se realizar alguma coisa ao negativo. Com o método da revolta se pode atingir somente a falta do que procuramos. O absurdo está em acreditar que equilíbrios estáveis se possam manter a poder da força e não com a justiça. A primeira gera desequilíbrio ainda maior. enquanto a segunda vai gerar o verdadeiro equilíbrio. Com a mentira não se pode encontrar a verdade, posições estáveis não se podem basear sobre valores falsos. Só com a sinceridade e honestidade se pode construir. Com a astúcia e a mentira se pode realizar apenas uma pseudo-construção, que parece construção, mas é destruição. Os efeitos não podem ser de natureza diferente das causas que os geraram.
É lógico que a felicidade do mundo acabe no sofrimento. É lógico que ao procurar a felicidade em direção negativa, não se possa encontrar senão felicidade ao negativo, isto é, sofrimento. Com a revolta o ser saiu desse estado feliz que no S é natural, espontâneo, fundamental, e caiu na carência dele, guardando no instinto a saudade insaciável do seu estado de origem. A fuga do S, como da Lei, é uma procura de satisfação fora da posição certa. Por que NN1 é a linha do erro, a procura de felicidade em sentido emborcado é lógico que gere dor. Quando o movimento chega em N1, atinge a plenitude da negatividade e o ser caiu em cheio no inferno da dor. Para libertar-se deste e não sofrer mais, não tem outro caminho senão o do regresso ao seu ponto de partida, percorrendo às avessas para a positividade o trajeto que foi percorrido para a negatividade. O esforço da subida tem de pagar a fácil descida, a luta no sofrimento tem de compensar o roubo de alegrias não merecidas. Só o trabalho de reordenação na ordem poderá libertar o ser da desordem que o atormenta.
Só nos apercebendo que vivemos num mundo emborcado. podemos compreender essas verdades e encontrar uma explicação das ações humanas e seus resultados. Nesta posição a verdade parece erro e o erro verdade. As conquistas reais fazem-se obedecendo a Deus, na ordem da Lei, e não impondo-se à força ao próximo com o próprio egoísmo; a riqueza conquista-se com o desapego e o desejo de usá-la para o bem dos outros. As aparências nos mostram a face oposta à da verdade: o que é absurdo se apresenta como lógico; o que é lógico se apresenta como absurdo. Mundo estranho em que tudo está disfarçado em formas enganadoras, e as portas se fecham, abrindo-as, e se abrem, fechando-as. O corpo em que vemos a vida representa a morte de nosso verdadeiro "eu" espiritual, e o fim deste corpo, isto é, o que chamamos de morte abre as portas à vida.
As religiões e a ética conhecem e ensinam estas conclusões, dirigindo a nossa conduta, nos mostram o caminho da salvação. Não dizem a razão pela qual temos de segui-lo, parecendo não saber por que isto acontece e o que justifica essas normas, qual é o jogo íntimo do fenômeno de nossa redenção que estamos vivendo e por que temos de realizá-la. O fato é que o ser se encontrava no paraíso do S, e que pela desobediência saiu dele e caiu de cabeça para baixo no inferno do AS. O ser está agora saindo deste inferno e tem de reconquistar o paraíso perdido, atravessando um purgatório de penitência constituído de um imenso oceano de dores. Estamos encontrando sempre novos fatos que nos confirmam esta teoria.
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1 - Êxodo: (20:2-3). (N. da E.)
2 - Termo sânscrito: engano, aparência (N. da E.)