O FIM DAS GUERRAS

Ao tratar no capítulo precedente das posições justas ou erradas que o indivíduo pode assumir, falamos em termos gerais de bem ou mal, positivo ou negativo, sem especificar-lhes o conteúdo. Nossa finalidade é compreender o fenômeno, não fazer preceituário. Esse trabalho, se lhe agrada, o leitor poderá fazê-lo, tendo em conta a natureza do erro tomado para exame. Queremos então mostrar como proceder para precisar do geral ao particular, quando se quiser focalizar um dado caso. Entramos assim no terreno das aplicações dos princípios expostos acima.

Para fazer isso é necessário definir a natureza e a quantidade dos valores dos quais fica constituído o fenômeno a ser estudado. Estabelecida uma unidade de medida, pode-se determinar a evolução que se desenvolve no caso observado, e a velocidade da progressão evolutiva em marcha para adiante, bem como a dimensão e o deslocamento do indivíduo no sentido positivo segundo a Lei, ou negativo anti-Lei, ao longo daquele caminho. Pode-se também determinar o grau de afastamento alcançado pelo indivíduo em relação à linha da Lei (por falta de retidão), em sentido negativo, e o grau de proximidade desse homem em relação a ela (como retidão). Assim, no segundo caso, pode-se observar o movimento com que se realiza o retrocesso involutivo do indivíduo não só em relação à força contra a corrente, como em relação à força a favor da corrente, assim por diante.

Assim é possível chegar à determinação qualitativa e quantitativa desses valores porque se trata de forças. Elas estão em movimento em uma dada direção e são lançadas ao longo de uma trajetória que se pode definir e traçar, porque sujeita a uma sua lei de desenvolvimento, como acontece com todos os fenômenos. O princípio de causa-efeito liga em uma concatenação lógica os sucessivos momentos desse desenvolvimento. Ele avança sobre um trilho e a uma dada velocidade. Isso permite estabelecer, com antecedência, onde, quando e de que forma o fenômeno vai terminar.

Estas não são mais do que indicações. Aqui não podemos expor, senão sumariamente, o problema, oferecendo ao leitor a chave para aprofundá-lo por si, para dilatá-lo, resolvendo os casos que surgirem. Quem pretender conhecer como se chega a essas conclusões, leia o volume: Princípios de Uma Nova Ética.

Tudo isso que expusemos é possível. Presume-se, porém, uma definição da natureza, quantidade de movimento das forças constituintes do caso em exame. Elas são do tipo mental. É necessário ter compreendido que o nosso universo não é constituído somente de matéria e energia, mas também de psiquismo, isto é, de uma onipresente substância psíquica, com caracteres de inteligência, ligada à direção dos movimentos do funcionamento orgânico executado pela matéria e energia. Sem isso, em vez da ordem existente, feita de movimentos coordenados, em direção a um fim, segundo um processo construtivo de evolução, teríamos o caos em que tudo ficaria disperso.

O campo em que agem essas forças de natureza psíquica, diretoras de nossa vida, é a nossa personalidade, em cuja estrutura deveremos portanto descobrir a existência delas e com isso a origem primeira do lançamento da trajetória de seu desenvolvimento. Para conhecer tudo isso, devemos então olhar para dentro de nós, porque é de nossas qualidades e das ações que lhes seguem e depende, por dedução lógica causa-efeito, o nosso destino.

Eis então que para conduzir o exame mencionado acima, é necessário conhecer-se a si mesmo, porque ali está o primeiro móvel, o ponto de partida de todo movimento. São as qualidades de que somos feitos que estabelecem a posição inicial do lançamento, da qual depende a forma da trajetória, sua direção, seu desenvolvimento e, enfim, um ponto de chegada. É necessário então um exame de consciência profundo, severo, sincero, um trabalho de introspeção e autopsicanálise, que ponha às claras as características das forças constituintes de nossa personalidade, positivas ou negativas, segundo a Lei ou a anti-Lei. Voltaremos a este conceito no fim do volume.

O resultado de tal indagação, como conhecimento do caso e previsão de seu desenvolvimento e conclusões, depende da exatidão de tal exame de consciência. Este desenvolvimento é o que se chama o próprio destino. Ele, pelo fato de que nos falta o conhecimento necessário para poder conduzir tal análise, é considerado como uma fatalidade cega. Trata-se, pelo contrário, de um fenômeno analisável em suas causas, corrigível em seu desenvolvimento, controlável em seus movimentos. Desse modo o entenderá, implantará e dirigirá futuramente na vida, quando for indivíduo consciente da Lei.

Para chegar a isso é necessário compreender que o futuro já está contido em suas causas, que temos sob os olhos no presente. Eis então que o futuro e analisável em suas origens e primeiros movimentos, de que depende todo o resto. O problema está em saber compreender que coisa contêm aqueles germes, qual é a sua lei de desenvolvimento, em direção a que ponto este tende. E isso é possível, porque neles estão contidas estas coisas. Se soubermos examinar e compreender tudo, eis que, depois do presente, poderemos ver o seu futuro correspondente.

Pelos princípios segundo os quais se comporta a Lei, poderemos saber que forma tomará em cada caso o efeito das causas dispostas por nós, para o bem ou para o mal. Poder-se-á assim conhecê-lo como um complemento lógico daquela causa, especialmente na reação corretiva por parte da Lei. Ela, de fato, por princípio de ordem e equilíbrio, põe ao lado de cada movimento, à guisa de anticorpo, o correspondente compensador, o seu termo complementar. É assim que se pode conhecer o valor desta incógnita, porque se sabe que para usufruir uma vantagem é necessário ter-se fatigado para merecer, mas quem para usufruir faz o mal, termina por dever pagar, sofrendo. Como se vê, não se trata de um trabalho de profeta, à base incontrolável de inspiração e intuição, acessível somente a poucos e em condições excepcionais; mas trata-se de um trabalho à base de lógica, acessível a todos, em condições normais e em termos positivos. Com isso começa-se a entrar com método racional no campo até agora reservado à ética e às religiões, resolvendo os problemas que elas propõem, mas não resolvem. E isso, não baseados em afirmações gratuitas, não controláveis, mas usando uma técnica racional e uma forma mental científica. Até agora a ciência e a fé partiram de pontos e usaram métodos muito diversos para poder estabelecer um diálogo e uma compreensão. Mas hoje o homem, de criança, está se fazendo adulto, e então enfrenta tais problemas com outra forma mental. A ciência avança sobre todos os campos, de modo que invade também os mais longínquos e neles se prepara para enfrentar problemas que até agora, com os velhos métodos, têm permanecido insolúveis. Isto é um encaminhar-se em direção à religião científica da nova civilização do terceiro milênio.

Uma outra aplicação de tais conceitos, prática e imediata, podemos encontrar em outro campo. Podendo prever em suas primeiras causas quais serão os acontecimentos de nossa vida, poderá ser possível preparar uma defesa contra aqueles dolorosos. Porém isso poderá acontecer usando uma técnica diferente daquela comumente adotada, isto é, intervindo de forma preventiva e agindo sobre as causas, de modo a suprimir-lhes ou corrigir-lhes os efeitos. Trata-se de um novo método mais inteligente e decisivo, de defesa da vida.

Esta tornar-se-á assim completamente planificada e o homem será o senhor do seu próprio destino, em vez de suportá-lo, sem entendê-lo, como escravo. O jogo é claro. Quando sabemos que as causas de nossas dores são os nossos defeitos, pode-se eliminar as dores, eliminando os defeitos. Isso porque está na lógica da Lei que, onde não temos defeitos, ela não tem razão para impor lições corretivas. Poder-se-á assim, fazendo um exame de consciência, até mesmo prever quais provas nos esperam, porque elas são uma conseqüência lógica de nosso passado. Mas para liberar-nos é evidente e necessário agir sobre as causas e, se não for possível, procurar pelo menos aliviar o peso das provas colaborando com a Lei, aceitando e compreendendo a sua lição. De fato, a finalidade desta é o de ensinar para não repetir o erro, a fim de que não se deva ainda suportar a dor correspondente. É certo que, quando o aluno aprende por meio da inteligência e boa vontade, não há razão que justifique o método do chicote, porque dele não se tem mais necessidade para atingir aquele fim. Eis um aspecto utilitário do presente estudo, um método inteligente para evitar a dor. Aprofundaremos no final deste volume também este conceito. Isso poder-se-ia chamar um novo tipo de seguro contra os males que nos ameaçam. Mas esse seguro obtém-se individualmente, como trabalho de consciência e inteligência. Tais conceitos são suscetíveis de vários desenvolvimentos. Aquilo que agora, aqui, é um ponto de chegada, poderá ser para outros um ponto de partida.

Mas também no plano coletivo a ascensão do homem a um mais alto nível de inteligência e consciência levará a grandes mudanças. Sabemos que a evolução tende a levar a uma progressiva diminuição da dor em proporção ao grau atingido de compreensão da Lei e, portanto, de harmonização com ela, o que significa evitar o erro e o correspondente sofrimento corretivo a ele ligado. O objetivo de tais esforços é sempre o de evitar a dor. E um dos efeitos do desenvolvimento da inteligência humana será o de eliminar as guerras. Esta será uma das grandes transformações que se verificarão no atual momento histórico, no qual termina um ciclo de civilização e inicia-se um outro. A vida está empenhada a fundo neste trabalho.

A abolição das guerras será o resultado da nova moral utilitária baseada na inteligência. Isso não acontecerá por mérito de teorias pacifistas. Elas nunca serviram para nada. A vida não é feita de palavras, mas de fatos, e baseia-se sobre um positivo cálculo utilitário. A moral que eliminará as guerras não será filosófica ou religiosa, mas racionalmente positiva, conforme a nova forma mental que o homem está assumindo hoje ao atingir um novo nível de evolução. Este é um dos muitos resultados da atual crise de crescimento.

Como se comporta a Lei neste momento, com referência ao homem, que ela deixa livre para construir o destino que quiser? A Lei exige atingir sua finalidade, que é a de fazer entrar a vida em sua nova fase de desenvolvimento, em que o método da violência bélica é superado.  O homem é livre, mas qualquer coisa que faça, a Lei está decidida a realizar sua vontade sobre ele.

O sistema é sempre o mesmo, pelo qual: 1) o homem, por compreensão, obedece à Lei, colaborando com ela no cumprimento de sua vontade; 2) o homem desobedece à Lei é, então, forçado ao cumprimento daquela vontade. No primeiro caso a abolição das guerras é conseguida pacificamente, sem dores, só por meio da inteligência. No segundo caso o mesmo resultado é atingido à força, por meio de uma ação construtiva realizada por meio de uma prova dolorosa. Este é o meio que a Lei usa com quem não compreende outra linguagem. Método seguro, dado que em qualquer caso a Lei é obedecida, porque é compreendida ou sofreram as conseqüências de não compreendê-la.

Vejamos o primeiro caso. A Lei oferece motivos utilitários positivos a quem é capaz de avaliá-los, para que sejam aceitos. Os armamentos atômicos custam muito porque envelhecem rapidamente e são continuamente renovados pelo incessante progresso científico. A primeira vantagem, portanto, em prol da paz, é a supressão do custo de produção. Há depois o fato de que é difícil obter uma superioridade atômica absoluta e definitiva, que assegure a defesa, porque se pode a cada momento ser superado por um outro país. A preparação com meios atômicos não admite mais possibilidade de vitória, porque o atacante seria aniquilado juntamente com o atacado, e uma guerra produziria somente destruição para todos. Isso faz-se sempre mais verdadeiro, porque os meios atômicos fazem-se mais mortíferos, a cada ano.

Vejamos o segundo caso.  Se o homem quiser colocar-se em uma linha anti-Lei e quiser usar a sua inteligência neste sentido, determinando uma guerra atômica, ela será igualmente a última, porque constituirá uma prova e lição tal que todos perderão a vontade de recomeçar a experiência. Assim, com o sistema do chicote a Lei saberá fazer-se compreendida da mesma forma, e sua finalidade será alcançada, ainda que o homem não queira compreender o absurdo de seu comportamento. A culpa sendo dele, pagaria um alto preço, sem que sua liberdade possa impedir que a lei se realize.

Mas, por que ela hoje quer a abolição das guerras? Ela o quer porque não há mais necessidade delas para atingir seus fins. Se no passado a vida as aceitava, porque tinham uma finalidade: a de misturar os povos, difundir as idéias, expandir a civilização dos conquistadores nos países conquistados. As grandes marchas dos exércitos no passado eram meios de comunicação através de massas imóveis. O invasor vencedor era um fecundador não só de mulheres, mas também de cérebros, de instituições, de costumes.

Hoje a vida não tem mais necessidade das guerras com essa função porque a ciência abriu grandes vias antes desconhecidas. Hoje os meios de comunicação fizeram-se tão rápidos e fáceis, que se atingiu automaticamente um estado de mesclamento permanente, sem necessidade de invasões de exércitos vencedores. Tudo isso amalgama, unifica, suprime diferenças de língua, de idéias, de raça; faz saírem barreiras étnicas, econômicas, políticas, religiosas e leva em direção ao futuro estado orgânico, ao qual tendo a humanidade, por lei de evolução.

E para conseguir isto que a vida abandona o sistema de guerras. A Lei quer a unificação, e hoje surgiu um fato decisivo neste sentido. A evolução chegou a levar a humanidade aos umbrais de uma nova fase de desenvolvimento e força-a a entrar nela. Como aconteceu isso? O progresso da ciência levou a descoberta de armas bélicas de tal potência que não podem ser usadas sem provocar uma catástrofe universal. O fato é que elas são mortíferas demais para que possam ser usadas com a velha finalidade de vencer um inimigo. Hoje as duas maiores nações que disputam a supremacia mundial atingiram uma tão grande potência atômica, que cada uma delas pode destruir a outra, e pode sozinha destruir o mundo,

Chegamos ao ponto de ruptura com a velha lei da luta, pelo que esta deve ser abolida, por não atingir o fim evolutivo da seleção do mais forte, mas, pelo contrário, por levar a uma destruição universal, fato contra o qual a vida se rebela. É assim que a Lei elimina a guerra que não serve mais a seus fins, porque não termina com o triunfo do vencedor selecionado (fato de utilidade biológica em sentido evolutivo), mas, ao contrário, é uma guerra que destrói todos. A revolução é profunda, porque leva a um estado de unificação mundial e à abolição do velho método de vida egocêntrica, separatista, para passar ao método coletivista e colaboracionista, isto é, do estado caótico ao orgânico. Trata-se de um grande salto avante em direção ao regime de ordem, para o qual tende a evolução.

Vemos, de fato, que tudo isso hoje começa a realizar-se, tanto no campo político como no religioso, que vem acontecendo entre os filhos separados do cristianismo, e acontecerá para todas as religiões cujas bases positivas serão dadas pela ciência, único conhecimento de tipo universal. No campo político, a mesma tendência à unificação levou à idéia nova dos Estados Unidos da Europa, reduzindo as três ou quatro potências mundiais a um número sempre menor, até que se atinja um governo único de uma sociedade mundial de nações. Ele assumirá funções de polícia que impedirá as guerras, resolvendo os casos de países menores.

Estes são os novos conceitos que a Lei vai pôr em prática. Os destruidores do velho já estão trabalhando. Mas não é destruição, é renovação. A Lei mostra-nos o gesto de Deus, continuamente criador, impulsionando o homem novo em direção a uma posição biológica mais adiantada. Todas as suas manifestações estão envolvidas. Na superfície vê-se a tempestade, o vórtice do grande deslocamento. Mas nas profundezas está a ordem da Lei de Deus que guia o desenvolvimento do fenômeno e garante-lhe o bom êxito. O tempo bate fatalmente o ritmo do transformismo evolutivo que, a cada momento, sem jamais cessar, demole o negativo e o reconstrói positivamente. A trajetória do fenômeno vemo-la lançada do mal para o bem. O completo e definitivo triunfo deste deverá assim fatalmente ser lançado no retorno final do ser a Deus.