"S. Vicente, 15 de fevereiro de 1956.

Nazarius,

Depois de um breve descanso, volto ao trabalho no meu quarto, isolado do mundo. Todo descanso deve dar o seu fruto. Agora enfrentarei a luta com maior disposição. Tudo corre bem e correrá sempre melhor. Este é o caminho traçado para este ano. Chegou da Providência Divina tudo o que precisava. Agradecemos a Deus não somente com o coração e com as palavras, mas com o nosso trabalho, cada um no seu caminho. Eu vou atingir o meu objetivo e você também o seu. Esta é a maravilhosa harmonia da obra de Deus.

Voltarei sozinho à colina em frente ao mar e lembrarei de nossas conversas; sentarei na mesma pedra.

Que Deus o ajude sempre. Tranquilize seu pai, que ele não se preocupe pelas suas necessidades no Rio. Deus nos ajudará em tudo.

Lembranças a todos os seus.

Aqui fica um coração amigo para sempre.

Pietro Ubaldi"

COMENTÁRIO

No primeiro parágrafo, Pietro Ubaldi diz que, após o descanso, voltou ao trabalho, no seu quarto, que era também o seu gabinete, isolado do mundo. Continuou sua rotina, como fazia em Gúbio. As visitas não tinham acesso àquele quarto, nem mesmo a empregada para fazer limpeza. Ele próprio fazia a faxina, duas vezes por semana. Não era necessário mais do que isso, porque morava no nono andar e limpava bem o calçado no tapete de entrada do edifício, quando retornava dos passeios normais, para diminuir a poeira no apartamento. Fazia o mesmo quando chegava de viagem. Trocava a roupa de cama uma vez por semana e entregava à lavadeira, junto das suas. O ambiente do quarto, já descrito no livro Pietro Ubaldi e o Terceiro Milênio, era de uma atmosfera espiritual indescritível. Muitas vezes, convidou Nazarius para ficar a seu lado, diante do birô, enquanto estava escrevendo livros. Foram momentos inimagináveis para o convidado. O quarto-gabinete era o santuário de Pietro Ubaldi, respeitado, também, pela família. Era um local íntimo, onde escrevia os seus livros, sob inspiração de Sua Voz. Era um lugar sagrado.

No capítulo “O Fenômeno” de As Noúres, ele mostra o estado espiritual do ambiente de trabalho: “Não posso escrever em qualquer lugar. Num ambiente de desmazelo, desordenado, desarmônico, não asseado, novo para mim, não impregnado de minhas longas pausas do meu estado de ânimo dominante, não harmonizado com a cor psíquica de minha personalidade, não posso escrever senão mal e com esforço. Eis-me, ao contrário, em meu pequeno gabinete, ambiente de paz, onde os objetos expressam a minha própria pessoa, onde a atmosfera é ressoante de minhas vibrações e tudo, por comunhão de vida, está sintonizado com meu temperamento. Para aí deter-me, longamente, a fim de pensar e escrever, saturei as paredes, a mobília, os objetos, de um particular tipo de vibração, que agora a mim retorna como uma música que harmoniza o meu pensamento.”