"S. Vicente, 16 de setembro de 1963.

Nazarius,

Agradeço pela sua cartinha e pelo cheque de setembro.

Agradeço por ter-se lembrado de mim no dia dezoito.

A loja foi inaugurada no dia 31 de agosto e já estão trabalhando nela. Fora da temporada ainda não há muitos fregueses. Na temporada vai aumentar. No entanto, estão aprendendo o ofício melhor e conquistando novos fregueses. Tudo nasce aos poucos.

Muito obrigado pela oferta de chegar até aqui para levar-me, se Alberto não puder ir, como ficou combinado. Com você nos encontraremos no Rio? É preciso marcar tudo bem exato para nos encontrarmos e não ficarmos perdidos no caminho.

O meu 21º livro, Um Destino Seguindo Cristo, será escrito em italiano.

Lembra-se do quadro de Cristo que eu tinha no quarto? A autora dele me pediu por um mês para uma exposição. Agora, depois de seis meses ainda não me devolveu. Vejo que a idéia é a de não devolver-me mais. Que hábito têm aqui: fazer presentes para depois recebê-los de volta!

De saúde estou bem, apesar de o médico encontrar um sopro no coração e outras coizinhas com nomes difíceis. Mas a última consulta me achou melhor. Basta uma vida tranquila, sem choques e esforços e tudo vai bem. Nos primeiros quinze dias, o rendimento foi muito baixo.

Você recebe os impressos de Montevidéu? Se não os recebe, posso enviar-lhe.

Saudades a todos os nossos amigos de Campos.

Pietro Ubaldi"

COMENTÁRIO

77 anos, um homem vivido, sofrido, dilacerado até a alma. Um escritor famoso pelas revelações que trouxe ao mundo, amado por muitos e desprezado por alguns, o bastante para fazê-lo sofrer tanto que em muitas ocasiões se considerou um crucificado. Dele se pode dizer; nunca tão poucos fizeram tanto mal a um só homem.

Agora, no fim da vida, os deveres materiais estão diminuindo e vai chegando ao fim da missão com mais tranquilidade.

Quando Nazarius o visitou no mês de julho lhe fez um convite: passar o verão (janeiro e fevereiro) em Grussaí, uma praia a 30 km de Campos. O convite foi aceito e ficou a data mais provável, viajar no dia 7 de janeiro, em companhia de Alberto.

Se a viagem concretizar-se, poderá repetir-se o mesmo encontro de há dois mil anos, quando Simão Pedro se hospedava em Casa de Nazarius, em Roma, segundo Quo Vadis.

Pietro Ubaldi gostava de conversas sobre as vidas passadas e falava com tanta convicção que pareciam acontecimentos em sua vida atual. Havia tanta riqueza nos detalhes, gravados em seu subconsciente, que facilmente Nazarius ficava imerso naquele acontecimento. Não somente explicava, mas nas palavras estavam todas as suas vibrações. Quando a conversa girava em torno do conteúdo de algum livro ou de outro assunto, o processo era o mesmo.

Tinha verdadeira paixão pelo bem, por isto sofria demais quando lhe faziam mal. Perdoava com facilidade, mas sofria. Sua alma era supersensível.

Era reencarnacionista,é o que nos mostra o último capítulo: “A Chegada da Irmã Morte”, de História de um Homem, quando descreve um reencontro com o Cristo. É deslumbrante, verdadeira visão do seu passado como Apóstolo, a quem o Mestre entregou as chaves do reino dos céus. Era noite, quando se deu a contemplação: “Estendeu os braços num esforço supremo e depois deixou-se abater sobre o colchão, extenuado pela violência das sensações. Aquele pensamento olhava-o intensamente; aquele afeto penetrava-o, aquela vontade arrebatava-o e aquela forma assumira lineamentos precisos. Reconheceu-a então. Mas jamais a divina visão lhe aparecera com tanta força e clareza. Então, contemplando-a com os olhos e com a alma, exclamou:

– Cristo, Senhor! - repetia ele

– Reconheces-me? - respondia a visão.

– Reconheço-Te, Senhor.

– Lembras-te?

– Lembro-me.

– Quem sou eu?

– Tu és Cristo, o filho de Deus.

– Tu me amas?

– Senhor, Tu saber todas as coisas, Tu sabes que Te amo.

– Pedro, estás extenuado. Teu caminho está completo. Repousa em mim. Pousa tua cabeça sobre o meu peito e repousa.

Aqui, a visão se dilatou. Apareceram as margens do lago de Tiberíades, as doces colinas da Galiléia, a noite da paixão, o triunfo da ressurreição. E tudo ele, agora fora do espaço e do tempo, reviu intensamente, detalhadamente, não com o sentido de nostalgia para com a inalcançável realidade longínqua, como em vida, mas com um sentido de paz e felicidade.”

Numa nota de rodapé está escrito: “Quem vive da forma e da letra e não no espírito, não poderá penetrar o sentido dessas palavras.”

O texto, ligado à nota de rodapé, mostra claramente que Pietro Ubaldi é o mesmo Simão Pedro (veja o diálogo entre Cristo e Pedro no Evangelho – João, 21:15-17). Claro que só acredita quem está convicto de que a Reencarnação existe.

Na longa entrevista à revista O Cruzeiro (03/11/1951), quando o repórter lhe perguntou: “É verdade que Pedro reencarnou no senhor?” Pietro Ubaldi respondeu: “Dizemos na Itália que quando não se pode provar não se deve afirmar. Por isso, não o afirmo categoricamente. É questão de foro íntimo, pessoal. E é um problema vasto que não pode ser resumido numa entrevista.” Perguntamos: esta não é uma resposta afirmativa? Pensemos: se Pietro Ubaldi dissesse que era Simão Pedro voltando à Terra – nunca fez segredo disso a seus amigos mais íntimos (v. Pietro Ubaldi e o Terceiro Milênio) – seria endeusado por uns e apedrejado por outros. Ele sabia disso e conhecia profundamente o comportamento do ser humano. Por isto sua resposta foi sábia e prudente.

Tenha sido ou não o Apóstolo Pedro, uma coisa é verdade: ele foi um santo homem.