O primeiro tema que conquistou o prêmio destinado aos Autores de Monografias e Ensaios que deverão constituir a “Coleção de Biosofia” se refere as noúres, hipótese das “correntes espirituais”, emitidas por forças invisíveis, por Essências que um dia animaram seres humanos ou que nunca se incorporaram a organismos físicos, vivendo e agindo no infinito do tempo e do espaço e que influem, muito frequentemente sobre a nossa Terra.

 

Um único concorrente, respeitando as normas do concurso, fez chegar oportunamente, o próprio trabalho, unido a um sobrescrito assinalado com o número 6 e o moto: “Inhoc signo vinces”.

Após o julgamento, unanimemente favorável, foi aberta a sobrecarta: Dr. Prof. Pietro Ubaldi, Gubbio (Perugga).
 

Agradabilíssima surpresa, embora o valor literário, eminentemente biosófico, e as referências à produção ultrafânica, que nesta obra são frequentes, já tivessem feito nascer a esperança de que o autor fosse precisamente Pietro Ubaldi.

Se nos fosse lícito falar de “sorte”, deveríamos exclamar ser uma grande sorte a “Coleção de Biosofia” iniciar-se com a monografia de um hipersensitivo, dotado de faculdades tão particulares que não se podem confundir com as dos mais poderosos e experimentados ultrafanos. Não podemos, porém, jamais falar de “sorte”, mais ou menos cega; sabemos que nossas obras são ordenadas e dirigidas por uma Força superior, que mede, estabelece, escolhe os instrumentos, guiando-os, e por meio deles realiza o que deve ser realizado.
 

Não pareça supérfluo determo-nos nesse assunto, pois o episódio é imensamente belo e eloquente e não pode permanecer ignorado.

O relator que subscreve estas páginas teve um dia uma idéia, ou melhor, um desejo: que uma grande casa editora publicasse uma série de monografias sobre os problemas mais torturantes e mais ocultos da vida do homem e do cosmos. Sonho! Não havia surgido, não havia brilhado com todo o encantamento de sua beleza e grandiosidade, que desaparecia ante a inesperada visão de todas as impossibilidades, uma casa editora que, justamente no período mais atroz da crise moral, social e econômica, consumira somas, ingentes para publicar uma coleção de livros biosóficos? Quem os leria? E, sobretudo, quem os escreveria?
 

 

 

“Poucos dias” depois, porém, um Sócio Emérito da Sociedade de Biopsíquica, que vive distante da Itália, dirigiu a quem escreve estas linhas, uma carta que dizia mais ou menos o seguinte: “Tenho pensado que seria útil e justo que os problemas biosóficos fossem objeto de outras tantas monografias; examina o assunto, toma as devidas informações e, sob os auspícios de nossa Sociedade, sejam feitos concursos anuais quantos sejam os temas. Já se encontra em disponibilidade todo o necessário para premiar os dignos e para a disfusão das monografias, sem determinação de número”.

 

 

 

Quem havia recebido o inesperado encargo, imediatamente interrogou o Espírito-Guia (O Mestre) da ultrafana Bice Valbonesi; eis a resposta: “Tudo isso é determinação superior; fui eu quem ligou teu pensamento à mente do teu Irmão distante, que, doutro modo, não se aliaria ao teu desejo; ele e tu cumprireis simplesmente um dever. Obedecei e trabalhai”.

 

 

 

Eis, agora e aqui, escolhido Pietro Ubaldi com o primeiro dos trabalhos e justamente com um trabalho que se refere ao principal argumento, fundamental, da ultrafania; Pietro Ubaldi, que é dotado de uma hipersensibilidade excepcional, não confundível com a dos maiores ultrafanos. Sócrates ouvia, também, a “Sua Voz”, mas talvez não tivesse sabido falar – pelas condições do seu tempo, do ambiente, do grau evolutivo de então, do estado da ciência de sua época – como Pietro Ubaldi, usando um método científico, sobre o fenômeno do qual é instrumento, mas instrumento consciente do valor da produção que através de si mesmo se manifesta.

 

 

 

Ultrafano no verdadeiro e mais amplo sentido da palavra, na forma e na substância de sua obra perfeita, o Autor de As Noúres pode falar sobre as correntes espirituais o que nenhum pensador, embora genial, poderia jamais dizer, porque Ubaldi “viveu” sua obra, abandonando o próprio Eu às ordens de uma Entidade de superlativa inteligência, que ele denomina “Sua Voz” e que lhe vem do Mistério. Ele obedeceu, recolhendo e repetindo aos homens as palavras profundas que ele não pensou, mas ouviu. E pôde, ao mesmo tempo, com as próprias faculdades cerebrais, seguir, indagar, entender (o que era justamente nosso desejo) a técnica, por assim dizer, desse importantíssimo fato espiritual que é a radiação emitida pelas Essências vivas, de uma vida exterior aos estreitos limites da nossa existência.

 

 

 

A “Coleção de Biosofia” tem seu início, pois, com o trabalho de um autor que, aos dotes naturais da mente, à cultura profunda do imenso problema, reúne faculdades supranormais dum grau tão elevado que talvez não se possam confrontar se não remontarmos aos grandes Místicos.

 

 

 

Pietro Ubaldi é, pois, um “assinalado”, um dos que são “enviados” e para nós, crentes na realidade duma vida além do túmulo, é impossível deixar de reconhecer que tudo que aqui se expõe é uma demonstração a mais de que uma Lei superior impera e dirige nossos esforços, por Ela regulados e desejados.

 

*

O relatório de uma comissão deve ser conciso. No caso presente, entretanto, importa atender menos ao hábito: seja porque o trabalho premiado é, em parte pelo menos, obra ultrafânica, e o Autor deve, assim, ser apresentado aos leitores como um sujeito digno de particular exame; seja porque o presente trabalho repete e completa e, de algum modo, se refere a um anterior trabalho seu sobre o assunto.

 

 

 

Após o êxito do concurso, a Comissão julgou conveniente conhecer mais de perto o sujeito. Pietro Ubaldi (nascido em Foligno, em 1886) nos disse: “Tinha por instinto o Evangelho no coração; nasci para amar”. Estudou unicamente para ser promovido nos exames, pois, diz ele – “Não cria no que me ensinavam, que eu sentia incompleto, inútil, sem bases substanciais. A verdade estava em mim, eu a procurava dentro de mim. Lançava-me, rebelde a qualquer guia, ao conhecimento humano, ao acaso, procurando secretamente minha verdade. Contemplava o mundo e as coisas, do interior, em suas causas e princípios e não nos seus efeitos e utilização prática. Do mesmo modo que os volitivos e os práticos podem considerar-me um incompetente com relação ao gozo utilitário da vida, eu posso considerá-los incompetentes com respeito à solução dos problemas do conhecimento”.

 

 

 

Isso não o impediu de obter, com honra, o diploma de doutor em Direito, de haver aprendido diversas línguas, de ser versado em música, de fazer longas viagens e, finalmente, de conquistar, em poucos meses, uma cátedra nas Escolas Médias. Estudava, observava, meditava. Sobretudo meditava; e “o turbilhão das exigências exteriores golpeava-me sem trégua, impondo-se à atenção de meu espírito, que queria viver sua vida. Acumulavam-se as experiências humanas, quase todas amaríssimas. A dor martelava minha alma sob seus golpes. A maturação se precipitava. Um dia, à beira-mar, em Falconara, contemplando a beleza da criação, senti, de um modo evidente, a revelação, rápida como o raio: que o Todo não podia ser mais que Matéria, Energia e Conceito ou Espírito: (M = E = C) = S, que significa Substância”.

 

 

 

Desde esse luminoso instante, inicia-se o esforço de Ubaldi. Em “Ultra”, de Roma (1928-29), em “Constancia”, de Buenos Aires (1932), etc., surgem as primeiras tentativas e em seguida prepara A Grande Síntese, através de uma maturação, não realizada por estudos positivos; mas precipitada do mistério de sua alma. Certamente, Ubaldi é culto, por estudos, por leituras, por viagens através da Europa e da América, mas ele nega que sua obra (exceto os primeiros manuscritos incompletos e caóticos), em nosso campo, consiste em Grandes Mensagens e A Grande Síntese seja fruto de estudos e de leituras. Acrescenta: “Subitamente o processo de maturação, depois de um ano de pausa, meu pensamento recomeçou tudo, desde o início, seguindo um seu fio interior e não outro. E A Grande Síntese está a demonstrar a verdadeira natureza da minha mediunidade inspirativa-intelectual; a princípio rudimentar, intermitente, jaculatória, mas progressiva, até tornar-se em mim uma qualidade estável, uma segunda natureza”.

 

 

 

Essa progressividade é uma característica fundamental, lógica, correspondente aos princípios da ascensão espiritual das religiões e aos da evolução biológica darwiniana. Essa aproximação do fato evolutivo – na espiritualidade e na biologia – é o prosseguimento da concepção de Russel Wallace, mas em Ubaldi não é limitada, de ordem exclusivamente racional, antes, é a conquista de uma verdade superior; dir-se-ia que Ubaldi haja antecipado essa evolução psíquica que deverá ser alcançada pela humanidade, que se conserva ainda num ciclo inferior de seu tornar-se.

 

 

 

De fato, para Ubaldi a mediunidade é, como ele sente e declara, “o estado normal de um futuro psiquismo mais sutilizado, de uma percepção anímica supersensória mais refinada; é uma superior fase de consciência e dimensão conceptual perfeitamente normal na evolução, excepcional hoje na Terra pelo estado relativamente involvido da raça humana. Nada, pois, de anormal, de extraordinário, de miraculoso: é questão de caminho percorrido. Assim eu sinto o problema, porque assim o vivi e solucionei”.

 

 

 

A dor teve em Ubaldi uma parte importantíssima: foi a dor que purifica. Não há aqui entretanto, lugar para uma biografia, mas, sim, para um exame sintético do íntimo de um sujeito que, embora não possuindo nada de miraculoso, como ele afirma, é todavia excepcional, como excepcionais são o Herói, o Gênio, o Santo.

 

 

 

É excepcional como todos os sujeitos hipersensitivos, mas ainda mais pela nítida consciência que Ubaldi tem das próprias faculdades, do próprio trabalho. Quando em Colle Umberto, na noite de Natal de 1931, escreveu sua primeira Mensagem, obedeceu a uma Voz que lhe dizia: “Não temas, escreve!” Ele tremia, aniquilado; em seguida ergueu-se, transfigurado; uma força nova se infundira nele: tinha de obedecer; daí surgiu aquela magnífica página de profunda bondade, que trazia uma assinatura: “Sua Voz”.

 

 

 

“Sua Voz”: fonte de pensamento, de afeto, de ação e de bondade. A ele dizia: “Não perguntes meu nome, não procures individuar-me. Não poderias, ninguém o poderia; não tentes uma inútil hipótese”.

 

 

 

Desde então, Pietro Ubaldi, soldado obediente de uma Força superior, lançando suas “Mensagens”, encontrou acolhida e admiração. As revistas, dos mais diversos idiomas, e inúmeros admiradores andavam à porfia, a fim de que o novíssimo pensador lhes doasse as jóias que por seu intermédio vinham do Mistério. Todos aqueles que o ouviam dele recebiam conforto. E a mesma sorte e mais clamorosa teve A Grande Síntese, pois a revista milanesa Ali del Pensiero lhe iniciou a publicação em fascículos em 1933. A tradução surgia, baseada nesse texto no grande diário Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, na revista Constancia, de Buenos Aires, na revista Reformador do Rio de janeiro etc., em toda parte suscitando um coro de verdadeira admiração. E muito mais digno de admiração deve ser o “fenômeno” desse trabalho, sabendo-se que Ubaldi o escrevia aos poucos; enquanto se publicava uma parte, ele o continuava, seguro de si como nenhum outro jamais o ousaria. Qualquer autor, antes de publicar seu trabalho cuida de lê-lo, retocá-lo, corrigi-lo. Ubaldi não tinha necessidade de correções; nunca surgiam arrependimentos; tudo se desenvolvia com uma rapidez fulmínea, naquelas noites predestinadas em que “Sua Voz” lhe falava.

 

 

 

Após o Sujeito, sua obra. Não se poderia apreciar As Noúres sem antes se deter em A Grande Síntese que em breve estará completa e publicada em volume, em diversas línguas, porque As Noúres, repetimos, constitui seu complemento, o comentário, pelo menos, do principal fenômeno, o das correntes inspirativas.

 

 

 

O conhecimento dessa obra é indispensável para bem penetrar o que no presente volume Ubaldi expõe, especialmente nos três últimos capítulos. Resumir, porém, A Grande Síntese não é fácil, pelo seu estilo extremamente conceituoso. A doutrina nela desenvolvida não é somente uma síntese do atual conhecimento humano, que é bem reduzido em face dos problemas substanciais, mas constitui uma síntese da fenomenologia universal, isto é, a coordenação num organismo único dos fenômenos existentes que o concebível humano pode apreender e ainda além. E por fenomenologia se entende não apenas o que pode recolher-se no campo da ciência atual, mas também no da filosofia, das ciências econômico-sociais, da ética, das religiões etc. A fusão de todos os efeitos reconduzidos à causa central, a visão do absoluto através das infinitas formas do relativo, conduzem espontaneamente o leitor ao contato com o princípio único que tudo rege. Unidade, pois, absoluto monismo, é o conceito central desta doutrina: monismo que, na evolução do pensamento humano sucede às precedentes afirmações. Politeísmo, em seguida monoteísmo, finalmente monismo – são as etapas do pensamento humano.

 

 

 

A obra pode apresentar um aspecto humano, que se mostrará aos não-iniciados como uma tentativa, plenamente vitoriosa, de dominar, numa síntese única e universal, todo o conhecimento, de organizá-lo respondendo a todos os problemas que à mente humana possam apresentar-se. Neste seu menor aspecto, a obra corresponde a uma impelente necessidade para a evolução do pensamento no instante atual, reconduz à unidade a ciência ameaçada de dispersar-se na especialização, sacia a alma humana oferecendo soluções que a ciência se mostrou impotente para dar.

 

 

 

Para quem saiba ler na profundeza, porém, logo nasce, por um “sabor” todo seu que a obra possui, a sensação de que ela não poderia ser concebida de um plano mental humano, mas necessariamente de um ponto de vista elevado, numa dimensão superconceptual. Pois só assim poderiam ter sido resolvidos, como o foram, todos os problemas que a filosofia e a ciência, operando com métodos puramente racionais, não haviam solucionado até agora. A obra é, pois, transcendental, ultrafânica, isto é, o autor concebeu e escreveu sem estudos preliminares, confiando acima de tudo em seus recursos super-racionais, segundo um método novíssimo de pesquisa por intuição, abandonando-se, nas passagens mais complexas e sem precedentes conhecidos, exclusivamente à sua inspiração. Inspiração, entretanto, exata e científica.

 

 

 

A obra, portanto, pode ser lida com várias mentalidades e em diversas profundezas e falará diferentemente conforme a potência intelectiva do leitor. Muitos considerarão a obra como um único sistema, embora genial, em que a ciência dispersa é finalmente reunificada num monismo absoluto. Já é muito; mas, para nós, que o sentimos, existe o aspecto ultrafânico, que dá ao escritor o valor da visão direta da Lei que anima o universo e representa uma nova ascensão do homem na concepção da Divindade.

 

 

 

Escrito ultrafânico, soube manter, porém, um perfeito equilíbrio com a racionalidade. Em geral, os Ênteles11 revelam distância na concepção e no modo de exprimir, oriunda da diferente altitude de plano evolutivo e das dimensões supertemporal e superespacial em que se movem. E isso dá, talvez, ao escrito um sentido vago, nebuloso, inalcançável que é repelido como antiobjetivo e anticientífico. Operou-se nesta obra uma transmissão muito mais complexa que na comum registação ultrafânica inconsciente, pois o sujeito sentiu e controlou todo o processo e pôde, com sua intervenção consciente e ativa, reduzir com fidelidade a concepção entélica sobre-humana aos termos da mais segura terminologia e técnica de pensamento científico. Pela primeira vez, assim, a ultrafania oferece um produto rigorosamente orgânico e racional, de modo a coincidir com a ciência moderna, a enxertar-se em seu momento e conduzi-lo mais alto com objetivos de bem, lançando em terreno bem preparado a semente, que se desenvolverá, de uma nova civilização, que o esforço do pensamento do homem tem de saber hoje preparar e criar. Assim foi que um pensamento superior pôde ser lançado ao mundo de um modo perfeito, o que não é fácil diante da posição do pensamento moderno. Aqui, a voz do Alto, através dessa tradução, pôde ser elevada da Terra ao Céu. E a ciência, em linguagem humana, a própria ciência materialista foi conduzida até o espírito, alcançando a dignidade de filosofia e de fé. Terra e Céu se tocam nessa obra. E no presente volume se explica e se confessa todo o “como”, com objetividade de observador desapiedado, com a fé de um mártir que se dá a si mesmo por uma idéia.

 

 

 

A própria realidade desmaterializada, que por todos os Ênteles concordemente não é descrita em formas que o nosso materialismo considera fantásticas, é nessa obra atingida através da própria psicologia materialista, tomada como ponto de partida; atingida através da própria racionalidade, que é a forma indispensável à compreensão de nosso tempo e que pelo Êntele transmissor é adotada como forma-pensamento em sua projeção de conceitos. Os céticos poderão sorrir, as filosofias discutir, a ciência negar, as religiões condenar, mas ninguém negará achar-se em face de uma esmagante massa de pensamento, de uma vertiginosa visão do universo, qual jamais foi concebida até hoje. E nem as filosofas, nem as escolas, nem as religiões poderão negar sem abjurar de si mesmas, porque em A Grande Síntese são todas elas, inclusive as inimigas, finalmente irmanadas num só pensamento.

 

 

 

E na verdade a obra se desenvolve num sentido de visão. Sobre o fundo da sucessão evolutiva dos universos (figura 1) surge, isolado, o universo trifásico do concebível humano; trifásico, porque constituído por três planos de existência, que são Matéria, Energia e Espírito. Estes três planos existem nas relativas dimensões de espaço, tempo e consciência. Esta trindade, tridimensional e trifásica, é simultaneamente reduzida a uma unidade de substância em que se fundem, desaparecendo das aparências da forma, relativa, em evolução. Além dos limites dessa unidade trina o concebível humano não pode atualmente chegar; está, presentemente, fechado em seu universo que, entretanto, superará. As formas, porém, são infinitas, progredindo desde ás fases submateriais até as fases físicas, dinâmicas e psíquicas de nosso universo e indo até às superconceptuais que o superam.

 

 

 

O homem, em seu psiquismo, encontra-se na escada ascensional. E a grande viagem começa da matéria, que é tomada para exame como produto de desfazimento involutivo de universos evolutivamente precedentes – a evolução procede por dobramentos e retornos periódicos (veja figs. 1 e 2) e é estudada na série estequiogenética (stechiogenesi = gênese dos corpos), por peso atômico e outras características fundamentais até traçar uma árvore genealógica das espécieis químicas. Assim, a evolução da matéria é acompanhada desde o hidrogênio das nebulosas até o urânio, isto é, dos pesos atômicos mínimos aos máximos, em que se inicia a desagregação radioativa, que representa a gênese das formas dinâmicas. E desse modo, num determinado momento, a matéria morre como matéria e renasce como energia. Muda-se a forma do relativo, mas, intacta permanece a substância divina do todo.

 

 

 

São examinadas todas as formas de energia. Antes, porém, de descer a este segundo plano, a visão contempla o universo não só sob este seu aspecto estático, em que ele, por comodidade de estudo, é isolado em sua forma e concebido em imobilidade. Também existe um aspecto dinâmico. E então, não mais observamos uma sucessão de formas, mas assistimos ao seu íntimo tornar-se, que as transforma umas noutras. Tudo se move, se agita; tudo palpita e tem vida. E sobe, sobe numa grandiosa sinfonia de impulsos, de desenvolvimentos, de equilíbrios que gritam: Deus!

 

 

 

E existe um terceiro aspecto: Conceptual. Três aspectos, portanto: o universo a si mesmo se completa com três grandes olhos que são uma só luz: Deus.

 

 

 

No aspecto conceptual, a visão se abre às leis que guiam o processo evolutivo do cosmos, ao pensamento que rege os desenvolvimentos fenomênicos, ao princípio abstrato, à idéia que se exterioriza em todo esse tornar-se, modelando-o à sua imagem. Assim é definida a trajetória típica dos movimentos fenomênicos (fig. 1) e traçada a teoria da evolução das dimensões. E vemos nascer e morrer por superação o espaço e o tempo. A lei de Deus aparece, integral, inclusive nos seus aspectos menores, no universo inferior da matéria, até refulgir, sempre mais límpida, no universo superior do espírito.

 

 

 

Nasce então, a segunda forma: a energia. Nasce o tempo, nasce a protoforça típica do universo dinâmico: a gravitação. O gesto possante de Deus vira as páginas ciclópicas da criação e a inspiração gigantesca da gênese mosaica retorna à luz, verdadeira, com palavras de ciência. E à série evolutiva das espécies químicas se segue, “por continuidade”, a série evolutiva das espécies dinâmicas: 1°) gravitação, 2°) radioatividade, 3°) radiações químicas (espectro invisível do ultravioleta), 4°) luz (espectro visível), 5°) calor (radiações caloríficas obscuras, espectro invisível do infravermelho), 6°) eletricidade (ondas hertzianas, curtas, médias e longas), 7°) Som.

 

 

 

Nesse momento da evolução, a energia atinge o máximo de seu limite de degradação, isto é, de desvanecimento cinético ou diminuição de velocidade de vibrações e de aumento de amplitude no comprimento de onda. E como a matéria morreu por desagregação atômica, a energia morre por degradação dinâmica. O fenômeno é assinalado na sua íntima estrutura cinética e, na teoria dos movimentos vorticosos, é estudado profundamente, solucionando-se o formidável problema da gênese da vida, que é gênese de psiquismo, a terceira fase do universo. A química inorgânica novamente se plasma para chegar à química orgânica. Nasce a vida e abre-se a visão do mundo biológico. O universo não apenas pulsa, esplende, canta, mas também vive, ama, sofre, pensa.

 

 

 

A evolução procede por dobramentos involutivos periódicos. O diagrama exprime o processo de progressiva gênese do relativo por evolução. Seguindo o abrir-se da espiral no tempo, ao longo das zonas assinaladas na vertical da evolução, desde – z, – y, – x, ¡, b, a,. . . até + n, ver-se-á a linha ascender de três zonas ou planos de existência e descer de duas, depois tornar a subir três zonas e tornar a descer duas e assim por diante. Das pulsações desse respiro que sempre mais se dilata, resulta a progressão de uma linha maior, bem visível, distanciando-se das particularidades do desenho, e que é uma espiral de abertura constante. Resulta ela da sobreposição dos retornos ascensionais da espiral menor. A evolução é, desse modo, uma progressão criativa que invade sucessivamente as zonas assinaladas na vertical (evolução), isto é, – z, – y, – x, universo trifásico mais involvido que o nosso, subfísico e para nós imerso no inconcebível. Dele nasce, por evolução, o plano ¡, a matéria; deste plano nasce b, a energia; e de b – nascea , o psiquismo. E está completo nosso universo. Em a, temos o homem. Em + x o espírito penetra por evolução, superando a dimensão de consciência numa dimensão superconceptual mais elevada. Da consciência de superfície, ou razão, se atinge uma consciência volumétrica ou intuição. Inicia-se, assim, por criação no relativo, um novo universo trifásico, +x, +y, +z. Manifesta-se, assim, ao infinito, e se ascende por íntima autoela-boração, o transformismo universal, qual progressiva manifestação da Divindade.

 

 

 

O panorama se abre, imensurável. Todas as formas da vida vibram no universo, a Terra se povoa, o espírito dá seus primeiros vagidos. Afronta-se o exame da técnica evolutiva do psiquismo e da gênese do espírito. Ambiente, reações, instinto, consciência, até o homem, tudo canta a grande sinfonia do espírito que evolve. Aparece o homem, sua grande alma, centelha de Deus. E essa alma sobe, sobe até o super-homem, o herói, o gênio, o santo.

 

 

 

A linha, do hidrogênio ao gênio, é única, ininterrupto caminho de conquista e de criações, em que Deus está sempre ativo e presente. E o super-homem se converte em super-humanidade. O homem se esgota nas neuroses e as civilizações se debilitam na decadência. Tudo envelhece e morre com a matéria e a energia, numa degradação biológica que não é morte, mas sim, ressurreição de espírito imaterial em dimensões superconceptuais, pois a substância é eterna. Aqui, a matéria se desmaterializa decompondo em sua estrutura cinética a sua aparência física e o ser não mais possui corpo nem mente e penetra, triunfante, na dimensão inicial de um novo universo trifásico, onde não mais existe nem espaço, nem tempo, nem concebível humano.

 

 

 

Está concluído o grande caminho. A visão termina com o quadro das últimas, das mais elevadas ascensões humanas, primeiro individuais, em seguida coletivas; perfeições morais, caminhos da liberação, superações supremas. Toma-se a mão do homem, tal como ele é hoje, e se lhe traça o caminho de suas ascensões. Estuda-se a lei do trabalho, o problema da renúncia, a função da dor, a evolução do amor. Coletivamente, são afrontados os problemas sociais do momento histórico: a gênese do direito, a ética internacional, a guerra, o problema econômico, a distribuição da riqueza, o colaboracionismo, o poder, o Estado, o chefe, a arte (...).

 

 

 

E a viagem iniciada entre as mais densas formas da matéria, termina no Evangelho e a alma se detém, saciada, ante a visão do Cristo, última síntese. Esta é a “Grande Síntese” e uma só palavra se encontra nas profundezas deste esforço de razão e de ciência: Cristo. A Sua Voz repercute através do trabalhoso tratado, convertendo-o num ato de paixão que, descendo do Alto se dá através do sacrifício de um homem pelo bem do mundo.

 

*

Era indispensável, repetimos, que nos detivéssemos em A Grande Síntese porque, embora no presente volume Ubaldi não a cite, a ela se refere toda a penetrante análise que em As Noúres o Autor desenvolve com imensa novidade de expressão e considerações, ante as quais empalidecem todas as obras até agora publicadas e que em vão tentam discorrer sobre fenomenologia ultrafânica apenas baseadas em manifestações exteriores.
 

 

Ubaldi, pelo contrário, viveu o fenômeno e por isso seu conhecimento ultrapassa os limites da pesquisa comum, con-servando-se prudente e sábio, e assim superando inúmeras hipóteses, os mais fantásticos juízos e apreciações, as elocubrações mais estranhas, infantis ou impenetráveis que se apresentam sob pressuposta e irreal vestimenta científica.

 

 

 

Competia a um hipersensitivo poderoso e, ao mesmo tempo, a um forte talento, a tarefa de tratar deste principal tema da biosofia; a alguém que, “assinalado” para tal obra, pudesse, onde não sabe chegar a inteligência, chegar com a intuição, e onde esta não alcança, deixar intervir a inspiração. E, então, “Sua Voz” diz a verdade que a mente humana ignora: di-la ao seu “instrumento” idôneo e digno.

 

O fenômeno, em Ubaldi, assume características que em vão buscaríamos nos ultrafanos comuns, mesmo nos intensamente exercitados e provados. Com isso não queremos nem podemos negar que também nestes as faculdades paranormais sejam poderosas, produtoras de fatos impressionantes e excitantes pelo modo como se obtêm e pela beleza e grandiosidade substanciais.

 

 

Nas obras já editadas pela Sociedade de Biopsíquica ou sob seus auspícios, ressaltam as excepcionais virtudes de recepção e de transmissão de noúres, que superam a potência do engenho humano. Em Ubaldi, porém, a manifestação, além de superlativa, tem a característica de não lhe fazer desaparecer a consciência ou a recordação do acontecido, de não lhe diminuir a capacidade de atender o próprio fenômeno, quer pelo aspecto formal, quer pelo substancial. Além disso, falta em muitos ultrafanos, ou é bem nebulosa, aquela fé que existe em Ubaldi e que é potência apta à harmonização da mente humana com as energias transcendentais; para os outros hipersensitivos de efeitos conceptuais se torna também possível conseguir o “perfeito”, porém, com o concurso do biósofo que dirige, regula as manifestações, realiza a experiência. E isso explica porque a maior parte das mensagens obtidas mediunicamente sejam tão pobres de conceito, mesquinhas na forma, contraditórias e até triviais e grotescas.
 

 

 

Neste volume premiado, Ubaldi se detém amplamente, como era necessário, a falar de si, unicamente de si, porquanto, tomando-se a si mesmo para exame, nos oferece uma demonstração positiva, de indubitável valor científico, pois firmada sobre a observação e a experiência exercida sobre um “sujeito” hipersensitivo; além disso, o trabalho é baseado na razão com a bagagem de uma sólida cultura. Esse fato também nos dá a esperança de que se pode e se deve acentuar o progresso das faculdades ultrafânicas, isto é, que todos aqueles que, como Ubaldi, foram “assinalados” para oferecer à humanidade novas e sempre luminosas manifestações transcendentais, não serão, um dia, apenas instrumentos inconscientes, mas, cientes e conscientes do valor do fenômeno que através deles se exterioriza.

 

 

 

Mário Borsalino

 

Pierluigi Toffanello

 

Gino Trespioli, relator.

 

 

 

 

 

Milão, Itália, Janeiro de 1937.