Essa hereditariedade psíquica é a base, com significado e função fundamentais, do alternado ciclo da vida e da morte. Na evolução darwiniana vistes apenas a progressão das formas orgânicas. Inevitavelmente esbarraríeis neste último efeito do psiquismo, mas ele, como íntima causa determinante, para vós, permaneceu na sombra. Dessa maneira, escapou-vos o fio condutor de todo o processo e o acúmulo dos valores psíquicos; a manutenção em linha de continuidade de tantos fenômenos, constantemente interrompidos pela morte, tornou-se um mistério para vós. Não são as formas que evoluem: o princípio espiritual é que as plasma, que lhes é a causa e que possui o poder indestrutível de reconstruí-las sempre.

 Se a natureza conserva uma indiferença suprema diante da morte, é porque esta nada destrói substancialmente, tanto assim que, apesar das contínuas mortes, a vida prossegue triunfante: nada é destruído, nem como matéria nem como espírito. A matéria abandonada, torna a descer a um nível inferior, é retomada num ciclo mais baixo de vida; o psiquismo reassume o dinamismo e os valores espirituais e sobe, imaterial e invisível, para equilibrar-se ao nível que é o seu, de acordo com seu peso específico. Assim como a natureza pinta os mais maravilhosos quadros com a luz e as cores convenientes, de igual modo, depois, despreocupadamente, deixa-os desvanecer-se porque sabe reconstruí-los mais belos ainda, pois sente-se rica de beleza, assim a vida, com a química do plasma, com suas forças íntimas, com a sabedoria do psiquismo, modela as mais maravilhosas formas de beleza, depois as deixa murchar e morrer, porque logo sabe refazê-las e refará outras mais belas, numa infinita prodigalidade de germes.

 A morte não prejudica, absolutamente, o princípio da vida, que permanece intacto e até continuamente rejuvenescido com esse renovar-se constante através dela. Se a natureza não teme nem evita a morte, porque ela é condição de vida, com isso, nada se desperdiça em sua estrita economia. A natureza sabe que a substância é indestrutível e nada pode se perder, nem como quantidade, nem como qualidade. Sabe que tudo ressurge da morte: ressurge o corpo no ciclo das trocas orgânicas, ressurge o espírito no psiquismo diretor.

Que é, afinal, a morte? Que é essa estanha evaporação de consciência, pela qual, num átimo, o organismo passa do movimento à imobilidade, da sensibilidade à passividade inerte? Olhais assustados aquele corpo morto e em vão lhe pedis que torne a dar à vossa sensação a centelha da vida apagada. No entanto, a matéria está toda ali, no primeiro momento ainda intacta; lá estão todos os órgãos, os tecidos, o plasma; a máquina repousa completa. Falta-lhe apenas a vontade do conjunto, o psiquismo diretor; falta-lhe o poder central; a sociedade apressa-se a dissolver-se, como um exército que perdeu o chefe, no qual cada soldado pensa somente em si mesmo, para reunir-se a outros exércitos, onde quer que os encontre. O esplêndido edifício desaba e outros construtores vizinhos, pouco importa se menos hábeis, correm para recolher material para seus edifícios. Tudo é logo retomado em novo circuito, reutilizado, e revive ao sol. Nada jamais pode morrer. Apenas a unidade coletiva se dissolve nas unidades menores componentes.

 Ocorre portanto a separação do psiquismo e profunda mudança no estado da matéria. Acontece nesse fenômeno algo que vos relembra outras mudanças de estado mais simples, como a passagem da matéria do estado gasoso ao estado líquido e depois ao sólido. Existe perda de mobilidade, liberação de energia, nada se destrói na natureza e também a morte "deve", por lei universal, restituir intacto o psiquismo que, naquele corpo, já agora inutilmente procurais encontrar. Não importa se ele vos escapa no imponderável, diante de vossos sentidos e meios de observação. Um psiquismo animador ali havia e não há mais. Todo o universo, obedecendo constantemente à sua lei, grita-vos: aquele psiquismo não pode ter sido destruído. Esse princípio vós o vedes, a cada momento, renascer, como do mar renascem as chuvas que aí caíram: renasce cheio de instintos, proporcionado ao ambiente, individuado como era, quando o corpo morreu. Na morte, o vedes desaparecer; no nascimento, reaparecer. Como será jamais possível que o ciclo, como acontece em todas as coisas, não se feche reunindo seus extremos? Como o que não morre não pode ter nascido, assim o que existia antes do nascimento não pode morrer. O que não nasceu com a vida, não morre quando a vida cessa.

A lógica do universo, a voz de todos os fenômenos, unanimemente vos leva a esta conclusão: se, como foi demonstrado, apesar de mudar de forma, a substância é indestrutível; se a existência de um princípio psíquico é evidente, este tem de ser imortal; e imortalidade só pode ser eternidade, equilíbrio entre passado  e futuro, ou seja, reencarnação. Se tudo o que existe é eterno, vós, que existis, sois eternos. Nenhuma coisa poderá jamais ser anulada. Não há lei, nem autoridade humana, que possa destruir a lógica e a evidência dos fenômenos. Sobrevivência do espírito é sinônimo de reencarnação. Ou se renuncia a compreender o universo, como faz o materialismo ou, se admite um plano, uma ordem e um equilíbrio, como afirmam todos os fatos, é necessário acompanhar-lhe a lógica até as últimas consequências (não é possível parar na metade): vida e morte são os contrários que se compensam, dois impulsos que garantem o equilíbrio, duas fases complementares do mesmo ciclo.

 Desaparecerá o espírito na indistinção de um grande reservatório anímico amorfo? Absurdo. Vedes que esse princípio não reaparece amorfo, mas com qualidades já prontas, porque se desenvolvem rapidamente, isto é, as mesmas qualidades de instinto, consciência e personalidade com que o vistes desaparecer. A unidade reconstruída assemelha-se demais à unidade destruída, para que alguém possa dizer que não é a mesma . Só assim podeis explicar a presciência do instinto, a gratuidade de seu conhecimento, aquele surgir de capacidades inatas, sem um aparente construtor precedente. Como poderiam os instintos, o destino, a personalidade nascerem do nada, tão diferentes e definidos, fora da lei universal de causalidade? Mas eles são o passado, que em virtude dessa mesma lei, renasce sempre; e nenhuma morte poderá jamais destruir. É absurdo e impossível um contínuo construir-se e desintegrar-se de personalidades; uma passagem do ser ao não-ser, em que se quebraria a cadeia de causalidades que prepara tudo e tudo conserva. Além disso, tudo está individuado, tudo grita "eu", no universo. Não existem esses mares de inércia, essas zonas de vazio; finalmente, a evolução não retrograda, não aniquila jamais e defende, como a coisa mais preciosa, os produtos de tantos esforços seus. Uma unidade coletiva tão complexa, como é a individualidade humana, constitui o produto mais alto da vida e resume os resultados do maior trabalho da evolução. Seria possível que esta, em sua estrita economia, permitisse a dispersão de seus maiores valores? Ademais, por que o testemunho de vossos sentidos falazes deveriam ter mais força que vosso instinto, que diz: "eu sou imortal"? As religiões, os fenômenos mediúnicos, a lógica dos fatos, a voz concorde de toda a humanidade e de todos os tempos, dizem-vos: tu és imortal.

 O psiquismo individual sobrevive nas plantas, nos animais, no homem. O desenvolvimento embriológico, que repete e resume todo o passado vivido, demonstra que na vida existe sempre o mesmo princípio, que continua seu trabalho. Essa sobrevivência indestrutível do passado no presente, que garante a continuidade da evolução, demonstra-vos também uma identidade constante do princípio de ação. O psiquismo sobrevive e o faz com o grau de consciência já conquistado, que pode subsistir no estado imaterial incorpóreo.

 A morte não é igual para todos. É sim, no corpo, mas não no espírito. Nos seres inferiores - inclusive no homem nos primeiros degraus - o centro perde a consciência  e apressa-se a reencontrá-la, arrastado pela corrente das forças da vida, em novos organismos. O grande mar tem suas marés; ininterruptamente, impele, na onda do tempo, os princípios, no alternado ciclo de vida e de morte, porque esse é o caminho para subir. A evolução é uma força premente. Está na natureza do dinamismo daquele princípio animador, de aspirar sempre a novas expressões e realizações mais elevadas. Essa perda temporária de consciência, nos seres inferiores, pode dar-lhes a sensação daquele fim que o materialismo defende: sensação, não realidade. Mas nos homens mais evoluídos, que entraram na fase a, propriamente dita, do espírito, a consciência não se extingue, mas lembra, observa, prevê, depois escolhe as provas com conhecimento. A consciência é conquista, é prêmio aos imensos esforços. No ambiente imaterial, pode subsistir no homem tudo o que nele é imaterial: aquela parte que foi pensamento elevado, sentimento tão preso às formas. Tudo o que é baixo é trevas; no alto estão a luz e a liberdade. Mas, por meio de sua luta diuturna para refinar a matéria, de maneira que possa expressar cada vez mais transparentemente o espírito, a evolução vos eleva cada vez mais acima daquela morte que mais vos espanta, a treva da consciência, e a transforma numa passagem, na qual a personalidade cada vez menos se abala, até reduzi-la a uma mudança de forma em que o "eu" permanece desperto e tranquilo.

 Então o homem terá vencido a morte e viverá consciente na eternidade. O progresso espiritual e moral, ao qual estão confiadas a sorte e o porvir de vosso estado pessoal futuro, é, portanto, fenômeno biológico e torna-se fenômeno que toca diretamente à ciência e ao interesse individual e social.

A morte reduz-se, assim, a um "momento" da permuta orgânica  da vida, e o problema da sobrevivência, enquadrado dessa maneira na perspectiva do funcionamento orgânico do universo, só é solucionável em sentido afirmativo.

Observai o íntimo dinamismo do fenômeno. A vida representa a fase de atividade do transformismo dinâmico-psíquico; a morte, a fase de repouso. Vimos o complexo mecanismo que, através da vida, ocorre nessa passagem da fase β à fase α. Primeiro, a gênese dos movimentos vorticosos no sistema planetário atômico, por ação do trem eletrônico da onda dinâmica degradada e, com isso, a formação da máquina vital em seu complexo quimismo. É a gênese do plasma, a matéria viva. Depois vimos seu desenvolvimento da planta ao homem; seu organizar-se em formas cada vez mais complexas. Definimos o circuito da energia, através das contínuas permutas de material orgânico, desde a matéria solar e suas radiações, até a planta plasmódoma (assimilação do carbono), ao animal plasmófago, até o alto psiquismo humano. Finalmente, vimos como resultado último de todo esse complexo funcionamento de materiais químicos e de energia, através da máquina da vida, o desenvolvimento do psiquismo, em suas fases de instinto, consciência e superconsciência.

 Assim o espírito se constrói através da vida. Na morte, esse trabalho interrompe-se, para ser retomado mais tarde e continuado. A vida produziu o psiquismo por meio de uma corrente de metabolismo químico. Nesse processo de desmaterialização a que acenamos, o vórtice eletrônico introduziu-se cada vez mais profundamente na matéria, deslocando o equilíbrio íntimo de suas trajetórias e sua figura cinética; a energia, degradada ao máximo, sem destruir-se, passou através de todas essas mudanças e, de passagem em passagem, a encontrais em seu último termo na escala da evolução: no psiquismo. Aqui, β, torna-se α.

 Na morte, então, ocorre o isolamento, a separação do princípio mais alto, de todos os princípios subjacentes e determinantes; aquele princípio separa-se dos princípios inferiores que ele havia chamado para colaborar com seu trabalho de evolução. A química mais alta da vida é deixada descer para formas mais simples; a energia não elaborada em psiquismo, é restituída às correntes ambientais; os instrumentos de trabalho tomados por empréstimo aos planos inferiores da matéria e da energia, são jogados fora para que outrem os recolha; completada a síntese da obra, o resultado e o valor da vida concentram-se no âmago dos movimentos vorticosos, na íntima estrutura cinética da substância que, com boa memória, conserva cada traço e amanhã a restituirá. O ser volta a si mesmo e tudo sobrevive no vórtice mais íntimo: eis a técnica do germe. Depois, a fase de concentração se inverterá na de descentralização, que é o processo da vida. Assim, oscilando alternadamente da periferia ao centro, da ação à experiência, da matéria ao espírito, o ser percorre a dupla respiração de que se nutre a evolução: subida, descida; reconstrução, dissolução. Na morte, o anjo destaca-se, livre, de seu pedestal. Voltará depois a apoiar-se na Terra, a engolfar-se nos ciclos densos da matéria, únicos que propiciam resistência e luta (prova), para adquirir nova experiência, para retemperar as próprias energias e aprofundar o íntimo movimento para o centro e complicar, por meio das provas, sua íntima estrutura cinética. Mas, a cada separação, o caminho percorrido é mais longo e, também, mais evoluída a matéria plasmada. A consciência, finalmente, ficará, para todos, mais lúcida além da morte; a separação da matéria mais sutil não será violenta; a cisão e a reunião da morte e do nascimento realizar-se-ão sem perturbações, num espírito permanentemente consciente e desperto. Então α terá superado a fase vida e, no limiar de nova dimensão, não haverá mais matéria, nem corpo, nem morte. Pois a evolução traz libertação, felicidade, consciência, luz.

 Como navega nos espaços esse produto-síntese da vida? Essa unidade psíquica é o último produto destilado da evolução em suas fases γ ,  β, α, e chega à fase sucessiva +x, cujas dimensões exorbitam do vosso concebível. Essa unidade está fora do espaço e do tempo. Síntese da evolução completa, é o germe das evoluções futuras. Este é uma individuação imaterial de altíssimo grau de concentração cinética, escondido, para vós, no imponderável. Para entrar em contato com vossos sentidos, ele tem que assumir as formas mais densas de vossa vida, percorrer de novo em descida o caminho ascensional da evolução, isto é, revestir-se primeiro de energia e depois, de matéria. Mas, como por desagregação atômica da matéria pode se gerar energia, também, com energia se pode fabricar matéria; mais no alto, como a energia formou o psiquismo, o espírito pode emanar energia.

 As fases são sempre comunicantes, subindo ou descendo, e as entidades, em suas materializações, devem percorrer de novo a direção inversa da que percorreis. Trata-se de uma inversão dos processos cinéticos que observamos, de uma restituição da parte do vórtice eletrônico, da onda dinâmica, seguida de uma redução do movimento à forma mais simples do sistema planetário atômico. O último produto, isto é, a unidade do psiquismo, decompõe sua síntese e torna a desenvolver, no estado atual, o potencial incluso em estado latente. Esta a técnica das materializações mediúnicas, das desmaterializações, dos transportes, e semelhantes. Fenômenos de exceção, porque a substância existe integral em movimento em suas próprias fases. O espírito vagueia depois da morte, além do espaço e do tempo, em outras dimensões. O universo oferece-lhe todas as possibilidades e condições possíveis para reconstituir um corpo na matéria. Cada gota do infinito oceano estelar apresenta um apoio à vida, nas condições mais diversas, para enfrentar as provas, as experiências mais adequadas a cada tipo de diferenciação, a cada nível de existência. O oceano é desmensurado. O universo é todo palpitante de vida e de consciência e incessantemente ecoa no veemente trabalho da evolução.